Maduro retoma controlo total do poder na Venezuela em eleições quase sem oposição

Eleições para a Assembleia Nacional foram boicotadas por grande parte da oposição e tiveram apenas 31% de participação. Juan Guaidó, até agora o principal rosto da oposição, abandona o cargo de presidente do Parlamento a 5 de Janeiro.

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O Presidente da Venezuela anunciou "o início de um processo de recuperação" LUSA/Rayner Pena

A oposição ao Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, perdeu a sua única ligação às instituições do poder político no país, no domingo, após a confirmação da vitória dos partidos do chavismo nas eleições legislativas para a Assembleia Nacional. O resultado nunca esteve em dúvida porque a maioria da oposição decidiu boicotar as eleições, que contaram com a participação de apenas 31% do eleitorado.

Com mais de 80% dos votos contados, a coligação dominada pelo Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) obteve 67,7% e recuperou a maioria no parlamento do país.

“As forças revolucionárias sabem ganhar e perder, e hoje os vencedores fomos nós”, disse Maduro, numa comunicação ao país feita na madrugada desta segunda-feira.

“Uma nova Assembleia Nacional estreia-se a 5 de Janeiro em paz”, declarou o Presidente venezuelano.

Perante o boicote da oposição e a falta de reconhecimento internacional para além dos seus tradicionais aliados, Nicolás Maduro enquadrou a vitória do PSUV como “uma mudança de ciclo, um ciclo positivo de trabalho e de recuperação”.

“Vamos iniciar um processo de recuperação do país, da economia, de superação do bloqueio. Um ciclo novo, com soberania. Que ninguém se meta nos assuntos internos da Venezuela”, disse Maduro.

Cinco anos depois de ter perdido o controlo da Assembleia Nacional para a oposição, numa derrota inédita em duas décadas de chavismo, o PSUV volta a controlar o Parlamento do país.

A partir de 5 de Janeiro, com a tomada de posse dos novos deputados, o principal rosto da oposição, Juan Guaidó, deixa de ser o presidente da Assembleia Nacional – e, dessa forma, perde também uma parte da legitimação interna como figura unificadora dos opositores.

Horas antes do anúncio dos primeiros resultados, na noite de domingo, o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, afirmou que as eleições legislativas na Venezuela foram “uma fraude”.

“Os resultados anunciados pelo regime ilegítimo de Maduro não reflectem a vontade do povo venezuelano”, afirmou Pompeo no Twitter.

E Guaidó – o presidente da Assembleia Nacional até 5 de Janeiro, e autoproclamado Presidente da Venezuela reconhecido por mais de 50 países, incluindo os EUA e a União Europeia – congratulou-se com “a perda do apoio popular” do Governo venezuelano.

“Apesar da censura e da hegemonia na comunicação, não é possível esconder a verdade: a maioria da Venezuela virou as costas a Maduro e à sua fraude iniciada há meses”, disse Juan Guaidó.

O interregno de cinco anos na hegemonia do chavismo nas instituições do poder político e judicial da Venezuela chegou a assustar o regime no início de 2019, quando a Assembleia Nacional declarou Juan Guaidó como Presidente do país, seguindo-se uma onda de apoio internacional. Mas, dois anos depois, a oposição venezuelana não conseguiu capitalizar esse momento e os seus índices de popularidade estão hoje tão baixos como os do Governo, segundo as sondagens.

A Assembleia Nacional ficou nas mãos da oposição nas eleições de 6 de Dezembro de 2015, mas o seu poder para legislar e controlar a política do país foi praticamente anulado em 2017, quando Maduro anunciou eleições para uma Assembleia Constituinte paralela. Oficialmente com a tarefa de discutir e aprovar a nova Constituição, a assembleia foi o órgão legislador de facto no país, sob controlo dos partidos do regime.

Em Maio de 2018, Nicolás Maduro foi reeleito como Presidente da Venezuela, numas eleições também muito criticadas dentro e fora do país, e em que as principais figuras da oposição foram impedidas de participar.

O ano de 2019 chegou a ser visto, nos EUA e na União Europeia, como o ano da derrota do chavismo – o apoio internacional a Juan Guaidó, o reforço das sanções e a profunda crise económica, social e humanitária no país deram uma oportunidade única à oposição para derrubar Maduro.

Mas não foi isso que aconteceu, e a confirmação da vitória do PSUV nas eleições de domingo podem marcar o fim da actual configuração da oposição.

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