Empresas florestais “não estão preparadas para absorver” aumento do salário mínimo

Os sectores florestal, agrícola e ambiental “não estão preparados para absorver” um aumento de 30 euros no salário mínimo nacional. Em tempos de pandemia, o presidente da Anefa, Pedro Serra Ramos, diz que o momento “é desastroso”. E pergunta: “Os portugueses estão dispostos a pagar mais 5% pelos produtos que produzimos?”.

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Nelson Garrido

O Governo aprovou um aumento em 30 euros do salário mínimo nacional, que passará para 665 euros a partir de 1 de Janeiro de 2021. O presidente da Associação Nacional de Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente (Anefa), que representa cerca de duas mil empresas que, por sua vez, empregam mais de 175 mil trabalhadores, garante que estas, neste momento, procuram é “sobreviver”. E, nalguns casos, “nem conseguem manter os postos de trabalho existentes”. Pedro Serra Ramos é cáustico: “O dinheiro não é elástico, nem as empresas têm qualquer pote de ouro na sua tesouraria”.

A Anefa subscreveu em Julho de 2020 uma revisão global do Contrato Colectivo de Trabalho para o sector, que prevê tabelas salariais para 2020 e para 2021 em que o salário mais baixo para os dois anos está acima do salário mínimo nacional (SMN). Ainda assim, que impacto tem este aumento do SMN decretado pelo Governo?

O aumento do SMN tem sempre impacto no nosso sector, mesmo que o Contrato Colectivo de Trabalho não preveja salários desse nível. O que acontece é que não se pode subir esse salário e achar que o mesmo não tem qualquer repercussão nos salários acima desse valor. Se subimos o SMN, então, todos os salários, se aplicados de forma justa, deverão subir de forma proporcional e assim teremos um aumento salarial de 4,7 % para toda a estrutura produtiva. O problema é, contudo, mais grave, pois esse aumento acarreta um aumento das contribuições e dos seguros a pagar. Ora, sendo esta uma actividade onde o peso da mão-de-obra nos custos de produção é elevado, o impacto de tal aumento irá ser certamente elevado.

A pergunta que surge é, pois, se estarão os portugueses, nossos clientes, cientes de que este aumento terá reflexos no custo dos produtos e serviços que realizamos. Estarão os portugueses dispostos a pagar mais 5% pelos produtos alimentares produzidos nas explorações agrícolas? Estarão os portugueses dispostos a pagar mais 5% pelas limpezas de mato ou pelos produtos florestais?

E qual é a sua resposta?

Não podemos sobrecarregar as empresas com encargos sem pensar que os mesmos não se vão reflectir no preço final do que produzimos.

A Anefa representa cerca de 2000 empresas, que empregam mais de 175 mil trabalhadores. Em ano de pandemia e com toda a incerteza sobre a evolução da economia, as empresas estão preparadas para absorver estes aumentos salariais?

É claro que não. O momento para a realização deste aumento salarial é desastroso. As empresas neste momento procuram sobreviver. Nalguns casos, nem conseguem manter os postos de trabalho existentes. Voltamos à questão anterior, ou seja, se os portugueses estão dispostos a pagar mais pelo menos 5% pelos produtos que produzimos. Parece-me que não. Até porque existe uma grande parte dos portugueses que viu reduzido o seu poder de compra e assim ainda terá menos condições para o fazer.

No caso dos trabalhos agrícolas, que se destinam a produzir bens de primeira necessidade, esses bens serão certamente vendidos.

E o mercado suporta um aumento no mínimo de 5%?

Ilude-se a opinião publica com o aumento das exportações, mas esta é certamente uma solução temporária, fruto de um esforço acrescido das empresas. Sabe-se lá a que preço. Até porque o panorama a nível internacional também não é bom.

No caso dos trabalhos florestais ou de paisagismo, a situação é ainda pior, pois não são bens de primeira necessidade e, por isso, não havendo dinheiro, os trabalhos a realizar ficarão para segundo plano. A somar a isso, no sector florestal, que é muito dependente de ajudas comunitárias, vamos entrar numa fase de transição entre quadros comunitários, em que, regra geral, os apoios levam dois anos até se dar início à sua implementação. Logo, somamos menor capacidade financeira dos portugueses a ausência de apoios comunitários. O resultado só pode ser ausência de investimento e por isso falta de trabalho. É numa situação como esta que devemos aumentar o salário mínimo nacional?

Dentro do sector florestal, quais são as profissões ou categorias profissionais que mais sentirão este aumento salarial do SMN? 

Todas. O aumento do salário mínimo nacional tem sempre um efeito dominó ou de bola de neve. Não podemos aumentar o SMN e deixar os restantes salários sem a respectiva compensação. Por isso, todas as profissões ou categorias profissionais serão afectadas pelo aumento do SMN. Acham verdadeiramente que as empresas que têm recorrido às ajudas e ao lay-off para sobreviver têm condições para suportar esse aumento? O dinheiro não é elástico, nem as empresas têm qualquer pote de ouro na sua tesouraria. Elas vivem do que produzem. E a tendência, face a uma redução do poder de compra, é produzirem cada vez menos.

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