A Ciência e o desafio da covid-19

Neste Dia Mundial da Ciência que hoje se assinala, apelo a que a Sociedade Civil continue a reconhecer e a apoiar a comunidade científica e a Biotecnologia, e que esta pandemia reflita a necessidade de um cada vez maior investimento no desenvolvimento científico.

O Dia Mundial da Ciência destaca o papel da ciência para o desenvolvimento humano e os desafios que enfrentamos para o futuro.

Este ano, o grande desafio é, sem dúvida, ultrapassar o contexto de pandemia, no qual nos encontramos, quer através do desenvolvimento de vacinas que possam prevenir a infeção por SARS-CoV-2, quer através do desenvolvimento de medicamentos que ajudem a superar a infeção de doentes que a tenham adquirido.

Neste âmbito, é impressionante o trabalho desenvolvido pelos grupos de investigadores de todo o Mundo que, ao longo dos últimos meses, produziram de forma rápida um manancial de conhecimento sobre este vírus até então quase desconhecido. Nunca na história se tinha assistido a uma evolução da ciência tão célere. Em Portugal, tal não é exceção. Desde o início da pandemia que temos presenciado um esforço e dedicação incomensuráveis por parte dos nossos cientistas, das mais diversas áreas, unidos nesta missão comum.

Ainda que com todas as dificuldades que a investigação científica em Portugal atravessa – investimento reduzido, extrema burocracia, dificuldade de retenção de talento –, os investigadores têm feito das adversidades uma oportunidade, contribuindo não só para dar resposta às carências da sociedade, como para tornar o setor mais competitivo e aliciante.

As empresas de Biotecnologia, em particular as que têm departamentos de Investigação e Desenvolvimento (I&D), estão também envolvidas nesta procura de soluções para minimizar o impacto desta pandemia. Na Crioestaminal focamos os nossos esforços de I&D no desenvolvimento de uma nova terapia com células estaminais, juntando-nos assim a outras empresas de Biotecnologia que se encontram também a desenvolver terapias à base de células estaminais do cordão umbilical expandidas para tratar doentes mais graves com infeção por SARS-CoV-2.  Um projeto só possível graças às parcerias como as que desenvolvemos com o Centro de Neurociências e Biologia Celular, Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra e Instituto Superior Técnico, estas parcerias possibilitam uma partilha de know-how que se traduz num fator decisivo no âmbito do I&D.

A Medicina do futuro, na qual apostamos fortemente, passa pela utilização de novas terapias com células estaminais para tratar doentes com pneumonias graves associadas à covid​-19, que muito têm vindo a ser testada na China, Estados Unidos da América e alguns países europeus. Neste âmbito, estão em curso mais de 20 ensaios clínicos para estudar de forma alargada a segurança e eficácia destas terapias. Com a produção destes medicamentos experimentais em Portugal abre-se caminho para que também no nosso país se realizem ensaios clínicos nesta área.

O tecido do cordão umbilical é uma fonte rica em células estaminais mesenquimais, células essas que apresentam uma capacidade ímpar de regular a atividade do sistema imunitário, estando já a ser testadas em humanos em situações de doença onde ocorre uma resposta exacerbada do sistema imunitário do paciente que pode levar à destruição dos tecidos e órgãos do próprio doente. Em doentes graves com covid-19 ocorre uma reação deste tipo em resposta a infeção pelo vírus, pelo que as células estaminais mesenquimais poderão aqui ter um efeito muito positivo na redução do tempo de recuperação destes doentes e na gravidade dos efeitos secundários à infeção por covid​-19.

A função pulmonar e os sintomas de doentes submetidos a este tipo de tratamento experimental melhoraram significativamente após a administração de células estaminais mesenquimais do tecido do cordão umbilical, tendo-se observado um reequilíbrio nas populações de células do sistema imunitário destes doentes, bem como do perfil de moléculas pró e anti-inflamatórias. Os resultados publicados permitiram observar que esta terapia foi capaz de inibir a hiperativação do sistema imunitário e de promover a reparação celular endógena, melhorando o microambiente pulmonar permitindo a recuperação destes doentes.

Apesar de estes estudos terem sido conduzidos num número ainda restrito de doentes, os resultados favoráveis obtidos sugerem que as células estaminais mesenquimais podem constituir uma nova estratégia terapêutica para o tratamento desta doença.

Neste Dia Mundial da Ciência que hoje se assinala, apelo a que a Sociedade Civil continue a reconhecer e a apoiar a comunidade científica e a Biotecnologia, e que esta pandemia reflita a necessidade de um cada vez maior investimento no desenvolvimento científico. Só assim se tornará possível assistir a um brotar de soluções cada vez mais inovadoras e que contribuam para dar resposta às necessidades prementes das populações. Uma sociedade baseada na ciência e no conhecimento garantirá, certamente, um futuro promissor, sustentável e socialmente justo para as gerações vindouras.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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