Revolta na Guiné Bissau pela morte de um activista social por falta de assistência médica

Jurista e rapper Bernardo Catchura morreu depois de lhe ter sido recusada uma cirurgia em dois hospitais. Associação exige a demissão do ministro da Saúde. Polícia reprime violentamente vigília.

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Funeral de Bernal, no sábado facebook

A morte de um jurista e activista social por falta de assistência médica, na Guiné -Bissau, está a provocar uma revolta no país. A Associação Juvenil de Protecção dos Direitos Humanos exige ao Presidente Umaro Sissoco Embaló que demita o ministro da Saúde, responsabilizando-o pela morte de Bernardo Catchura, que andou de hospital em hospital até morrer.

Perante a revolta crescente de activistas sociais, juristas e jovens, a Procuradoria-Geral da República anunciou, esta terça-feira, que foi aberto um inquérito para apurar responsabilidades pela morte de Bernal - como era conhecido.

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A vice-procuradora, Teresa Mendes, pediu “calma” aos familiares, amigos e seguidores do activista e rapper, mas um colectivo de advogados liderado por Sana Candé, do Movimento de Cidadãos Vigilantes Inconformados (de que Bernal era ex-presidente), anunciou que vai patrocinar uma acção judicial para exigir “total responsabilização” dos implicados, “por acção ou por omissão”.

Bernal sentiu-se mal na tarde de quinta-feira da semana passada, disse no Facebook o ex-director da Antena de TV da Guiné-Bissau, o jornalista Tagna Na Fafé. No mesmo dia, foi-lhe dito, no Hospital Simão Mendes, o principal do país, que necessitava de uma cirurgia com urgência.

Porém, devido à falta de oxigénio para pessoas em estado considerado menos grave, foi enviado para o Hospital Militar Sino-Guineense, onde havia oxigénio mas não havia cirurgião.

O paciente, de 39 anos, casado e pai de três filhos, foi depois no seu próprio carro para uma clínica, onde morreu já na sexta-feira.

No sábado, no funeral, juntaram-se no cemitério centenas de jovens revoltados com este caso e com a precariedade na Guiné-Bissau, segundo o site e-Global. Tiago Seidi, da Associação dos Filhos e Amigos de Susana (de solidariedade social e defesa dos direitos humanos), disse ser inconcebível que no século XXI na Guiné-Bissau morram pessoas por coisas que já não matam.

“Está claro que Bernal morreu por falta de oxigénio. Devemos reflectir se isto é admissível num país com 47 anos de independência. O Bernal morreu pelas causas pelas quais lutava. Ele lutou e cantou para que o país tivesse saúde, escolas e não houvesse corrupção”, disse Lesmes Monteiro, também jurista e rapper, no funeral do músico. Bernal era rapper e, com o nome WP, fazia parte do grupo Cientistas Realistas.

Na segunda-feira, um grupo de jovens vestidos com roupas pretas e de velas na mão tentou realizar uma vigília em frente ao Ministério da Saúde, mas foi obrigado a dispersar pela polícia, que agrediu alguns dos participantes e deteve outros. À Lusa, um elemento da organização disse que vão delinear outras formas de pedir que seja feita justiça pela morte de Bernardo Catchura.

Nesse sentido, a Associação Juvenil de Protecção dos Direitos Humanos considera que o ministro António Deuna “tem responsabilidades” na morte do jurista e, numa carta citada pela Lusa, exige ao Presidente Umaro Sissoco Embaló que responsabilize o Governo e demita o ministro.

“A associação faz fé em como, na qualidade de chefe de Estado, não lhe é estranho o extremo e inquietante quadro dos direitos humanos” na Guiné-Bissau, caracterizado por mortes de cidadãos nos hospitais devido à falta de assistência e condições.

Para a associação dirigida por Vladimir Gomes, a falta de oxigénio no Hospital Simão Mendes tem sido uma das principais causas de mortes de doentes, pelo que o ministro deve ser demitido “por provada incapacidade de dar resposta às necessidades do povo”.

Numa outra carta dirigida ao primeiro-ministro, Nuno Nabian, a que a Lusa também teve acesso, a associação reclama a demissão da direcção do hospital.

Em conferência de imprensa, na segunda-feira, a direcção do hospital negou que Bernardo Catchura tenha morrido devido à falta de oxigénio, afirmando que a morte se deveu a complicações intestinais.

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