Banco de Portugal prevê recuperação mais lenta do que o Governo para 2021

Autoridade monetária prevê que a economia, depois de cair 8,1% este ano, cresça abaixo de 4% no próximo. Evolução da pandemia e rapidez da vacinação influenciam nível de recuperação.

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Lusa/Mário Cruz

Depois de uma recessão no ano do “Grande Confinamento”, a economia portuguesa deverá iniciar uma recuperação em 2021, mas não ao ritmo que o Governo está a prever, e essa trajectória deverá prolongar-se até 2023, prevê o Banco de Portugal (BdP) nas mais recentes projecções económicas, divulgadas nesta segunda-feira.

A autoridade monetária nacional está mais pessimista do que o Governo em relação à trajectória de crescimento para o próximo ano, apontando para uma variação de 3,9%, abaixo dos 5,4% previstos pelo executivo de António Costa.

Em plena segunda vaga da pandemia, o banco central manteve a projecção para a variação do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano no valor apresentado em Outubro (8,1%), por causa de dois factores de “sentido oposto”: se, por um lado, “a recuperação no terceiro trimestre foi superior ao antecipado”, por outro, “a evolução da pandemia e das medidas de contenção” da segunda vaga “levaram à revisão em baixa da actividade” nestes três últimos meses do ano, indica o boletim económico do BdP.

A instituição liderada por Mário Centeno prevê uma quebra de 8,1%, seguindo-se a melhoria no próximo com a subida de 3,9%, de 4,5% em 2022 e de 2,4% em 2023.

O banco central assume que “as restrições são gradualmente retiradas a partir do primeiro trimestre de 2021, embora a actividade permaneça condicionada até ao início de 2022”, altura em que assume que uma “solução médica eficaz” estará “plenamente implementada”.

Embora a contar que a actividade económica retome “o nível anterior à pandemia no final de 2022”, o Banco de Portugal sublinha que as perspectivas económicas “permanecem rodeadas de elevada incerteza, estando dependentes da evolução da pandemia e da rapidez da vacinação em larga escala”.

A equipa económica do BdP acredita que a actividade económica irá retomar “o nível pré-pandemia no final de 2022”. Ao apresentar estas projecções em conferência de imprensa, o governador, Mário Centeno, salientou que a recuperação estará “repartida entre 2021 e 2022” e que, no final de 2021, o PIB ainda estará 3,4% abaixo do valor registado no final de 2019.

Numa imagem: haverá uma “recuperação gradual”.

O banco central nota que as políticas nacionais e internacionais “vão continuar a ter um papel fundamental na recuperação e resiliência da economia nacional, devendo promover a retoma do investimento e a correcta afectação de recursos”.

Espera-se “uma recuperação da economia mundial, com a manutenção das condições de financiamento” num nível favorável, salientou Centeno, sublinhando as medidas anunciadas ainda há poucos dias pelo Banco Central Europeu (BCE), com o reforço do programa de compra de dívida pública de emergência em mais 500 mil milhões de euros e com a concessão de empréstimos de longo prazo aos bancos da zona euro em condições favoráveis.

Internamente, o desemprego deverá continuar a aumentar no próximo ano (passando de uma taxa de 7,2% em 2020 para 8,8%), mas o banco central perspectiva já uma melhoria no mercado de trabalho a partir de “meados do próximo ano”, à medida que haja uma recuperação da actividade. Centeno salientou a “contenção muito significativa do emprego” nas empresas.

Tanto as exportações como as importações estão em queda este ano e, para o próximo, depois de descidas na ordem dos 20% e 14%, o banco central prevê uma recuperação nas duas vertentes, com as exportações a atingirem uma subida de 9,2% e as importações a progredirem a um ritmo ligeiramente abaixo, de 8,8%.

Dois cenários alternativos

Por causa do grande grau de incerteza associado à evolução da pandemia, ao impacto das medidas de contenção sanitária em Portugal “e no resto do mundo”, ao resultado das políticas económicas e à reacção “dos agentes económicos a estes desenvolvimentos”, a equipa do departamento de estudos económicos fez dois cenários alternativos a esse cenário central, um “mais moderado e um cenário mais severo”.

No mais gravoso, o BdP coloca como hipótese uma situação em que se assistirá a “uma maior dificuldade em controlar o crescimento dos novos casos no final de 2020 e um aumento de novas infecções no primeiro trimestre de 2021”, obrigando os governos a reforçarem as medidas de contenção; ao mesmo tempo, admite que a “solução médica eficaz” – uma referência implícita à vacina – “surge na primeira metade de 2021, mas a sua implementação em larga escala é gradual”.

Nesse cenário, admite que a economia possa crescer apenas 1,3% no próximo ano, em vez dos 3,9% do cenário central, seguindo-se também uma recuperação mais baixa no ano seguinte (3,1%, em vez de 4,5%), embora para 2023 a projecção se mantenha idêntica à do cenário base (um crescimento de 2,4%).

Neste caso, havendo uma recuperação “mais fraca e prolongada”, isso implica “um aumento das fricções financeiras”, que se reflecte nos “custos de financiamento dos agentes privados” e um impacto no mercado de trabalho (com o desemprego nos 10% em 2021), refere o Banco de Portugal.

Aqui, os economistas já estão a incluir que haverá medidas orçamentais destinadas a mitigar os efeitos da crise (por reforço ou extensão) e, a nível das políticas monetárias, “medidas que limitam a amplificação financeira da crise”.

Já no cenário em que a crise económica é mais moderada, aí, sim, o Banco de Portugal já faz uma projecção superior à do Governo para o próximo ano. Coloca como cenário um crescimento de 5,9% (seguido de um crescimento de 4,8% em 2022 e de 2% em 2023, neste caso, uma subida menor, dada a base anterior ser mais robusta). Nesta projecção, o banco central coloca como hipótese teórica um cenário em que há uma evolução mais favorável da pandemia, com reflexos positivos “na confiança dos agentes, levando a uma recuperação do consumo privado e do investimento no curto prazo superior à subjacente ao cenário base”.

Nessa circunstância, “as exportações beneficiam de uma procura externa mais favorável”. Nesta equação, a economia já poderia atingir os níveis anteriores à pandemia “no início de 2022, quase um ano mais cedo do que no cenário base”. Mesmo assim, ressalva o boletim do Banco de Portugal, a economia continuaria a um nível abaixo ao que era projectado há um ano, antes da chegada da epidemia à Europa.

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