Mais vale antecipar as eleições autárquicas do que adiá-las

Se é para abrir o dossier das mudanças legislativas, mais vale permitir que se antecipem as eleições para o primeiro domingo de Setembro, por exemplo. Mas valerá mesmo a pena?

Se há uma lição que se pode tirar dos quase doze meses que já levamos de pandemia, é que o “bicho” abranda no Verão, nos meses de maior calor, sobretudo se precedidos de um confinamento geral e de um desconfinamento gradual. 

Foi assim que aconteceu em 2020, quando chegámos a Maio e vimos o primeiro-ministro juntar-se ao presidente da Assembleia da República para almoçarem juntos no dia em que os restaurantes reabriram, cheios de novas regras. E foi assim em Junho, quando António Costa viajou até ao Algarve para dizer aos microfones da comunicação social: “A praia faz bem à saúde.”

O vírus, tolhido por um confinamento total de 43 dias (entre 22 de Março e 4 de Maio) e um desconfinamento gradual que na maior parte dos sectores durou até Junho (sendo que alguns que nunca retomaram a sua actividade), chegou ao Verão menos agressivo. Vale a pena recordar os números no dia do solstício: dois mortos; 292 novos casos; e 407 internados, 69 dos quais em Unidades de Cuidados Intensivos. Na altura, o dado sobre casos activos não fazia ainda parte do relatório diário da Direcção-Geral da Saúde, mas seriam perto de 12.200. Os valores mais recentes estão muito acima destes: 65 mortos; 1186 novos casos; e 3316 internados, 638 dos quais em Unidades de Cuidados Intensivos. Casos activos: 82.341.

A experiência do ano passado diz-nos que, mesmo sem contar com os efeitos da vacina — que até Setembro, deveria chegar a 70% da população, se tudo corresse bem —, seria melhor antecipar as eleições autárquicas do que adiá-las. Em Setembro, tudo indica que os números serão melhores do que em Dezembro, assim como o clima para fazer campanha e andar na rua. 

O Parlamento vai debater no dia 25 de Março a proposta do PSD de adiar as autárquicas, mas se é para abrir o dossier das mudanças legislativas, mais vale permitir que se antecipem as eleições para o primeiro domingo de Setembro, dia 5, por exemplo. Os efeitos recessivos do Verão ainda se deverão fazer sentir nos contágios, mas ao mesmo tempo a maior parte dos portugueses já terá regressado de férias. Mas valerá mesmo a pena?
Em 2020, no dia 5 de Setembro, houve dois óbitos e 315 casos novos, e havia 354 internados (43 em UCI). Os casos activos estavam quase nos 15.500.

Gostava de conhecer contas mais fidedignas do que as minhas. Os epidemiologistas apreciam pouco fazer política e a última coisa em que vão meter-se é na data das eleições, mas gostava de ouvir as suas previsões. Porque é preciso que alguém os oiça, além de ouvir os partidos, antes de marcar a data das autárquicas (é da responsabilidade do Governo).

Dir-me-ão: o problema é que não há só uma lição a tirar deste último ano. Há várias. E a mais importante tem a ver com o facto de não haver certezas e de tudo mudar de um momento de convívio para o outro: a surpresa (ou o vírus) está à esquina, à espreita. 

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