Jamor: de símbolo da luta ambiental para símbolo do descaso ambiental

Oeiras não precisa de mais betão ou projectos à Dubai para se modernizar. É muito mais saudável e moderno recuperar as praias de Oeiras do que passar pedras e tijolos por cima delas, causando diversos problemas ambientais e gerando lucro para poucos.

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Nuno Ferreira Santos

No fim de 2019, a capa da Time colocava a foz do rio Jamor, em Oeiras, no centro das atenções do mundo, como cenário de ar mágico para abrigar a indicada ao Nobel da Paz, activista climática e ambiental Greta Thunberg, que seria reconhecida então como Person of The Year, e que posteriormente também receberia o Prémio Gulbenkian para a Humanidade, no nada modesto valor de um milhão de euros. Quando Evgenia Arbugaeva fez a fotografia, nem ela, nem a activista, imaginavam que aquela praia estaria mais ameaçada do que nunca.

No decorrer dos anos, o Jamor tem sido ameaçado por uma série de projectos que parecem não levar minimamente em consideração sua importância ecológica. Desde o plano do troço final da Linha Intermodal Sustentável (LIOS) que adentra o Complexo Desportivo do Jamor (e assim inviabiliza o uso da mata para utentes e coloca veículos pesados para transitar numa área verde e de recreação), até o projecto megalomaníaco Porto Cruz, que destruirá o habitat natural onde justamente a Time fotografou a activista Greta. 

Além da falta de sensibilidade ambiental, o projecto Porto Cruz também possui diversos problemas de transparência, e, inclusive, em 2018, a própria Câmara de Oeiras foi alvo de buscas judiciais, em uma investigação sobre tráfico de influência, corrupção passiva e activa, participação económica em negócio e abuso de poder, conforme informou a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa e noticiado pelo PÚBLICO.

No entanto, não é apenas a foz do rio que vem sendo severamente atacada. A Associação Vamos Salvar o Jamor já reportou, dentre outros, descargas de esgoto oriundo de Linda-a-Velha directamente no rio Jamor. Quanto aos ecossistemas ao redor, é comum notícias de projectos como vias expressas ou construções em áreas de reserva ecológica ou ecossistemas sensíveis.

Oeiras não precisa de mais betão ou projectos à Dubai para se modernizar. A beleza natural da costa deve ser aproveitada, recuperada, e não transformada. As praias podem e precisam ser limpas, voltarem a ser atractivas para a população local e também de fora. É muito mais saudável e moderno recuperar as praias de Oeiras do que passar pedras e tijolos por cima delas, causando diversos problemas ambientais e gerando lucro para poucos. O interior do concelho também deve ter suas áreas verdes preservadas, não cimentadas.

A luta contra a crise climática, assunto tão falado em todas as esferas, deve ser feita em todos os níveis, inclusive em níveis municipais. A destruição do Jamor e arredores significa a destruição de um habitat, de uma natureza ali existente, que não faz sentido e não traz benefícios para a população em geral. Cabe à Câmara de Oeiras reflectir melhor sobre suas prioridades para o concelho, porque já sabemos que a destruição ambiental não é característica de modernidade tecnológica, tampouco de bem-estar para os munícipes. 

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