Os painéis do Estádio 1º de Maio foram vandalizados e todo o edifício “está ao abandono”

Pichagens e inscrições, bem como deposição de lixo em buracos visíveis nos painéis de bronze, suscitam preocupação. Contudo, o estado de degradação estende-se a todo o edifício: “É evidente que não tem a manutenção necessária”, diz arqueólogo. Ricardo Rio adianta que estudo de requalificação do estádio em curso terá “resultados mais consolidados” ainda “no primeiro semestre” deste ano.

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Paulo Pimenta
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Cão
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Estátua
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Logo à entrada do Estádio 1.º de Maio, em Braga, há 12 figuras a dar as boas-vindas, fazendo jus à função daquele espaço. Do lado esquerdo, seis ostentam elementos olímpicos, como a tocha; à direita, outros tantos corpos atléticos representam algumas modalidades. Dividem-se pelos dois painéis de bronze em alto-relevo, da autoria de Barata Feyo, e ali estão há tanto tempo quanto o estádio, que foi inaugurado em 1950, durante o Estado Novo. Hoje, encontra-se “degradado”.

Vêem-se “pichagens e inscrições” e “acumula-se lixo nos buracos” que se foram abrindo nos painéis, com o passar do tempo. Quem o denuncia é Carlos Dobreira, habitante de Palmeira, no mesmo concelho. Crê que aquele lugar “está votado ao abandono”. “A última vez que lá estive foi antes do confinamento, portanto não sei o que se passou desde então. Mas é visível a degradação das obras de Barata Feyo”, conta. Também se nota um desgaste “nas armas [heráldica] da cidade e no escudo nacional”, ambos colocados no pilar que se ergue na fachada principal, interrompendo a ligação entre as bancadas.

“E tenho recebido mensagens, através das redes sociais, de pessoas que mostram desagrado em relação à própria estrutura, desde a zona dos balneários à dos gabinetes. Está podre e há baldes a apanhar a água que cai dos tectos”, acrescenta. Ao PÚBLICO, o presidente da Câmara Municipal de Braga, Ricardo Rio, aponta que “há riscos significativos sobre a salvaguarda das estruturas”, como os balneários e algumas zonas das bancadas, “e que, por isso, foram interditadas”.

Já vereador responsável pelo pelouro da Gestão e Conservação do Espaço Público da autarquia, João Rodrigues, diz perceber que o estado do estádio, classificado desde 2012 como Monumento de Interesse Público, “não seja o melhor”, mas garante que é realizada “uma conservação quotidiana” aos painéis e à própria estrutura do estádio. “Trata-se de uma questão de vandalismo e de manutenção, mas vamos corrigir”, assegura, acrescentando que a Câmara Municipal de Braga leva a cabo “uma conservação feita ao longo de vários anos” para que “o estádio tenha as condições exigidas para o que é utilizado”. Ali joga a equipa de futebol feminino do Sporting Clube (SC) de Braga; para além disso, outras práticas desportivas decorrem no estádio, que está aberto à comunidade e que integra o Parque da Ponte.

Carlos Dobreira aponta ainda, num e-mail endereçado ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e enviado a vários órgãos de comunicação social, que o local é “propício a furtos” e a “convívios”. Ao PÚBLICO, detalha que facilmente se encontram “indícios de que se esteve ali a fumar ou a beber”. Quanto a eventuais furtos, lembra que aquele “é um local isolado” numa “zona abandonada, de certa forma, a certa hora do dia”. Segundo o gabinete de relações públicas e imprensa do Comando Distrital da PSP de Braga, “não há registos de queixas formalizadas” em relação aos painéis vandalizados ou a furtos.  O vereador João Rodrigues indica que “quer a Polícia Municipal quer a PSP fazem rondas” no local. “Não recebemos queixas em particular à zona, não há um particular problema de vandalismo. É uma zona com mais movimento e isso traz sempre aspectos positivos e outros não tão positivos”, diz. 

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Antes de possíveis futuros, a requalificação

Esta não é uma questão recente: “Há muitos anos que este problema se coloca. O estádio é um monumento que deve ser preservado e é evidente que não tem a manutenção necessária”, aponta o arqueólogo Francisco Sande Lemos, membro da Associação para a Defesa, Estudo e Divulgação do Património Cultural a Natural (ASPA). Na sua opinião, o município deveria ter “previsto verbas para a conservação” do edifício na altura da construção do estádio municipal da cidade. Desde então, diz, “pouco se fez” — e “a estrutura e os painéis vão-se ressentindo com a passagem do tempo”.

Por isso, Carlos Dobreira defende que os painéis devem ser “colocados num lugar seguro e de preservação, até de exposição, noutro local da cidade” se não for assegurada a sua manutenção. Contudo, o vereador João Rodrigues considera que a transladação da obra escultórica “não tem lógica do ponto de vista objectivo” nem do “ponto de vista formal e de direito”: “Não o poderíamos fazer de ânimo leve. Os painéis são do Estádio 1.º de Maio, são parte do caderno de encargos quando o imóvel foi declarado Monumento de Interesse Público.”

Quanto a toda a estrutura do estádio, Francisco Sande Lemos considera que devem ser tomadas “iniciativas ligadas à sua valorização”, como a criação de um centro interpretativo. Nesse sentido, Carlos Dobreira frisa que “aquela zona da cidade precisa de uma nova visão”, indicando possíveis alternativas para a utilização do 1.º de Maio: “Recebo muitos testemunhos que falam de um museu para o SC Braga. Ou, então, um espaço de apoio a sem-abrigo, por exemplo, ou para acolher artes alternativas.” Já Cláudia Sil, da Plataforma Salvar a Fábrica Confiança, salienta que aquele “é um lugar com muito potencial para actividades culturais ou desportivas”. “Mesmo o enquadramento paisagístico poderia ser mais interessante, complementando-o com toda aquela área onde está inserido, muito vocacionada para o entretenimento ao ar livre das famílias”, sugere.

Francisco Sande Lemos diz crer que “o que se passa é uma incapacidade da Câmara Municipal de Braga para ter cuidado” com “o estádio e, sobretudo, com outros monumentos simbólicos de determinadas épocas” da cidade. Cláudia Sil corrobora as críticas: “Acho que o estádio está abandonado, que é pior do que esquecido. É constrangedor haver tanto dinheiro gasto em marketing da cidade para atrair turistas, quando o que é importante mostrar está ao mais perfeito abandono.” Carlos Dobreira espera que “o estado dos painéis” sirva para propulsar “uma discussão na sociedade sobre o futuro do estádio”. “É um ícone da cidade, tal como a Sé de Braga ou o Arco da Porta Nova.”

“A estrutura precisa de ser analisada”, insiste Francisco Sande Lemos. O vereador João Rodrigues indica que “a Universidade do Minho está a fazer um levantamento para a reforma do edifício” que, recuperado, “terá outras valências”, mas não distantes da finalidade do estádio. “Estamos à espera para saber o que temos de fazer”, adianta. O estudo para o projecto de requalificação ainda não está concluído porque, explica Ricardo Rio, “não se pode fazer de forma instantânea para perceber a degradação ao longo do tempo”.

Em 2018, o autarca disse ao PÚBLICO que pretendia avançar com as obras e que as mesmas poderiam “custar cerca de cinco milhões de euros”. Agora, com a progressão dos estudos, o custo da requalificação poderá subir “até sete ou oito milhões de euros”, o que “dificulta ainda mais” a intervenção. Contudo, Ricardo Rio afirmou que “ao longo dos próximos meses” serão conhecidos “resultados mais consolidados, para perceber em que se tem de fazer intervenções”, contando com essas informações ainda “no primeiro semestre” deste ano.

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