Governo admite alargar apoio aos pais em teletrabalho

Com o PCP, BE e PSD a pressionarem para uma alteração da lei, Governo admite estender apoios. Provedora de Justiça já deu pistas.

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Se um elemento do casal estiver em teletrabalho, o outro não pode beneficiar do apoio Ricardo Lopes

Os pais que se encontram em teletrabalho e têm os filhos em casa devido ao encerramento das escolas estão excluídos do apoio excepcional à família pago pela Segurança Social. E ao ver a oposição juntar-se no Parlamento para alargar este instrumento, o Governo admite estudar uma solução para passar a apoiar quem exerce a actividade a partir da habitação.

Numa entrevista ao jornal Negócios e à rádio Antena 1, o ministro das Finanças começa por afirmar que, para já, o executivo não tem uma medida no horizonte. “Nesta fase, o que o Governo propôs foi recuperar o mecanismo que tinha aplicado no confinamento passado, para famílias que, por causa dos filhos, deixam de poder trabalhar. Neste momento, não temos nada previsto e temos de avaliar a situação para perceber quais é que são...”.

No entanto, de seguida, admite que o Governo “está a avaliar a situação e a perceber que medidas tem de adaptar” para que o Parlamento não tome decisões “com impacto financeiro no Orçamento [do Estado] em curso”.

Questionado sobre se admite alargar o apoio, João Leão respondeu: “Nós temos de ter essa capacidade de, em todo o momento, ir avaliando qual é a modelação correcta dos apoios. Neste momento, a decisão que o Governo teve foi recuperar os apoios que tinha aplicado no segundo trimestre e que tinham sido alvo de consenso no âmbito do Orçamento Suplementar...”

Neste momento, além de estar excluído quem esteja em teletrabalho, também fica de fora um trabalhador se o outro elemento do casal se encontrar em regime de trabalho.

A mudança de posição do Governo surge depois de o PCP e o Bloco de Esquerda terem pedido uma apreciação parlamentar do diploma onde se inclui esta medida, e depois de o PSD anunciar que, no âmbito da apreciação parlamentar, “irá apresentar propostas de alteração no sentido de apoiar as famílias numerosas e monoparentais que estão em teletrabalho e que têm dificuldade em acompanhar os filhos”, segundo disse ao Negócios na semana passada a deputada do PSD Clara Marques Mendes.

À Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, têm chegado queixas de trabalhadores — em particular trabalhadoras de call centers e professores — que “estão a ver-se confrontados com situações incompatíveis com as exigências das suas vidas familiares, em particular quando têm filhos dependentes ou menores de 12 anos a estudar em casa”.

A situação levou a equipa da Provedora (o Provedor-adjunto Joaquim Costa) a escrever ao Governo, recomendando uma alteração à lei. Sugeriu ao executivo que “examine a possibilidade de estender a estes trabalhadores duas medidas já existentes: abranger os pais pelo regime excepcional das faltas justificadas ao trabalho, com direito ao correspondente apoio financeiro; ou permitir que os filhos possam ser acolhidos nas escolas, tal como continua a ser possível para os filhos de trabalhadores dos serviços essenciais (como profissionais de saúde ou polícias, por exemplo).

Para a Provedora de Justiça, “o regime de teletrabalho, por norma obrigatório quando compatível com a actividade laboral, pode colidir com a assistência inadiável a filho ou outro dependente menor de 12 anos, ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica, a cargo dos trabalhadores. Por outro lado, essa assistência, pela sua abrangência e continuidade, mostra-se em muitos casos impeditiva de adequada prestação laboral. Visto por ambos os prismas, em causa estão direitos fundamentais dos trabalhadores, como o direito à conciliação da vida profissional com a vida familiar, o direito à protecção da família como elemento fundamental da sociedade.”

As queixas que a Provedora recebeu têm em comum “a circunstância de os queixosos terem a seu cargo filhos ou outros dependentes menores de 12 anos, alguns mesmo com meses de idade, cuja assistência, devida e necessária, fica manifestamente afectada” no actual regime.

No ofício que enviou ao Governo, e que está publicado no site da Provedora, a equipa de Maria Lúcia Amaral dá como exemplo “bem ilustrativo” dessa dificuldade o caso de duas mães que lhe escreveram, “ambas trabalhadoras de um call center e com o outro membro dos respectivos agregados familiares em idêntica situação laboral”.

“Tendo de estar constantemente ao telefone com clientes e tempos contados, e só podendo interromper o trabalho por motivos de força maior se expressamente autorizadas, têm ainda de cuidar e vigiar de forma constante os filhos bebés — numa das situações, um de 2 anos; na outra, um de 8 meses —, totalmente dependentes. É igualmente esclarecedora a situação de uma docente que tem exclusivamente a seu cargo um filho de 4 anos e que retomará em breve a sua prestação de trabalho à distância, o que implica ter de assegurar, em simultâneo, mais do que a já de si exigente leccionação, no cumprimento do horário, a assistência permanente àquele seu filho, não autónomo em todas as vertentes da sua vida”, refere o ofício do Provedor-Adjunto.

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