Jovens, confiantes e conectados: eis os novos investidores que confundem Wall Street

Unidos através de fóruns e chats de redes sociais, pequenos investidores levaram o toque da geração Z a Wall Street, abalando-a – foi o que aconteceu com a Gamestop. Eis a história de alguns deles.

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James Villalobos, um consultor de comunicação para uma companhia de seguros em Nova Iorque, descarregou a aplicação da corretora Robinhood em Setembro. Estava hesitante em envolver-se na bolsa – “Eu nunca percebi o que era, o que fazia”  , mas, alguns meses depois, criou uma conta e comprou acções de companhias aéreas e de cruzeiros, pensando que as indústrias, gravemente afectadas pelas perturbações causadas pela covid-19, iriam eventualmente recuperar.

Começou a ver vídeos no YouTube sobre acções e juntou-se a um grupo de Facebook criado por um amigo, que está “realmente interessado em mercados de opções”. Villalobos perdeu, rapidamente, 1200 dólares. Mas estava pronto para recuperar o dinheiro.

Na segunda-feira, 25 de Janeiro, investiu 551 dólares num conjunto de acções que incluíam a BlackBerry Ltd e a AMC Entertainment Holdings Inc, parte de um grupo conhecido como “meme stocks”, pela sua popularidade em fóruns online como o Reddit.

Através de um iPhone, Villalobos estava a desempenhar o seu papel na onda de pequenos investidores retalho que desencadeou o caos nos mercados ao fazer subir a cotação de empresas como a GameStop, deixando Wall Street confusa, com os gigantes dos fundos de alto risco (hedge funds) americanos a comprar e a vender mais acções do que tinham feito numa década, de acordo com a Goldman Sachs.

O facto de Villalobos ter 25 anos não deveria surpreender ninguém. A empresa Apex Clearing, que facilita transacções a corretores, disse que as quase seis milhões de contas que abriu em 2020 representam um aumento de 137%, em comparação com o ano anterior. Cerca de um milhão pertenciam a investidores da Geração Z – nascidos nos finais dos anos 90, ou até mais novos, com uma idade média de 19 anos. A Robinhood afirma que a idade média dos seus 13 milhões de usuários é de 31 anos.

Em entrevistas com mais de uma dúzia de utilizadores de corretoras online, a Reuters descobriu uma geração mais nova, que olha para o trading de forma muito diferente do que os engravatados de Wall Street. São homens e mulheres que se sentem confortáveis nas comunidades digitais, seja a monitorar threads no Reddit, a seguir dicas no Twitter ou a trocar ideias em grupos do Slack. E são cada vez mais neste tempo de investimentos online, baratos e rápidos, impulsionados pelos programas de estímulo do Governo americano e pelo grande tempo livre que a pandemia da covid-19 trouxe.

Embora grande parte dos entrevistados se tenham descrito como investidores de “buy and hold” [comprar e manter], que geralmente evitam jogadas de swing trading, confessaram estar abertos ao ocasional jogo das acções especulativas.

“Eu olho para isto, essencialmente, como uma aposta. Não invisto mais do que aquilo que eu estou disposto a perder”, afirma Will Callewaert, um utilizador da Robinhood com 27 anos, que começou a investir nos mercados durante os confinamentos provados pelo novo coronavírus.

Confiança

J.J. Buckner, de 29 anos, que fala sobre bolsas a 250 mil seguidores no YouTube, perdeu mais de 7 mil dólares em opções para a AMC, Blackberry e Nokia Oyj, na quinta-feira. Mas disse aos seus seguidores que as está a segurar, na esperança de que a acção continue. “É um momento que vai ficar marcado na história”, afirmou à Reuters.

Uma das características que faz as pessoas gostarem, com tanta confiança, de Buckner é o seu poder sobre a multidão. “O que vimos no Reddit, esta semana, é que tu precisas de um grupo para ser eficaz”, disse Evan Keegan, com 25 anos e relações públicas de serviços de finanças, que tem negociado na Robinhood nos últimos sete anos. “Tu precisas de ter pessoas suficientes, porque o investidor individual comum não está a movimentar o mesmo dinheiro que os hedge funds estão.”

Ajuda o facto de o investimento individual ser hoje muito mais simples do que durante a bolha das dot.com do final dos anos 90, quando traders tinham de pagar taxas de transacção mais altas e comprar acções inteiras para singrar, segundo profissionais de gestão de investimentos.

Agora, o advento de plataformas gratuitas e acções fraccionadas permite aos investidores escalar em investimento, sem colocar assim tanto dinheiro em jogo de uma vez. Nisha Desai, directora executiva da Andav Capital, uma empresa de capital de risco nova-iorquina, disse que, embora estes investidores jovens possam não estar a seguir o livro das regras, não quer dizer que não possam fazer dinheiro.

“Se conseguires investir amanhã e sair em duas semanas, quem pode dizer que não é uma transacção eficiente ou que não é uma decisão racional?”, afirmou Desai.

Villalobos ganhou 3800 dólares nas primeiras horas de negociação das acções da Blackberry e AMC com o caso Gamestop, mas a maior parte desses ganhos evaporaram-se, quando corretores, incluindo a Robinhood, instauraram restrições de trading de acções, devido à volatilidade.

Depois de ter estado a depositar dinheiro regularmente na sua conta da Robinhood, Villalobos está a planear parar até ao fim de Fevereiro. “Eu disse a mim próprio, esta semana, ‘calma, já perdeste o suficiente’”, afirmou.

Mas, na segunda-feira, Villalobos disse que tinha mudado de ideias, depois de ler algumas conversas na Internet, e investiu outros 510 dólares em opções de compra da AMC. Agora, está à espera do que vai acontecer a seguir.