Estará o racismo institucionalizado nas forças de segurança? Como combatê-lo?

O que observamos é que, por não haver consequências penais para os agentes que praticam estes actos bárbaros, muitas vezes contra jovens de 14 ou 15 anos, gera-se um sentimento de impunidade por parte dos polícias, agravando o problema da violência policial.

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Nuno Ferreira Santos

Mussu, Kuku, Mc Snake são apenas alguns nomes dos dez jovens assassinados por agentes policiais nos últimos 15 anos em Portugal, sem que estes actos tenham resultado em alguma pena efectiva. Segundo o relatório do Comité Anti-Tortura do Conselho da Europa de 2018, Portugal é dos países da Europa Ocidental com mais casos de violência policial, sendo que os riscos destes abusos incidem sobretudo em afrodescendentes. Manuel Morais, vice-presidente da Associação Sindical de Profissionais de Polícia (ASPP), e licenciado em Antropologia, numa entrevista à SIC, conta que num inquérito feito aos polícias, onde foram questionados se “o crime tem uma relação directa com a etnia (negra e cigana)”, 90% dos inquiridos responde que sim. 

Estes são aspectos importantes que servem para a reflexão sobre o tema em questão: o racismo está institucionalizado nas forças de segurança? O que de facto observamos é que, por não haver consequências penais para os agentes que praticam estes actos bárbaros, muitas vezes contra jovens de 14 ou 15 anos, gera-se um sentimento de impunidade por parte dos polícias, agravando o problema da violência policial. 

Outro aspecto importante, que deve ser salientado, é o facto de o vice-presidente da ASPP, Manuel Morais, após ter feito estas declarações à SIC, ter sido alvo de uma petição por parte dos polícias que exigiam a sua demissão. Algo que veio a acontecer. Isto apenas demonstra, mais uma vez, o incómodo causado por este tema, particularmente nesta instituição, e a conivência entre os policias relativamente a estes actos criminosos. Algo que é também retratado na reportagem Invisíveis da SIC.

Um estudo feito pela Universidade de Coimbra mostra que 75% das queixas de racismo praticado por polícias nos últimos dez anos acabaram arquivadas. Apenas 30% das queixas seguiram para o Ministério Público, mas nenhuma delas resultou numa condenação. Em acréscimo, das queixas por discriminação racial praticadas por membros das forças de segurança analisadas no estudo, 48% foram de cidadãos afrodescendentes, 33% de etnia cigana e os restantes de pessoas de outras nacionalidades que não a portuguesa. 

O racismo ainda existe e deve ser combatido e, por isso, deve haver um debate alargado sobre quais as medidas a ser tomadas para colmatá-lo, não só nas instituições, mas na sociedade em geral. Um debate com ideias, soluções e argumentos, feito não apenas no espaço público, mas principalmente na comunicação social, pois não será certamente através da vandalização de estátuas, por muito controversas que possam ser, que se irá solucionar o problema do racismo.

A discussão de ideias é a melhor solução, melhor do que o extremar de posições que hoje existe, e que apenas dá alento para a capitalização destes acontecimentos pela extrema-direita, reforçando o seu discurso contra as minorias, impulsionador do ódio. Numa época marcada pela forte influência das redes sociais no enviesamento da opinião pública, e como a plataforma onde desencadeiam as polémicas e as discussões sobre os temas fracturantes como o racismo, cabe aos meios de comunicação social proporcionar um debate alargado com especialistas, activistas e os vários intervenientes na sociedade sobre estes temas. Só desta forma será possível combater estes problemas com clareza e objectividade. 

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