Novas pistas de BTT deixam apreensivos os caminhantes do Jamor

Mata é usada para passeios pedestres e as pistas de BTT já existem há alguns anos, mas a sua reformulação está a gerar receios. Direcção do Jamor garante que os peões vão poder continuar a usufruir do espaço em segurança.

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A nova sinalização da mata alerta que é proibido circular a pé nas pistas Filipa Fernandez
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O BTT já se pratica neste local há vários anos Filipa Fernandez
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A intervenção abriu novos caminhos, mais largos Filipa Fernandez

Como muitas crianças pequenas, os filhos de Jorge Bento maravilham-se de cada vez que vêem um ciclista a voar em grande velocidade. Caminhantes assíduos na mata do Jamor, habituaram-se a ver praticantes de BTT a percorrer os trilhos sinuosos entre as árvores e a saltar os obstáculos próprios do terreno. “Tem de se ter algum cuidado, mas foi sempre uma convivência pacífica”, diz Jorge Bento.

Ele teme que esses dias tenham chegado ao fim. No último mês, o Centro Desportivo Nacional do Jamor (CNDJ) abriu novas pistas para bicicletas e espalhou sinalização que está a deixar apreensivos moradores de Linda-a-Velha e da Cruz Quebrada, receando que em breve deixem de poder usufruir de um dos poucos espaços verdes que têm à disposição.

O CNDJ garante que não e assegura que a intervenção, que ainda não está concluída, até visa melhorar as condições de segurança e convivência entre todos os que procuram o local.

Na encosta de Santa Catarina, que desce a partir do compacto urbano de Linda-a-Velha até à Faculdade de Motricidade Humana e aos courts de ténis do Jamor, existe uma mata que os residentes desta zona do concelho de Oeiras encaram como o seu pequeno pulmão verde, à falta de parques urbanos nas proximidades. “Quando queremos ir a um parque com as crianças temos de pegar no carro”, observa Maria Álvares.

No local há pistas de BTT e um centro de arborismo há vários anos. No fim de 2020, o CNDJ começou a intervir nos trilhos cicláveis, dedicados ao enduro e ao cross country olímpico (XCO), duas disciplinas do ciclismo todo o terreno. “Fruto de uma intensa utilização que superou inclusivamente as nossas expectativas, verificou-se a necessidade de recuperar essa instalação, uma vez que a mesma revelava já algum desgaste, e de melhorar as suas condições de utilização e de segurança, quer para os atletas que a utilizam quer para os restantes utentes do CDNJ”, explica Paulo Pires, director do centro desportivo.

Caminhos largos foram abertos e em vários sítios da mata surgiram placas a proibir a circulação pedonal. Quem ali caminha regularmente queixa-se de que as pistas para bicicletas se sobrepõem aos percursos para peões em alguns locais e que se tornou inseguro andar por ali a pé.

“Aquilo que era um momento de paz tornou-se um momento de ansiedade”, relata Maria Álvares, que pertence a um grupo de whatsapp que diariamente se encontra na mata para um passeio. “Há um caminho claramente pedestre, começamos a subi-lo e desembocamos numa pista de bicicletas. Isto traz muito mais risco para nós e para os ciclistas, gera-se um conflito entre utilizadores”, lamenta.

Paulo Pires diz, no entanto, que a “a intervenção em curso, ao redesenhar e separar os percursos, visa minimizar a possibilidade de conflito” e que foram já “desviados mais de 400 metros de percursos das pistas XCO que se encontravam sobrepostos a percursos pedonais”. O director do CNDJ afirma também que está “em curso o reforço da colocação de sinalética específica, quer para os utentes em geral, quer para os utilizadores das pistas, com o objectivo de garantir a segurança de todos”.

Na semana passada houve uma reunião entre alguns moradores, a Associação Vamos Salvar o Jamor e os directores do CNDJ e do Instituto Português do Desporto e Juventude, Vítor Pataco, que tutela o centro desportivo. Ficaram combinadas algumas alterações ao projecto inicial e discutiram-se formas de diminuir os potenciais conflitos entre ciclistas e peões. Nos planos do CNDJ está a criação de “passagens desniveladas” nos cruzamentos, a colocação de “cercas de protecção em madeira nos locais críticos” e a aplicação de “um pavimento em saibro nos caminhos pedonais por forma a garantir a sua diferenciação visual”, explica Paulo Pires.

“Esta é uma zona maciçamente usada para desporto informal, para convívio. E nunca vi tanta gente a usar o Jamor como agora”, constata Carlos Branco, presidente da Vamos Salvar o Jamor. “Tem tido muita utilização durante a pandemia”, confirma Jorge Bento. Além de a usar para exercício físico a pé ou de bicicleta, Jorge recorre à mata para satisfazer a sua curiosidade ornitológica. Já por ali fotografou aves como o cartaxo, o chapim-azul, o pisco-de-peito-ruivo ou o guarda-rios. “Isto tem aqui um potencial enorme, até para divulgação ambiental”, comenta.

Durante os trabalhos mais recentes foram abatidas duas árvores e “a movimentação das máquinas danificou algum do subcoberto arbustivo”, admite Paulo Pires. Mas isso até nem é negativo, acrescenta o responsável, porque “a sua regeneração natural será rápida” e, assim, “contribui-se ainda para a redução da carga térmica, o que tem um impacto positivo em termos da protecção de incêndios”. O director do centro diz também que serão plantadas cinco novas árvores na zona.

“Tenho poucas garantias de que aquele espaço possa voltar a ser utilizado como era”, receia Maria Álvares. “Estamos a cair no erro de artificializar ainda mais um espaço natural”, comenta Tiago Reis, que participou na reunião da semana passada. “Vamos ter de estar muito vigilantes”, conclui. Já Jorge Bento desconfia que daqui a não muito tempo o Jamor fique quase exclusivamente para utilização desportiva de alta competição e os cidadãos tenham de se contentar com o Eixo Verde e Azul, um projecto que está a nascer na margem do rio. “Qualquer dia andamos todos em fila indiana.”

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