Galp: “Não há nenhum projecto de refinação de lítio para Matosinhos”

Responsável da Galp participou numa reunião pública do executivo de Matosinhos disse que quer manter o espaço com uma “utilização de base industrial, alinhado com a transição energética” e diz que haverá emprego nos próximos três a cinco anos.

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Nelson Garrido

Foi uma “decisão complexa e difícil”, tomada após um “longo e rigoroso processo de maturação”, mas a Galp mantém que o encerramento da refinaria de combustível em Leça da Palmeira é mesmo uma inevitabilidade. Isso já está decidido, e é irreversível. Mas falta decidir tudo o resto, nomeadamente o que vai acontecer com os trabalhadores. O único compromisso que a empresa assume é que “irá tratar com respeito e a dignidade que se exige” cada um dos 401 colaboradores que estão naquele complexo industrial.

Foram estas palavras que José Carlos Silva, responsável pela refinação da Galp e membro da administração da empresa, tinha para levar aos representantes da Comissão de Trabalhadores da refinaria que foram convidados a participar numa reunião pública ordinária do executivo da Câmara Municipal de Matosinhos.

Depois de se referir à refinaria de Leça como a menos competitiva não só da Península Ibérica como da Europa, José Silva disse que a empresa “tem feito muitos estudos para identificar oportunidades”. “Mas não encontramos racionalidade económica nem estratégica para continuidade da refinação”, argumentou o responsável, depois de elencar as muitas alterações regulamentares e legislativas que vão dificultar a competitividade, e necessidade, da empresa.

Emprego a médio prazo

Na declaração inicial que fez ao executivo municipal, e a que assistiram os representantes dos trabalhadores e sindicatos (que falaram no inicio da sessão, e não tiveram direito a fazer perguntas), José Silva defendeu que a empresa “quer reforçar competitividade e eficiência, e adaptar a sua actuação às necessidades do mercado”. “Mantemos o estudo de várias possibilidades. O futuro das instalações de Matosinhos ainda está em análise, o que posso desde já dizer é que nunca houve nenhum projecto concreto para nenhuma estrutura da cadeia de baterias”, afirmou o gestor, desmentindo as notícias de que já havia acordos para fornecimento de lítio a outras empresas.

Numa segunda ronda de perguntas, e instado a responder sobre a intenção que a Galp poder transformar as suas instalações numa refinaria de lítio, José Carlos Silva disse que  podia dar uma resposta “breve, mas suficientemente clara”: “Não existe nenhum projecto de refinação de lítio para Matosinhos. O que existe é o estudo da cadeia de valor de baterias, porque a armazenagem de energia está no DNA da Galp”.

O responsável da refinação da Galp diz que projecto em Leça da Palmeira continuará a trazer emprego “nos próximos três a cinco anos” e que é intenção da empresa manter aquele espaço para “uso industrial, alinhado com a transição energética”. José Silva diz que é intenção da empresa manter naquela localização a actividade logística, onde há 60 trabalhadores em actividade. E que está lá instalado “um pólo para a mobilidade sustentável, que emprega já 60 engenheiros”, referindo-se à empresa Flow.

“É preciso notar ainda que a execução da decisão agora comunicada não vai ocorrer ‘hoje’. Esta decisão implica um processo progressivo de descomissionamento, a que se segue o desmantelamento das instalações. Este projecto só por si gera a criação de postos de emprego ao longo dos próximos três a cinco anos”, explicou.

De resto, e dizendo ter os colaboradores da refinaria de Leça no centro das preocupações, a empresa vai suspender a contratação de trabalhadores para o grupo, enquanto não perceber o que vai acontecer a cada um deles. “A mobilidade interna, a requalificação de competências, reforma e pré-reforma está entre as opções preferenciais”, afirmou o gestor, garantindo que cada colaborador será avaliado pelo seu perfil e pela meritocracia. “Cada caso é um caso. As pessoas são ouvidas, e cada um será tratado com o respeito e dignidade que se exige”, afirmou.

Estes esclarecimentos não acalmaram as dúvidas de todo o executivo, que não só deixaram críticas acentuadas à forma como os trabalhadores foram mantidos à margem destas decisões, como atiraram ao responsável da empresa uma bateria de perguntas, nomeadamente acerca da concertação que existiria com o Governo acerca deste encerramento.

José Silva descartou a falta de diálogo com os trabalhadores, e permitiu-se a historiar a cronologia do processo. “A decisão do conselho de administração foi tomada a 18 de Dezembro, sexta-feira. De acordo com as regras de empresas cotadas em bolsa, a publicitação do pode acontecer na antecâmara de abertura do mercado, na segunda-feira seguinte. Comunicámos ao Governo esta decisão, na pessoa do primeiro-ministro, no próprio dia 18 de Dezembro. Nesse mesmo dia, foram informados também os ministros da Economia e do Ambiente”.

O telefonema do próprio José Carlos Silva à autarca de Matosinhos foi feito domingo à noite. O primeiro contacto com a comissão de trabalhadores foi realizado no dia 21 de Dezembro, às 9h30 da manhã, já depois do anúncio à Comissão de Mercado e de Valores Mobiliários (CMVM). Esta terça-feira, dia 29, foi realizada outra reunião. E os contactos vão-se manter.

No final do encontro, os representantes dos trabalhadores dizem ter saído ainda mais preocupados. Não só “porque a administração da empresa mantém o encerramento da refinaria como irreversível”, como só está a pensar nos postos de 400 trabalhadores “e não está a ter em consideração os mais de mil trabalhadores que garantiam actividade por causa da laboração da refinaria”.

Telmo Silva, membro da Comissão de Trabalhadores, mostrou-se ainda “chocado” com o facto de a administração da empresa ter tido “a coragem de falar que o desmantelamento de uma indústria também cria postos de trabalho”. Os trabalhadores têm convocado um plenário para amanhã, quarta-feira, 30 de Dezembro.

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