Candidata preterida tenta anular escolha de procurador europeu

Acção deu entrada a semana passada no Tribunal de Justiça da União Europeia. É a segunda a tentar invalidar o processo de selecção que culminou com a nomeação de José Guerra. A outra corre no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

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A ministra da Justiça já esteve duas vezes no Parlamento a explicar este caso. LUSA/ANTÓNIO COTRIM

A procuradora Ana Carla Almeida, a candidata escolhida pelo painel de peritos internacionais para o cargo de procurador europeu, avançou com uma acção no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) para tentar invalidar a nomeação do Conselho, em Setembro passado, do colega José Guerra. A informação foi avançada pelo jornal digital Observador e confirmada pelo PÚBLICO.

Este é o segundo processo judicial que tenta anular o polémico processo de selecção do procurador europeu. A primeira acção foi apresentada por um juiz que também concorreu ao lugar, mas que, ao contrário do que aconteceu com Ana Carla Almeida, não chegou sequer a integrar o grupo de três nomes indicado pelo Governo português, que foi sujeito a uma avaliação de um painel de peritos internacionais. Este primeiro processo está a correr no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, onde corre uma outra acção que intima o Ministério da Justiça a apresentar a decisão que determinou a exclusão do juiz neste concurso.

Contactada pelo PÚBLICO, uma das assessoras de imprensa do TJUE, Cristina Lopez Roca, confirmou esta quinta-feira que a acção apresentada por Ana Carla Almeida, contra o Conselho da União Europeia, deu entrada no “dia 5 de Fevereiro”, ou seja, sexta-feira da semana passada. Explicou que um jurista decidirá pela admissibilidade da acção e, se a mesma for aceite, este redigirá uma petição, que congrega os dados gerais do caso – nomeadamente o nome das partes, o que se pretende com a acção e as principais alegações – que será publicada no jornal oficial da UE. Tal deverá demorar dois meses, explica Cristina Lopez Roca, já que quando a acção entra tem que ser traduzida para as várias línguas oficiais com que o tribunal trabalha. Depois do caso ser distribuído a um juiz relator, as partes podem pedir a realização de uma audiência. 

O caso belga

Esta é a segunda acção a contestar a nomeação de um procurador europeu a entrar no TJUE. O magistrado belga Jean-Michel Verelst, que foi preterido na escolha de procurador europeu apesar de ter sido seleccionado pelo painel europeu – cujo parecer não era vinculativo – interpôs recurso para o TJUE, em Outubro passado. Também neste caso houve divergências de opiniões entre os júris nacionais, os conselhos superiores do Ministério Público português e belga, e os peritos europeus. No caso português, o órgão de gestão dos procuradores tinha classificado José Guerra com 95 pontos; João Correia dos Santos com 92 pontos e Ana Carla Almeida com 81 pontos.

A 1 de Março de 2019 a lista de procuradores foi comunicada ao Ministério da Justiça (MJ) e nesse mês os quatro candidatos – três procuradores e um juiz - são ouvidos na Comissão de Assuntos Europeus do Parlamento. A 28 de Março, aquela comissão pela voz da sua presidente, conclui num relatório que todos os candidatos “preenchem os requisitos necessários”, mas registam “diferenças” quanto à “experiência internacional” dos mesmos, destacando dois: José Guerra e Ana Carla Almeida. 

O Governo indica o nome dos três procuradores que são avaliados pelo painel europeu, que escolhe Ana Carla Almeida. Contudo, Portugal insiste num outro nome, José Guerra, uma decisão que fundamenta numa informação com vários erros enviada à Representação Permanente de Portugal na União Europeia (Reper), que a remeteu para o Conselho da União Europeia. Curioso é que a preferência da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, terá mudado em menos de 24 horas, uma alteração cuja razão se desconhece, já que o primeiro nome indicado era o de João Correia dos Santos.

Em Outubro passado é publicada uma carta por vários académicos europeus, entre os quais o ex-ministro Miguel Poiares Maduro e o ex-eurodeputado Rui Tavares, que pedem que o Parlamento Europeu mova uma acção no Tribunal de Justiça da União Europeia por causa do que diziam ser as interferências dos governos de Portugal, Bulgária e Bélgica nas nomeações dos respectivos procuradores. Estes foram os únicos três casos em que foi escolhido “um candidato diferente do recomendado pela comissão independente” sem que as razões para tal fossem divulgadas. Facto que, segundo os subscritores da carta-aberta, “ataca a credibilidade da independência da Procuradoria Europeia e do Estado de Direito na União Europeia”. Argumentam ainda: “A União não pode pretender ser defensora do Estado de Direito se o seu próprio Ministério Público nascer em violação desse Estado de Direito”.

Notícia actualizada às 14h40 com nova informação da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça da União Europeia.

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