Governo francês recua na lei que proibia divulgação de imagens de polícias

A lei provocou “dúvidas” sobre se seria uma ameaça ao direito de informar e, por isso, será reformulada, disse o líder da bancada parlamentar do partido do Presidente Emmanuel Macron.

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Protestos contra a criminalização da divulgação de imagens de polícias, antes de o Governo recuar e prometer reformular o artigo polémico BENOIT TESSIER/Reuters

O partido do Presidente francês Emmanuel Macron recuou nos planos para limitar a liberdade de partilha de imagens de agentes de polícia, depois de manifestações de mais de entre 100 mil a 300 mil pessoas durante o fim-de-semana.

Personalidades ligadas aos media e à defesa dos direitos humanos apelaram à retirada deste artigo, argumentando que o seu objectivo é evitar que sejam divulgados os frequentes incidentes de brutalidade policial em França.

“Sabemos que existem dúvidas, algumas pessoas consideram que o direito a informar está a ser ameaçado”, disse esta segunda-feira Christophe Castaner, líder da bancada parlamentar do partido de Emmanuel Macron, República em Marcha, numa conferência de imprensa. “A lei não foi compreendida por todos, houve dúvidas entre jornalistas, no povo francês, e mesmo até dentro da nossa maioria”, reconheceu Castaner, que já foi minsitro do Interior. “Quando um mal-entendido destes continua a intensificar-se numa questão tão fundamental, temos um dever de nos questionar colectivamente.”

O artigo 24 da chamada “lei de segurança global” criminalizaria, com uma pena com até um ano de prisão e multa até 45 mil euros, a publicação da cara ou de outro elemento que permitisse a identificação de um agente da polícia com intenção de lhe provocar dano físico ou psicológico.

O artigo vai ser totalmente reformulado, disse Castaner: “Propomos uma nova versão do artigo 24, e vamos submeter uma nova versão”.

A declaração de Castaner foi feita após uma reunião de emergência de Macron com deputados e o ministro do Interior sobre a nova lei.

O recuo é um revés para o partido de Macron, que apresentou a legislação como parte de uma abordagem de “lei e ordem” para melhorar a segurança e lutar contra o crime. Há quem veja esta tentativa como um tiro de partida para a campanha de reeleição de Macron: as eleições serão dentro de dois anos.

No sábado, mais de 133 mil pessoas – algumas estimativas dizem até 300 mil – saíram à rua para protestar contra esta medida e ainda contra a violência policial, incluindo 46 mil em Paris. As manifestações começaram por ser pacíficas, mas em algumas cidades houve, mais tarde, violência, quer de grupos de pessoas vestidas de preto a atacar a polícia até relatos de polícias a agredir manifestantes.

Tudo isto acontece precisamente quando foi divulgada uma gravação de violência policial que permitiu que fossem identificados os polícias que agrediram o produtor musical francês Michel Zecler, que é negro.

Este contou que estava perto do seu estúdio sem máscara, o que é uma violação das regras em vigor para conter a covid-19. Quando viu os agentes, entrou no estúdio para evitar ser multado, mas estes seguiram-no e atacaram-no. A agressão aconteceu no dia 21, as imagens foram divulgadas cinco dias depois e partilhadas nas redes sociais, levando a uma onda de indignação, e à detenção de três polícias.

Michel comentou: “Tive a sorte de ter um vídeo que me protegeu”. Responsáveis dizem que o caso tornou a insistência na criminalização da divulgação das imagens dos agentes muito mais difícil para o Presidente.

Esta segunda-feira, os polícias foram acusados de violência voluntária e falso testemunho, entre outras acusações. Dois dos quatro polícias acusados continuaram em prisão preventiva.

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