Amnistia acusa Lukashenko de ignorar denúncias de tortura, líder da oposição pede coragem à UE e EUA

Svetlana Tikhanouskaia considera que resposta da comunidade internacional à crise na Bielorrússia está a ser “modesta” e pede mais “pressão” sobre o regime. Amnistia Internacional denuncia “fracasso total” do sistema judicial bielorrusso ao não dar seguimento a centenas de denúncias de tortura.

Foto
Em Setembro, Svetlana Tikhanouskaia mostrou no Parlamento Europeu imagens de manifestantes agredidos pela polícia STEPHANIE LECOCQ/EPA

A líder da oposição na Bielorrússia, Svetlana Tikhanouskaia, apelou aos Estados Unidos e à União Europeia para serem mais “corajosos e fortes” na pressão sobre o Presidente Aleksander Lukashenko e pediu uma investigação internacional à violação dos direitos humanos no país, fazendo eco das denúncias da Amnistia Internacional, que acusa o regime de instrumentalizar o sistema judicial para punir as vítimas de tortura.

Numa conferência online organizada pelo think tank European Council on Foreign Relations sobre as relações entre os Estados-membros e a Bielorrússia em 2021, em que participaram vários ministros dos Negócios Estrangeiros da UE, nomeadamente da França, Roménia, Lituânia e Polónia, Tikhanouskaia defendeu a realização de eleições livres e justas e pediu medidas mais duras contra o regime de Lukashenko.

“É crucial que seja imposta pressão aos responsáveis pelas violações dos direitos humanos e civis, mas também que sejam visados funcionários e empresários corruptos”, afirmou Svetlana Tikhanouskaia, lamentando que “a reacção da comunidade internacional à crise política na Bielorrússia seja bastante modesta”.

Após as presidenciais de Agosto do ano passado, que deram a reeleição de Lukashenko com 80% dos votos, a UE, o Reino Unido, os Estados Unidos e o Canadá consideram as eleições fraudulentas e não reconheceram a vitória do autocrata que governa a Bielorrússia há 26 anos.

Desde então, a UE já impôs três rondas de sanções a um total de 88 figuras do regime bielorrusso, incluindo Lukashenko, mas a oposição pede que essa lista seja alargada e que as medidas sejam mais duras, uma vez que as sanções dos Estados membros, dos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido ainda não levaram o regime a ceder.

Pelo contrário, as forças de segurança bielorrussas têm reprimido as vozes dissidentes, e as principais figuras da oposição estão presas ou exiladas, o que não tem demovido os bielorrussos de saírem às ruas todas os fins-de-semana para exigirem novas eleições, apesar de enfrentarem o punho de ferro do regime – desde o início dos protestos, já morreram pelo menos quatro manifestantes e mais de 30 mil pessoas foram detidas.

Tortura

Em Dezembro do ano passado, a alta comissária das Nações Unidas para os direitos humanos, Michelle Bachelet, acusou as forças de segurança bielorrussas de tortura e exigiu a libertação imediata de todos os presos políticos.

Mais de um mês depois, o regime continua a deter manifestantes pacíficos – só no último fim-de-semana foram detidos 160 pessoas – e ainda não foi aberta qualquer investigação criminal aos relatos de tortura, apesar de as próprias autoridades bielorrussas terem recebido mais de 900 denúncias de abusos cometidos pela polícia desde o início dos protestos.

Num relatório publicado esta quarta-feira, a Amnistia Internacional acusa o regime de Lukashenko de instrumentalizar o sistema judicial para punir as vítimas de tortura, em vez de levar os autores desses actos à justiça.

“Temos repetidamente apelado a investigações eficazes que levem os responsáveis [pelos actos de tortura] à justiça, mas há pouco esperança que isso aconteça num sistema que não só protege a polícia com o anonimato, como incentiva a intimidação e a violência contra vítimas e testemunhas”, acusou Marie Struthers, directora da Amnistia Internacional para a Europa Oriental e Ásia Central.

No relatório, a Amnistia cita fotografias, vídeos e testemunhos de vítimas de tortura, que dizem ter sido encarcerados e espancados pelas forças de segurança, vendo-se privadas de água, comida e medicamentos durante vários dias.

A organização não-governamental demonstra particular preocupação com os relatos que chegam com centro de detenção de Akrestsina, em Minsk. “Quanto mais chorássemos ou implorássemos para não sermos espancados, mais espancados éramos”, contou Tsimur (nome fictício), um dos manifestantes detidos, à Amnistia.

Perante o “fracasso total” do sistema judicial bielorrusso em garantir “responsabilização” pela tortura de manifestantes, Marie Struthers apela à comunidade internacional para tomar medidas e pôr fim à impunidade do regime.

“Governos, organizações internacionais e regionais devem usar todas as suas forças para pressionarem as autoridades bielorrussas a pôr fim a este ataque aos direitos humanos”, afirmou Struthers. “Também apelamos à comunidade internacional para que tome todas as medidas possíveis para trazer justiça à Bielorrússia”, acrescentou.

Sugerir correcção
Comentar