Das palavras ao desporto

O Governo, que inscreve no seu programa o desígnio de “colocar Portugal no lote dos 15 países com mais prática de actividade física e desportiva activos da União Europeia, até 2030”, prima pela ausência de respostas e de boas práticas partilhadas nestes documentos de referência, tornando tal desígnio num mero proclamar de intenções.

A Assembleia da República aprovou a 4 de Dezembro de 2020 uma resolução, publicada esta semana em jornal oficial, recomendando ao Governo um fundo de apoio ao desporto.

Um ano após o alerta do movimento desportivo face ao tremendo impacto da pandemia nos mais diversos domínios do desporto, e depois de nenhuma das medidas apresentadas a este propósito por diversas organizações desportivas em sede de discussão de Orçamento de Estado para 2021 terem sido aprovadas no Parlamento, saúda-se a iniciativa.

A criação de um fundo especial agora proposto, destinado a apoiar os clubes e associações desportivas em dificuldades financeiras devido ao impacto da pandemia da doença covid-19, através da captação de uma percentagem das receitas do Placard, e de financiamento proveniente do Instituto Português do Desporto e Juventude, I. P. foi objecto, em tempo oportuno, de um trabalho profundo com uma proposta concreta do Comité Olímpico de Portugal de criação do Fundo Especial de Apoio ao Desporto (FEAD) a partir de uma diferente repartição das apostas desportivas à cota de base territorial.

Esta proposta foi desde a primeira hora, em Abril de 2020, apresentada pelas organizações de topo do sistema desportivo ao primeiro-ministro, integrada na moção estratégica da 1.ª Cimeira das Federações Desportivas e sucessivamente reiterada junto do governo como absolutamente determinante para salvaguardar a sobrevivência das organizações desportivas que agonizam perante a ausência de receitas gerada pela suspensão das suas actividades e agravada pela assinalável quebra de membros e agentes filiados, da base ao topo do sistema desportivo, que projectam o sector para um quadro de recessão profunda.

Em verdade, vários governos europeus aprovaram e implementaram, de imediato no início da crise pandémica amplos pacotes de medidas extraordinárias de apoio ao desporto, seguindo, aliás, recomendações das Nações Unidas e da União Europeia.

A nível parlamentar, quer o Parlamento Europeu, quer a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, apresentaram moções de resolução e documentos de trabalho que atestam o impacto avassalador e as profundas consequências económicas e sociais no tecido desportivo europeu, e bem assim as respostas que os Estados membros têm apresentado para suster esta tendência, com o mesmo denominador comum:

Exortar as autoridades públicas a apresentar um plano de acção com medidas concretas de promoção do desporto de base e da actividade física tendo em vista o impacto prejudicial da pandemia, preservar a sustentabilidade do movimento desportivo europeu e assegurar que o desporto continue a proporcionar os seus benefícios aos indivíduos e à sociedade, atenta a sua inestimável relevância em matéria de saúde pública.

O Governo, que inscreve no seu programa o desígnio de “colocar Portugal no lote dos 15 países com mais prática de actividade física e desportiva activos da União Europeia, até 2030” e presentemente preside ao Conselho da União Europeia, prima pela ausência de respostas e de boas práticas partilhadas nestes documentos de referência, tornando tal desígnio num mero proclamar de intenções.

É impossível escamotear as evidências que estes, e muitos outros documentos produzidos pelas instituições europeias em matéria de política desportiva desde que o deporto figura no Tratado de Lisboa apresentam sobre a realidade portuguesa, em particular na omissão de medidas imediatas e tangíveis que a presente crise impõe, por demais evidente, ao qual o inócuo discurso propagandístico e demagógico não resiste, ridicularizando os seus protagonistas perante aqueles que no terreno desesperam na iminência da extinção, hipotecando o futuro de gerações de atletas.

Um discurso que não resiste também ao lugar-comum da ausência de alternativas fundadas, pois o Desporto Português não se limitou a reivindicar medidas, mas, numa frente unida, tem apresentado opções concretas, robustas e devidamente fundamentadas, prontas – assim haja vontade – a serem aprovadas e implementadas de imediato, como o fundo de apoio ao desporto, e muitas outras do conhecimento público.

É, por tudo isto, “Tempo de Agir” conforme o lema da Presidência Portuguesa da UE e, por uma vez, materializar esta resolução parlamentar em acção, pois ontem era tarde demais.

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