Facebook criticado por pausas na monitorização de mensagens de abuso infantil na União Europeia

O número de denúncias e alertas sobre crianças desaparecidas caiu 46%.

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As mudanças são uma resposta à nova directiva de privacidade da União Europeia Nelson Garrido

O Facebook está a ser criticado por organizações de crianças desaparecidas devido aos planos para encriptar as conversas no Messenger por defeito tal como já acontece no WhatsApp. O problema é que isto pode dificultar o trabalho de quem procura pistas de abusos de menores onlineNa União Europeia, onde o Facebook já não permite que as autoridades acedam a mensagens suspeitas, o número de denúncias e alertas sobre crianças desaparecidas caiu 46% nas últimas três semanas.

O alerta foi feito esta semana pelo Centro Nacional de Crianças Desaparecidas e Exploradas (NCMEC na sigla inglesa), uma organização com sede nos Estados Unidos ​que denuncia e procura crianças desaparecidas e exploradas sexualmente.

Os planos do Facebook para aumentar a encriptação dos serviços de mensagens, que foram inicialmente anunciados em 2019, tornam virtualmente impossível que uma conversa na rede social seja interceptada por terceiros (os conteúdos apenas estão disponíveis para o emissor e receptor). E dificultam uma série de parcerias da plataforma com autoridades para prevenir e detectar exploração infantil. 

Desde dia 21 de Dezembro que estes programas estão em pausa na União Europeia devido à entrada em vigor da e-Privacy Directive — uma nova directiva de privacidade concebida para limitar o que as empresas podem fazer com as mensagens e os metadados (por exemplo, localização, tipo de computador, hora de envio) dos utilizadores.

A directiva também proíbe a intercepção ou vigilância de comunicações e metadados sem consentimento explícito das pessoas envolvidas.

A Comissão Europeia está a ponderar excepções para proteger as crianças online. Apesar da cautela do Facebook, até então, empresas como a Google e a LinkedIn mantiveram a monitorização das plataformas para abusos de menores enquanto uma decisão final não chega.

É um dos motivos pela NCMEC criticar o Facebook pela sua interpretação das novas regras.

O PÚBLICO contactou o Facebook para mais detalhes, mas não obteve resposta até à publicação deste artigo. 

Zuckerberg defende direito à privacidade

Para o presidente executivo do Facebook, porém, a privacidade é um valor fundamental. “Acredito que o futuro das comunicações vai cada vez mais passar para serviços privados e encriptados, onde as pessoas podem estar confiantes de que o que dizem umas às outras está seguro”, disse Mark Zuckerberg, aquando o anúncio de 2019 de expandir a encriptação por defeito no Facebook.

O objectivo é transformar as redes sociais da empresa em espaços de comunicação mais do que espaços de partilha. É uma mudança que surge após anos difíceis, no seguimento das eleições presidenciais americanas, do escândalo da consultora política Cambridge Analytica e das repetidas explicações dadas no Congresso americano e no Parlamento Europeu. 

A missão de privilegiar a privacidade foi ecoada esta semana por Monika Bickert, responsável pela política global do Facebook que foi convidada a depor no Parlamento Britânico.

“Queremos ter a certeza de que estamos a proporcionar uma experiência que mantém as pessoas seguras, especialmente para os crimes que consideram mais próximos e mais graves”, sublinhou Bickert, notando que “perda de dados” e “roubo de dados” estão entre os crimes que mais preocupam os utilizadores.

Em 2019, quando o Facebook primeiro anunciou as intenções para aumentar a encriptação, os governos dos EUA, Reino Unido e Austrália pediram à rede social para criar uma forma de as autoridades conseguirem aceder a mensagens encriptadas nas aplicações da empresa. Numa carta aberta endereçada a Mark Zuckerberg, políticos dos três países escrevem que “melhorias de segurança no mundo virtual não devem tornar as pessoas mais vulneráveis no mundo real”.

Apesar do Messenger ainda não ser encriptado por defeito, desde 2016 que é possível optar por uma “conversa secreta” (encriptada) na aplicação para telemóvel (Messenger > ícone (i) no canto superior direito > Abrir conversa secreta). 

A NCMEC pede que os cidadãos europeus defendam a criação de excepções claras para serviços de monitorização de abusos de menores. “Estão a ser tomadas decisões que dão prioridade aos esforços para ter um direito absoluto à privacidade acima de esforços acabar com a exploração sexual de crianças”, critica a organização em comunicado.

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