O PS e o congresso do PCP

As forças que em 1975 foram defendidas por Mário Soares e pelo PS são agora as que querem castrar o PCP nos seus direitos constitucionais. Mais uma vez o PS está onde sempre esteve – na defesa da democracia e da liberdade, no respeito pela lei e pela Constituição da República Portuguesa.

Os partidos que se consideram de direita pressentiram que a opinião geral dos portugueses ia no sentido de uma reprovação e até revolta pela realização do Congresso do PCP.

O PSD e o CDS não mais largaram. Os comportamentos que se verificaram, da parte de Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos, foram do primarismo constitucional ao ódio anti-comunista que pensávamos já ter ficado nos inícios da década de 1980.

Comecemos pelo início. Temos um grave problema de saúde pública que nos trouxe, também, uma crise económica e uma enorme preocupação social. Para esse esforço devem os agentes políticos dedicar as suas forças e as suas atenções.

Mas este gravíssimo problema que vivemos não suspendeu o regime constitucional que vigora, não limitou os direitos políticos, não fechou a vida democrática. Passaríamos a ser uma outra coisa que não uma democracia se assim tivesse sido.

A lei de 1986 é bem clara quanto à entrega da responsabilidade pela sua atividade aos partidos políticos. São eles, com as suas ideias e comportamentos, quem recebe votos em eleições ou quem é penalizado pelas suas ações ou omissões.

Temos uma Constituição e uma lei que lhe dá aplicação. O PCP não pode ser impedido de realizar, nas condições que entender, o seu congresso.

Logo nos apareceram constitucionalistas a reivindicar uma alteração da lei. Seriam esses mesmos os ideólogos de um novo fascismo que, perante um incêndio no Parlamento, imporiam a dissolução das instituições e o nascimento de um estado caudilhista, agora já não seriam os comunistas, nem os judeus, nem os ciganos os alvos, seriam todos os portugueses.

Há limites para o uso da barbárie, do medo, da voz popular circunstancial como justificação de mudanças nos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Os partidos da direita portuguesa olham para o PS como se este partido fundador, e agora central da nossa democracia, estivesse a ceder perante uma urgência orçamental. A memória política deve ser reavivada para que não voltemos aos maus dias.

Em janeiro de 1975, com o país numa situação de anúncio de guerra civil, o CDS realizou o seu Congresso no Porto. Foi atacado pelas forças mais ortodoxas da revolução, seria sujeito a uma pressão inaceitável que o PS contestou e fez alterar.

Mário Soares era ministro, como o era Salgado Zenha, Almeida Santos, Magalhães Mota e Sá Carneiro. E desse grupo nasceu a defesa do direito de reunião e manifestação para o CDS naquele congresso, naqueles dias e até hoje.

Em novembro de 2020, com o país numa situação de pandemia mas não de guerra civil, o PCP entendeu realizar o seu congresso com regras apertadas e com o profissionalismo que já lhe conhecemos. As forças que em 1975 foram defendidas por Mário Soares e pelo PS são agora as que querem castrar o PCP nos seus direitos constitucionais. Mais uma vez o PS está onde sempre esteve – na defesa da democracia e da liberdade, no respeito pela lei e pela Constituição da República Portuguesa.

Foi o PS quem, passados quatro anos do 25 de abril, sustentou e reforçou o nosso regime com a consagração e legitimação da alternância e a governação da AD que veio até 1983; foi o PS quem construiu o poder local livre onde todos os partidos partilham o jogo democrático e o PCP o faz mais diligentemente que outros por esse país; foi o PS quem permitiu a economia de mercado a partir da Revisão Constitucional de 1981; foi o PS quem teimou em garantir a Portugal um lugar de onde, fruto da sua realidade geográfica, tinha estado ausente em mais de oito séculos – a Europa.

Com tudo isto, com este passado de normalização e fortalecimento da nossa vida democrática, que também recebeu contributos da realidade política nascida em 2015, quem terá coragem de indicar oportunismo a António Costa e ao PS?

Há uma história que honramos. Há um passado de pacificação que PS e Mário Soares souberam bem tratar e que foi das bombas da extrema-direita, que davam pelo nome de ELP e MDLP e que mataram o Padre Maximino Sousa, às da extrema-esquerda, que resultaram no processo FP 25 e que mataram Gaspar Castelo Branco.

Perante a crise sanitária gostaríamos de não ver o PCP ser tão fustigado pelos seus atos. Mas essa circunstância não pode toldar a nossa análise e deve obrigar a que olhemos para além do tempo de hoje.

Em 1975 com o CDS e em 2020 com o PCP, o PS nunca saiu do seu lugar.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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