Pandemia encheu de flores a lente do fotógrafo: “Tanta beleza é coisa divina”

A delicadeza e generosidade das plantas das áreas protegidas do Estuário do Sado e da Serra da Arrábida “apanhadas” pela lente de Pedro Narra.

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Lírio-germânico (Iris germânica) da Arrábida
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Rosa-albardeira (Paeonia broteroi) da Arrábida
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Lírio-germânico (Iris germânica) da Arrábida
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Papoila (Papaver rhoeas) de meio urbano
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Esteva (Cistus ladanifer) da Arrábida
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- Alcachofra brava (Cynara humilis) do Estuário do Sado
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O livro

Selvagens é o título de um livro enganador: sugere agressividade mas oferece delicadeza, parece de fotografias mas é de sentimentos. A obra, do fotógrafo setubalense Pedro Narra, mostra as flores do estuário do Sado e da serra da Arrábida sem pretensões científicas ou pedagógicas e até sem critérios objectivos.

A escolha das espécies foi aleatória porque as prioridades eram somente os gostos pessoais.

“É de paixão que se fala aqui”, explica o autor na introdução em que sublinha com as palavras o que venera com a objectiva, quando escreve que “tanta beleza é coisa divina”. As dezenas de fotografias comprovam. Das capuchinhas (Tropaeolum majus), ou da flor-dos-passarinhos (Ophrys scolopax), ao dente de leão (Taraxacum officinale) e ao lírio-germânico (Iris germanica), passando pela alcachofra brava (Cynara humilis) ou pela vulnerália (Anthyllis vulneralia), são muitas as flores que cativaram o fotógrafo.

“E foi por elas, algumas discretas, diria até envergonhadas, outras perfumadas, arrisco dizer ousadas, que resolvi compilar este livro”, refere Pedro Narra.

Ao PÚBLICO, o autor conta que teve a ideia quando a pandemia estava a chegar a Portugal. “Tinha acabado o livro do estuário e queria começar um novo projecto mas faltavam-me ideias. Foi um pouco antes do confinamento, ia saindo em passeios pelo campo, com a minha filha, no tempo das orquídeas, na Arrábida, e surgiu este projecto”, relata.

Partiu então em busca das espécies que lhe “saltavam à vista” pela sua “graciosidade” ou “pelo lado indomável” e estas últimas deram foram mais difíceis de “apanhar”, por encontrarem em locais “onde só os mais afoitos se arriscam”, como troncos de árvores ou rochedos escorregadios.

As plantas escolhidas foram cuidadosamente fotografadas, em estúdio, para evitar que o contexto, “muitas vezes pelo lado positivo, outras pelo negativo” lhes “retirasse protagonismo”.

“Dedico o tempo necessário a cada uma. Às vezes estou três ou quatro horas de roda de uma única flor. Em estúdio chegam a ser oito horas. Chego a fazer três mil fotografias a uma única flor. Rebentava com uns quantos cartões. Às vezes fazia quatro ou cinco mil fotos numa tarde ou numa noite”, diz Pedro Narra.

Já a escolha é um processo mais fácil. “Começo por deitar fora o que não me interessa logo à partida e depois vou eliminando em várias fazes até ficar com quatro ou cinco fotos”, explica.

O resultado final é um “livro de arte, de cabeceira, que nem texto tem”. Nem o número das páginas consta, para deixar todo o espaço às flores. No total são um pouco mais de 100 páginas, algumas bem surpreendentes mesmo para quem olha para estas plantas há uma vida inteira. Por exemplo, poucos repararam já que as comuns flor-dos-rapazinhos apresentam realmente imagens semelhantes a pequenas crianças, assim como a flor-dos passarinhos contém uma pequena ave em flor.

O quotidiano de muitos mudou depois de verem o livro. “Tenho amigos, leitores, que me dizem, ‘é pá Pedro, agora vou para o trabalho a olhar para o chão, à procura de flores’”, partilha o fotógrafo.

Uma obra que António Bagão Félix, autor do prefácio, considera um “hino botânico à vida”. O conhecido economista aceitou escrever pelo fascínio que tem pelas plantas e pela máquina fotográfica.

“A fotografia é uma das poucas realidades que têm poder sobre o tempo. Um poder que aqui fica bem evidenciado, em defesa e como testemunho de espécies vegetais que merecem viver e que, também, nos ajudam a viver”. 

A edição de autor contou com o apoio de várias instituições locais, como a Entidade de Turismo do Alentejo e a Secil, empresa intimamente ligada à serra da Arrábida e ao estuário do Sado, pela fábrica do Outão, que conta quase cem anos. A empresa que, durante um século, tem apoiado “centenas de iniciativas promovidas por setubalense, célebres ou anónimos”, diz que este livro “inscreve-se, com grande mérito, na nobre tradição de louvar a Serra da Arrábida”.

Selvagens – Estuário do Sado e Arrábida está à venda por 45 euros e, como algumas das plantas que retrata, só se encontra nalguns locais na zona de Setúbal.

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