As marcas devem “ajudar os consumidores a ter pensamento crítico”

De que forma é que as marcas usam a inteligência emocional para comunicar com os consumidores? O poder da inteligência emocional na publicidade e no marketing foi o tema da primeira PSuperior Talks de Fevereiro.

Foquemos no exemplo do Pepsi Challenge. Nos anos 70, a Pepsi era uma mera marca local nos Estados Unidos que em nada se equiparava à Coca-Cola, vencedora em todos os Estados do país. Como é que a Pepsi poderia combater a forte adesão do consumidor à concorrência? Através de blind tests. O Pepsi Challenge tinha como objectivo comparar o sabor da Pepsi com o da Coca-Cola, de forma a mostrar qual era o preferido dos norte-americanos. Com estes “testes cegos” a Pepsi queria provar que o consumidor, quando não via a marca da bebida que estava a experimentar, escolhia Pepsi, porque a achava melhor. Ao filmar e divulgar “a reacção espontânea das pessoas” procurou-se que os consumidores criassem uma ligação afectiva com aquele produto.

Este foi um dos muitos exemplos dados no debate PSuperior Talks, desta terça-feira, e cujo tema incidiu no Poder da Inteligência Emocional na publicidade e no marketing e que trouxe à mesa virtual Susana Coerver, CEO da agência de publicidade Fuel, José Manuel Palma-Oliveira, professor da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa, Sofia Calheiros, psicóloga, e Ricardo Vargas, doutorando da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa — que referiu, entre outros, a estratégia da Pepsi. O debate foi moderado por Bárbara Reis, jornalista do PÚBLICO.

A pergunta de partida girou em torno da mesa virtual, passando por todos os participantes: “A lógica emocional é mais eficaz do que a lógica racional. Porquê?” As respostas centraram-se praticamente na mesma premissa: “Mais importante do que o que nos é dito, é a forma como nos fazem sentir”, resumiu Susana Coerver, CEO da Fuel. “A comunicação que nos toca de alguma forma, produz mais efeitos do que a comunicação mais directiva”.

Para justificar a razão pela qual nos lembramos mais da forma como nos sentimos, do que o que nos é dito, José Manuel Palma-Oliveira explicou: “Grande parte do que nos acontece depende do afecto que sentimos no momento. Utilizamos aquilo a que chamamos a heurística do afecto. O modo como nos sentimos vai conduzir o modo como vamos avaliar a informação.” 

Casando a psicologia com a publicidade, é assim “muito importante os alunos treinarem, como pessoas do mundo do marketing e publicidade, mas também como psicólogos, as competências da inteligência emocional”, disse Sofia Calheiros. Das publicidades emotivas da Nike, ao movimento “My body, my choice” da Gucci, “a publicidade mais eficaz acaba por ser aquela que nos influencia de forma inconsciente”.

Do ponto de vista do marketing, e antes de qualquer interacção com o consumidor, a marca deve ter “consciência de si”, saber responder à questão “Quem sou eu?”, definir concisamente os valores que defende e, no fundo, conhecer os pilares fundamentais da mesma, prosseguiu Sofia Calheiros. Os consumidores procuram as marcas com as quais “se relacionam de verdade”, que partilham as mesmas visões e defendem as mesmas causas. No fundo, que falam a sua linguagem e, esta relação faz-se sentir através da publicidade, onde a emoção comunica.

Ao longo do debate, transmitido em directo no site, no Facebook e no YouTube do PÚBLICO, abordou-se diversas vezes a importância da intervenção das marcas em causas. Susana Coerver citou um estudo Prosumer feito pela Fuel revelando que “55% dos consumidores acreditam que as marcas têm um papel mais activo na transformação da sociedade do que propriamente os governos, por exemplo”. E considera mesmo que o futuro pede que as marcas “encontrem os seus propósitos e os percorram, que sejam activistas”.

Estas devem ter um papel activo na vida dos consumidores, para além de atenderem às suas preferências, “ajudar os consumidores a aumentarem os seus níveis de inteligência emocional e também o pensamento crítico”, deixou claro Sofia Calheiros.

Para Ricardo Vargas, a publicidade e marketing são “ferramentas de influência de comportamento”. O marketing é sempre “um problema de foco”: “Quando não estamos a chegar aos nossos clientes é porque não estamos a focar bem no público-alvo”.

Quase a fechar o debate, Susana Coerver lançou a ideia de que “o mundo está cheio de gavetas cheias de ideias geniais que não servem a ninguém” para justificar também a importância da marca ter uma audiência bem definida. Dessa forma é pertinente entender se há espaço para uma nova invenção e, se sim, onde é que esta se encaixa. “Fazer [algo] porque os outros fazem” é um “péssimo exercício”.

Na abertura desta talk, Manuel Carvalho, director do PÚBLICO, e António Serra, reitor da Universidade de Lisboa, realçaram a importância da promoção da literacia mediática dos estudantes. “A Universidade de Lisboa apoia muito fortemente esta iniciativa do PÚBLICO, agradece-a. Agradece também esta generosidade da entrega de tantas assinaturas do PÚBLICO aos nossos estudantes”, sustentou António Serra.

Em Janeiro, realizaram-se duas PSuperior Talks, cujos temas foram “A comunicação na era dos algoritmos — Decides tu ou decidem por nós” e “Democracia e Estado de Direito: uma relação ameaçada”. Os debates do mês de Fevereiro arrancaram nesta terça-feira com O poder da Inteligência Emocional na publicidade e no marketing. O próximo realiza-se dia 23 de Fevereiro subordinado ao tema Como combater a desinformação?.

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