Pediu dinheiro ao banco e à família para fazer obras na casa do marido. Separou-se e ficou sem nada

Mulher queria ser ressarcida de quantias que gastou na realização de obras na casa pertencente ao ex-marido. Mas, o Supremo Tribunal de Justiça entende que o direito à restituição prescreve no prazo de três anos a contar do trânsito em julgado da sentença de divórcio. Para fazer as obras pediu dinheiro ao banco e à própria família

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Francisco Romao Pereira

Pediu dinheiro ao banco, aos pais, aos avós e até ao padrinho para construir uma moradia de sonho com um belo jardim, para viver com aquele que viria a ser o seu marido. Mas no fim do casamento não ficou com casa, nem com dinheiro. Tudo porque reclamou depois de passar o prazo para o poder fazer, diz o Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

“Pretendendo um dos ex-cônjuges ser restituído de quantias que gastou na realização de obras numa casa pertencente ao outro, o seu direito à restituição por enriquecimento sem causa prescreve no prazo de três anos a contar do trânsito em julgado da sentença de divórcio”, lê-se na decisão do STJ.

O divórcio foi decretado a 26 de Dezembro de 2014 e a acção para reclamar o valor deu entrada a 29 de Dezembro de 2017. Tinham passado precisamente três anos e três dias após o divórcio.

A mulher queria apenas a restituição de 75 mil euros, acrescidos de juros de mora, referentes a metade da mais-valia que entende que o ex-marido beneficiou com as obras, que realizou à sua custa, para construir a moradia e que é também o valor que esta entende que corresponde ao seu empobrecimento.

“Onde existia uma caixa de tijolo, com o valor de cerca de 50 mil euros, passou a existir uma moradia, com um belo jardim, valendo cerca de 200 mil euros”, lê-se na acção que colocou contra o ex-marido e onde descreve que usou ainda dinheiro dos familiares, não só para as obras, mas também para adquirir bens para a casa.

Ainda eram namorados e sonhavam fazer uma vida a dois, quando, em vez de comprarem uma casa, o homem propôs que finalizassem as obras de uma moradia que estava num terreno sua propriedade.

Estávamos em 2011, quando o casal decidiu, então, contrair um empréstimo bancário no valor de 60 mil euros. Mas o dinheiro não chegou para acabar as obras e a mulher recorreu ao auxílio dos familiares nomeadamente os pais e avós.

De acordo com a acção que colocou em tribunal, os pais entregaram cinco mil euros, os avós emprestaram-lhe mais 10 mil, tendo-lhe dado a título de prenda mais cinco mil euros, e o padrinho contribuiu com outros mil.

Refere a mulher que usou os mil euros do padrinho para adquirir o gradeamento que circunda a moradia e que os cinco mil euros, que os avós lhe deram como prenda, usou para comprar mobília de quarto e da sala.

Diz ainda que, com o seu dinheiro, além de materiais para as obras, e várias mobílias, também adquiriu ainda um televisor, candeeiros, cortinas, um desumidificador, uma ventoinha alta cromada e vários artigos de decoração. Alega que terá gasto um total de 40 mil euros. Acresce ainda que a mão-de-obra para a realização de todo o trabalho de pedreiro foi levado a cabo pelo seu pai de forma gratuita.

Casaram em Julho de 2013, mas o casamento terminou com o divórcio em Dezembro de 2014.

A mulher alega que mesmo depois do divórcio, e depois de ter de deixar a casa, uma vez que esta era propriedade do ex-marido, ainda pagou a sua parte da prestação do empréstimo bancário,  que contraíram em 2011 para a realização das obras, até Dezembro de 2015.

O tribunal de primeira instância não lhe deu razão no pedido de restituição das quantias contra o ex-marido por enriquecimento sem causa, porque entendeu que o prazo de prescrição para reclamar o valor começou no dia do divórcio e não no dia em que terminou de pagar o empréstimo, como defendia a mulher em tribunal.

A mulher recorreu para o Tribunal da Relação de Évora que também manteve a decisão sobre a questão do prazo e agora o STJ também foi no mesmo sentido: “Tal como as instâncias o fizeram, que a data do trânsito em julgado da decisão que decretou o divórcio (26 de Dezembro de 2014) é que deverá servir de ponto de partida para a contagem do prazo de prescrição, na medida em que foi esse o momento em que autora tomou conhecimento dos pressupostos do direito à restituição por enriquecimento sem causa. Portanto, como a acção foi proposta em 29 Dezembro de 2017, mostra-se ultrapassado o prazo legal de três anos e, consequentemente, prescrito o direito da autora”.

Para os juízes do STJ, neste caso, “a causa da deslocação dos valores patrimoniais da autora para o réu, de acordo com o alegado pela própria, foi o projecto de vida em comum que conceberam, do qual fazia parte a realização de obras e melhoramentos no imóvel pertencente ao réu, de modo a servir de morada do casal.

Logo, defende do STJ, “as contribuições monetárias da autora para a conclusão da moradia do réu tiveram, portanto, uma causa jurídica, concretizada na adopção dessa moradia como residência do casal, tendo a autora para aí canalizado essas contribuições. Com o divórcio de ambos, em de Dezembro de 2014, extinguiu-se a causa, deixando de haver justificação para o enriquecimento do réu”. 

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