BCE injecta mais 500 mil milhões de euros para contrariar efeitos da pandemia

Banco Central Europeu revê em baixa a previsão de crescimento do próximo ano e promete que irá continuar a efectuar volumosas compras de dívida pública pelos menos até Março de 2022, prolongando também a concessão de crédito a taxas de juro negativas aos bancos.

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Reuters/RALPH ORLOWSKI

Cumprindo as expectativas dos mercados, o Banco Central Europeu (BCE), numa tentativa de fazer face às “consequências económicas do ressurgimento da pandemia”, decidiu reforçar em 500 mil milhões de euros o seu programa de compra de dívida pública de emergência, uma medida que pode ajudar o Estado português a financiar-se durante mais algum tempo com condições extremamente favoráveis

Da reunião do conselho de governadores do BCE saíram as medidas que eram esperadas para 2021 pela generalidade dos analistas. Para além de manter as taxas de juro nos actuais valores (e de prometer não mexer nelas até que a inflação regresse de forma sustentada a valores próximos de 2%), a entidade liderada por Christine Lagarde decidiu prolongar as compras de dívida pública em larga escala que tem vindo a realizar desde que a economia da zona euro caiu na crise provocada pela pandemia. 

O programa extraordinário de compras de dívida de combate à pandemia, lançado no passado mês de Março com um montante inicial de 750 mil milhões de euros e que em Julho foi alargado para 1350 mil milhões, passa agora a ser de 1850 mil milhões de euros. 

Com este reforço de 500 mil milhões, o BCE conta poder continuar a fazer compras líquidas de títulos de dívida pelo menos até Março de 2022, o que significa uma extensão de nove meses do prazo antes previsto, pondo sempre a hipótese de ir mais longe, caso a pandemia continue nessa altura a afectar a economia. Para além disso, o banco central assegura que, pelo menos até ao final de 2023, irá manter inalterado o nível de títulos de dívida detidos, substituindo os que chegam ao fim da sua maturidade por outros de igual valor. 

De assinalar que o BCE mantém igualmente em vigor o seu programa “normal” de compra de activos (principalmente dívida pública), com um valor mensal de 20 mil milhões de euros e sem um prazo final já determinado. 

Com estas medidas, o BCE não só garante que irá continuar a injectar liquidez na economia, como assegura que os Estados da zona euro serão, durante mais algum tempo, ajudados no seu financiamento. As compras de dívida do BCE são uma das principais explicações para as taxas de juro historicamente baixas a que os Estados têm vindo a conseguir obter financiamento nos mercados.

Portugal é um dos exemplos mais claros, chegando a registar, mesmo na dívida a 10 anos, taxas de juro negativas

Para além das compras de dívida, o BCE anunciou também esta quinta-feira que irá prolongar em 12 meses, até Junho de 2022, o período durante o qual irá conceder aos bancos da zona euro empréstimos de longo prazo a taxas fixas extremamente favoráveis, em que as taxas de juro podem chegar, mediante o cumprimento de algumas condições, a -1%. O banco central revelou que irá realizar sete novas operações de concessão de crédito deste tipo aos bancos. 

Com esta disponibilização de crédito em condições ultrafavoráveis, o banco central tenta incentivar, algumas vezes sem sucesso, os bancos a emprestarem mais dinheiro às empresas e famílias, ajudando assim a dinamizar a actividade económica. Além disso, num cenário em que o crédito malparado pode vir a aumentar devido à actual crise económica, esta oferta de financiamento fácil pode contribuir para evitar situações de tensão no sistema bancário da zona euro.

Retoma revista em baixa

Na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do conselho de governadores desta quinta-feira, a presidente do BCE justificou o prolongamento das medidas extraordinárias adoptadas em Março com o facto de a economia estar ainda longe de regressar aos níveis pré-pandemia e com a decepção que continua a constituir a evolução da inflação, que o banco central tem a obrigação de colocar a um nível “abaixo mas perto de 2%”.

Christine Lagarde assinalou que “os últimos dados sinalizam um reinício da actividade, mas o nível atingido continua a estar muito baixo daquele que se verificava antes da pandemia e a evolução da conjuntura continua a ser altamente incerta”.

As novas previsões do BCE, dadas a conhecer no decorrer desta conferência de imprensa, apesar de apontarem para um aligeiramento da estimativa de contracção da economia da zona euro durante este ano (de uma variação do PIB de -8% prevista em Setembro para -7,3% agora), revelam uma revisão em baixa do ritmo da retoma projectado em 2021. O BCE prevê agora que a economia cresça 3,9% no próximo ano, em vez dos 5% que antecipava há três meses.

A forçar esta reavaliação das perspectivas do BCE esteve principalmente, explicou Lagarde, o facto de “a profundidade e a duração da segunda vaga da pandemia não ter sido antecipada na extensão em que acabou por ocorrer e continua a ocorrer”.

Logo no quarto trimestre deste ano, que ainda está a decorrer, o BCE projecta que a economia se contraia 2,2%, uma recaída depois da recuperação registada no terceiro trimestre. Ainda assim, a economista francesa tentou deixar uma nota de optimismo, explicando que a escolha de Março de 2022 como prazo mínimo das compras extraordinárias de dívida se deve à expectativa de que, “no final de 2021, já se tenha atingido um nível suficiente de imunidade de grupo e a economia tenha começado a funcionar mais normalmente”.

Uma das preocupações centrais do BCE está na evolução da inflação, já que o seu único mandato é o de assegurar a estabilidade de preços na zona euro. Nas actuais circunstâncias, o problema é que, também por força da evolução desfavorável da economia, a inflação está demasiado baixa. O objectivo do BCE é colocá-la, a médio prazo, num valor abaixo mas próximo de 2%, mas actualmente a variação de preços é negativa, algo que “deverá prolongar-se até ao início de 2021”. A inflação está a um nível “desapontantemente baixo”, lamentou Christine Lagarde.

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