Ex-presidiário eleito Presidente com poderes reforçados no Quirguistão

Há três meses, Sadyr Japarov estava preso, mas a insurgência contra o seu antecessor catapultou-o para a presidência. Prometeu combater a corrupção e acabar com o caos político.

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Japarov foi eleito com perto de 80% dos votos IGOR KOVALENKO / EPA

Há cerca de três meses, Sadyr Japarov estava na prisão onde cumpria uma pena por rapto de um governador. No domingo, o político nacionalista foi eleito Presidente do Quirguistão com a missão de pôr fim ao ciclo de turbulência que tomou conta do país da Ásia Central nos últimos anos.

Japarov obteve uma vitória robusta com quase 80% dos votos, de acordo com a Comissão Eleitoral, conseguindo facilmente a eleição sem necessidade de uma segunda volta. O segundo candidato mais bem colocado não conseguiu ir além dos 7%, diz a Reuters.

No seu discurso de vitória, Japarov admitiu chegar ao poder num momento de “dificuldades e crise”, mas apontou o caminho para o futuro. “Um ou dois anos não serão suficientes para resolver tudo, podemos fazê-lo em três ou quatro anos e irá ser necessário estabilidade”, afirmou o novo chefe de Estado.

Para além de escolherem um novo Presidente, os quirguizes também votaram a favor de mudanças constitucionais que reforçam os poderes presidenciais, dotando o chefe de Estado de ampla competência legislativa e executiva, num modelo semelhante ao de outros regimes da Ásia Central, explica a Rádio Europa Livre. Em Março, será convocado um novo referendo para que seja votado o esboço da nova Constituição.

As eleições presidenciais foram marcadas depois de meses de elevada tensão no país, que culminaram com a demissão do Presidente Sooronbay Jeebenkov. Antes, dois outros chefes de Estado foram afastados em condições semelhantes, em 2010 e 2005.

Japarov, de 52 anos, é uma figura controversa no Quirguistão. Esteve exilado durante quatro anos no Chipre e foi preso em 2017 acusado de ter orquestrado o rapto do governador da província de Issyk-Kul, alguns anos antes. Na altura, Japarov era o líder de um movimento que exigia a nacionalização da mina de ouro de Kumtor, explorada por uma empresa canadiana.

Japarov foi libertado durante os protestos que eclodiram em Outubro contra os resultados das eleições legislativas, que a oposição disse terem sido fraudulentas. Num processo confuso e polémico, Japarov foi escolhido como primeiro-ministro. Dias depois, Jeebenkov demitiu-se e, dez dias depois de ter saído da prisão, Japarov tornou-se Presidente interino.

Eleito agora Presidente, Japarov garantiu que não serão repetidos os erros do passado e prometeu erradicar a corrupção. “Nos últimos 30 anos, a corrupção ganhou raízes no nosso país em quase todas as áreas da nossa vida. A partir de agora, não iremos tolerar esse ultraje”, afirmou.

Em termos diplomáticos, Japarov deverá manter relações próximas com a Rússia, principal aliado do Quirguistão desde a dissolução da União Soviética. Moscovo tem uma base militar no país e é um dos principais parceiros comerciais. Pouco depois de votar, Japarov disse que a Rússia é um “parceiro estratégico”.

Um dos principais desafios do novo Presidente é a reanimação da economia que tem sofrido com o impacto da pandemia da covid-19 sobre o turismo e os transportes. A falta de emprego obriga centenas de milhares de quirguizes a emigrar todos os anos, sobretudo para a Rússia e China – calcula-se que dois milhões de quirguizes, num país de seis milhões, estejam a trabalhar fora neste momento.

A eleição de um Presidente com poderes reforçados também será um teste para perceber se o Quirguistão irá conseguir livrar-se da instabilidade que tem marcado os últimos anos sem cair no autoritarismo. À Al-Jazeera, Talgat, um apoiante da oposição, mostrava as suas dúvidas quanto ao futuro. “A vitória de Japarov não irá trazer nada de bom porque a forma como ele chegou ao poder permanece suspeita.”

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