Portugal ataca e a Suécia marca

Tanto na saúde como na economia, antecipa-se que, numa perspetiva de longo prazo, a estratégia sueca terá sido a mais eficiente que a portuguesa.

Ao longo dos últimos meses temos sido confrontados diariamente com uma análise detalhada, ainda que nem sempre rigorosa, da evolução da pandemia.

Depois do “milagre português”, assumido publicamente por alguns intervenientes numa fase ainda embrionária da pandemia, vivemos agora momentos de profunda angustia em que muitos veem “na luz ao fundo do túnel” apenas o sinal de um comboio em sentido contrário.

Este espírito de emoções extremas, tão característicos dos povos “que não se governam, nem se deixam governar”, contrasta com a tão conhecida frieza nórdica de um país – a Suécia que, aquando do referido “milagre português”, serviu como exemplo para parte significativa da classe política nacional e dos media, do que de pior se poderia fazer.

Com efeito, assumindo que esta pandemia iria durar muitos meses, a Suécia, liderada pelo epidemiologista Anders Tegnell, e tendo por base a premissa de que “as pessoas só conseguem cumprir medidas muito duras durante um período limitado de tempo”, adotou uma estratégia “gradualista” de combate à pandemia, assente numa responsabilização direta dos cidadãos em todo o processo.

Ao invés, em Portugal assumiu-se que a pandemia iria durar apenas alguns meses e que ao Estado cabia o papel de dirigir e controlar todo o processo, na esperança que os cidadãos assumissem, como tão bem o fizeram noutros tempos, o papel de “bons alunos”.

A saúde

Do ponto de vista da saúde pública, a estratégia menos intervencionista da Suécia parece ter tido menos eficácia, no curto prazo, face à estratégia adotada em Portugal. Com efeito, durante a primeira vaga, terminada em final de junho, o número de mortos e infetados na Suécia (5458 e 66.319, respetivamente) foi claramente superior ao observado em Portugal (1568 e 41.912, respetivamente).

Ao invés, tendo por base os dados disponíveis até 30 de novembro, antecipa-se que, numa perspetiva de longo prazo, a estratégia sueca terá sido a mais eficiente. Com efeito, com um número acumulado de casos nos últimos 14 dias por cada 100 mil habitantes de 704,4 (dados de dia 30 de novembro), o número de mortos em Portugal (4427) aproxima-se vertiginosamente dos registados na Suécia (6871), enquanto, em termos de infetados, a situação já é desfavorável a Portugal (294.799 face a 259.334).

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A economia

Numa perspetiva económica, parece claro que a Suécia foi claramente mais resiliente à crise do que Portugal. Com efeito, a queda do PIB em Portugal foi claramente superior, estimando a OCDE que no final do ano atinja os -8,4% face aos -3,2% da Suécia (para recuperar apenas 1,7% em 2021 e 1,9% em 2020, contra os 3,3% em cada um dos anos no caso da Suécia). De igual forma, a produção industrial em Portugal caiu, em termos médios mensais, cerca de 11,3% (-7,3% na Suécia), o desemprego subiu cerca de 19,3% entre março e setembro (16,5% na Suécia), enquanto o saldo da Balança Corrente agravou-se de -0,28% no primeiro trimestre de 2020 para -0,46% no segundo trimestre (na Suécia, em igual período, o saldo positivo aumentou).

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Também ao nível do mercado acionista o contraste é evidente. Com efeito, enquanto o índice sueco (OMX) subiu 10,8% desde o início do ano (e até final de novembro), o PSI20 registou uma queda de 12,1%.

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Epílogo

A pandemia covid-19 que o mundo enfrenta desde o início do ano tem sido um enorme desafio para as lideranças políticas e um teste à resiliência dos diferentes países perante cenários adversos.

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As soluções adotadas foram diversas e calibradas em função da maior ou menor intervenção da comunidade científica; da maior ou menor dependência dos governos face às oposições; ou da maior ou menor capacidade de intervenção da sociedade civil.

Portugal adotou uma estratégia muito distinta daquela que foi adotada na Suécia. Os resultados também parecem ser claramente distintos (ver índice ranking Bloomberg).

Na realidade, pelos dados disponíveis, parece que os longínquos relatos na Emissora Nacional do “Portugal ataca e a Espanha marca” se transformaram, em matéria de pandemia, num “Portugal ataca e a Suécia marca”.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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