Pandemia marcou prémios de inovação europeu. É possível diagnosticar a covid-19 com uma só gota de sangue?

Um dos grandes vencedores foi a dinamarquesa BlueSense que quer diagnosticar a covid-19 a partir de uma única gota de sangue. Entre as nomeadas, estava também a empresa portuguesa iLoF que está a estudar a forma como os sintomas do vírus se manifestam em diferentes pessoas.

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Um dos vencedores deste ano quer diagnosticar a covid-19 com uma gota de sangue Ricardo Lopes

A pandemia da covid-19 e a saúde foram os temas centrais da edição de 2020 dos prémios do Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia (EIT, na sigla inglesa), entregues esta quarta-feira, com várias empresas europeias, incluindo duas portuguesas, a apresentarem projectos para ajudar a lidar com a covid-19 ou com os efeitos secundários da pandemia como a dificuldade aceder a alguns serviços de saúde, a isolação da população mais velha, entraves à circulação e cortes de orçamento na área da sustentabilidade. Tal como outros eventos europeus, este ano a cerimónia foi virtual, transmitida da sede da EIT, em Budapeste, na Húngria, por videoconferência. 

“São épocas de crise que promovem a inovação”, começou por destacar ao PÚBLICO Martin Kern, director do EIT, que reconhece que 2020 foi um ano difícil com muitas das equipas do Instituto em teletrabalho. “Só que o propósito do instituto mantém-se. Agora mais do que nunca: ajudar boas ideias a transformarem-se em produtos concretos”, frisou Kern. “Um dos grandes problemas da Europa é que por vezes a investigação e a ciência não sai para fora.”

Os projectos vencedores receberam 50 mil euros pelos esforços. Uma das empresas premiadas foi a dinamarquesa BlueSense que desenvolve tecnologia para diagnosticar doenças a partir de uma única gota de sangue e está a trabalhar numa forma de diagnosticar o coronavírus SARS-CoV-2 em 12 minutos, sem precisar de uma zaragatoa. Venceu na categoria de Venture que destaca empresas que têm crescido rapidamente devido ao apoio do EIT. 

As outras vencedoras incluem as espanholas Corify, que desenvolve há anos terapias não-invasivas para tratar problemas cardíacos, e a Bound4blue que cria soluções para reduzir as emissões de dióxido de carbono de navios nas indústrias marinhas. A primeira venceu na categoria Inovação e a segunda na categoria EIT Woman, que se destina a destacar projectos desenvolvidos por mulheres na União Europeia. A alemã MonitorFish, que desenvolve um sistema de aquacultura com inteligência artificial, completou o pódio de vencedores. 

Projectos portugueses entre nomeados

Entre os projectos nomeados este ano, dois eram portugueses: o Zero Defects 4.0 — que tenta antecipar defeitos na produção de painéis derivados de madeira, reduzindo o desperdício de matérias-primas — e o iLoF (Intelligent Lab on Fiber, na sigla inglesa, com sede no Reino Unido) — que usa inteligência artificial para identificar os medicamentos mais indicados para diferentes doentes. O foco começou por ser a doença do Alzheimer, mas actualmente também estão a estudar a covid-19.

“Queremos construir um modelo para perceber, na altura de um diagnóstico positivo, se a sintomatologia da pessoa vai evoluir com severidade ou não. Ou seja, se vai para os cuidados intensivos ou não. E isto é um trabalho que temos feito com o hospital de São João”, resume ao PÚBLICO Joana Paiva, co-fundadora do iLoF. Para já, o projecto ainda está numa fase muito inicial com dados e amostras do hospital a serem utilizados para perceber se a tecnologia é robusta. 

“O que nós fazemos é analisar reflexos de luz”, explica Paiva. “Em específico, analisamos a forma como a luz reflecte na matéria, neste caso, na amostra de sangue de um paciente. A luz interage com estruturas complexas do sangue do indivíduo e nós obtemos o resultado dessa interacção como se fosse um padrão e esse padrão é analisado por inteligência artificial.”

Apoiar a inovação para travar a pandemia

Tal como o iLoF e a BluSense, várias empresas e projectos apoiados pela EIT também se adaptaram em 2020 para ajudar a combater a covid-19. “Isto nem sempre é fácil. As pandemias podem distorcer o mercado quando áreas que pequenas empresas exploram se tornam alvo de grande interesse”, alertou Filippo Bosco, presidente executivo da vencedora BluSense. 

Por isso, este ano, além de continuar a apoiar projectos em áreas como o digital, alimentação, saúde, energia sustentável, matérias-primas e mobilidade, o instituto criou um novo fundo (no valor de 60 milhões de euros) dedicado a acelerar projectos focados no combate à pandemia. Um dos projectos destacados é a holandesa SARA (um programa de computador que frequenta os prémios do EIT há anos) que foi criada para garantir que idosos em hospitais e lares passam menos tempo sozinhos. Instalada no “corpo” dos robôs chineses da Quian Technology, a Sara projecta fotografias, organiza jogos e motiva os idosos a manterem-se activos. 

“Este ano os prémios não destacam apenas os projectos [das mentes] mais inovadoras e empreendedoras da Europa, mas a sua resiliência”, sublinhou a presidente do EIT, Gioia Ghezzi, durante a cerimónia desta quarta-feira. “Com inovações numa variedade de campos, desde a saúde ao clima e alimentos à digitalização, os nomeados de 2020 representam soluções para os muitos desafios que a Europa enfrenta actualmente.”

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O robô SARA em acção SARA ROBOTICS

Criado em 2008, o Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia – mais conhecido pela sigla EIT – é um órgão independente na União Europeia criado para estimular a capacidade de a região inovar na área da tecnologia e da inteligência artificial ao facilitar o contacto entre universidades, investigadores e empresas no mundo real. 

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