Só uma em cada quatro câmaras passou no teste da eficiência financeira em 2019

Porto, entre os grandes, Lagoa, nos médios e Arronches, entre os menos populosos, ficaram à frente dos restantes concelhos no Anuário financeiro dos Municípios Portugueses de 2019.

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O Porto, como a maioria dos municípios depende muito das receitas relacionadas com o imobliário Nelson Garrido

Portugal tem 308 municípios, mas segundo o anuário financeiro que todos os anos a Ordem dos Oficiais de Contas e o Instituto Politécnico do Cavado e Ave produzem sobre o sector autárquico, em 2019 apenas uma em cada quatro câmaras obteve um nível satisfatório de eficiência financeira. A lista de 75 municípios que passou no teste dos critérios fixados para esta tabela é encabeçada pelo Porto, Lagoa e Arronches, nas três categorias previstas na classificação.

No Anuário, que esta terça-feira é apresentado publicamente, é explicado que entre os grandes municípios, o Porto obteve 1744 pontos em 1900 possíveis. Nos de média dimensão, Lagoa, no Algarve, conseguiu 1681, e Arronches, no distrito de Portalegre lidera a lista dos mais pequenos em população, alcançando 1635 pontos. Segundo o estudo, 49 dos 75 municípios com nível global satisfatório obtiveram uma pontuação entre 50% e 70% da pontuação máxima possível. 

A situação, contudo, “não foi muito favorável aos restantes 233 municípios (75,6% do total do universo)”, já que apresentaram uma pontuação global inferior a 50% da pontuação total do “ranking global”, ou seja, menos de 950 pontos, acrescentaram os autores. Na lista relativa aos municípios de grande dimensão com maior pontuação, seguem o Porto os municípios de Sintra e da Amadora, enquanto na lista de média dimensão estão à frente Lagoa, Marinha Grande e Alcobaça. Arronches, Santa Cruz das Flores e Murtosa são os pequenos municípios que encabeçam o “ranking global” com maior eficácia financeira neste segmento.

As dificuldades dos mais pequenos

Os autores sublinham que, representando os pequenos municípios 60,1% do total do universo, se conclui que, “genericamente, os municípios de pequena dimensão são os que apresentam maior dificuldade em integrar o ranking dos 100 melhores municípios, em termos de eficácia e eficiência financeira, situação justificada, essencialmente, pelo baixo valor de receitas próprias, designadamente as provenientes de impostos”.

Para chegarem a este ranking, foram tidas em consideração as prestações municipais em vários indicadores compósitos: Índice de liquidez, Razão entre o Resultado Operacional (deduzido de amortizações e provisões) e os Proveitos Operacionais, Peso do Passivo Exigível no Activo, Passivo por Habitante, Taxa de Cobertura Financeira da Despesa Realizada no Exercício, Grau de Execução do Saldo Efectivo, Índice de Dívida Total, Índice de Superavit e Impostos Directos por Habitante.

2020 a estragar as contas​

A curiosidade do Anuário que hoje é apresentado é que ele antecede um exercício bem mais complexo. O ano de 2019 foi normal, em termos de gestão municipal, mas 2020 desafiou e pôs em causa muitos dos pressupostos económico-financeiros com que as autarquias costumam trabalhar, fazendo desmoronar receitas expectáveis e acrescentando despesas até aqui inexistentes nos balanços. A gestão em tempo de pandemia é mesmo o tema de um debate entre o autarca de Coimbra e líder da associação de municípios, Manuel Machado, e os seus homólogos de Braga e Cascais, Ricardo Rio, com o qual se conclui, online, a apresentação do documento, que começou pelas 10h15.

"Daqui a um ano estaremos a analisar as contas de 2020 e - já fizemos essa reflexão - nós vamos cair aqui em muitos destes indicadores. Eu acho que [2019] é o ano de fecho de um período muito positivo, não por má gestão, mas fruto das contingências que estamos a viver e, naturalmente, de tudo aquilo que os municípios estão a dar em termos sociais e económicos aos concelhos que representam”, disse a coordenadora do anuário e presidente do IPCA, Maria José Fernandes, considerando que “a crise social e a crise económica está agudizar-se muito e 2020 não será com certeza um ano com as contas dos municípios” como em 2019.

Bons resultados globais

Pensando os municípios como um subsector do Estado, o da Administração Local, globalmente, o retrato que fica de 2019 é bastante positivo. A dívida , no conjunto, desceu 8,4%, para 3.676,1 milhões de euros, e apenas 22 municípios ultrapassaram o limite de endividamento previsto na lei. A equipa que desenvolveu o anuário destaca  a redução do “stock” da dívida de médio e longo prazo em -6,4% (-197,8 milhões de euros) e a diminuição da dívida de curto prazo em -16,0% (-150 milhões de euros), fruto, esta, de uma descida de 18,3% das dívidas a fornecedores.

"Os sucessivos decréscimos, desde 2013, do valor do índice do limite à dívida total (razão entre a dívida total das autarquias e o valor de 1,5 vezes a média da receita corrente liquidada nos últimos três exercícios) é um óptimo indicador da progressiva melhoria da situação global de endividamento das autarquias”, é sublinhado. O estudo destaca, aliás, que 150 municípios dos 159 abrangidos pelo conjunto de programas de apoio a municípios endividados apresentaram descida da dívida de curto prazo entre 2010 e 2019.

No ano passado, o total da despesa comprometida, no valor de 10.114,1 milhões de euros, foi inferior à soma do montante de receita cobrada (9.041,1 milhões de euros) com o saldo de gerência de exercícios anteriores (1.210,9 milhões de euros), que totalizou 10.252,0 milhões de euros. “Assim, poderá concluir-se que o setor autárquico apresentou, neste ano, um superavit no valor de 137,9 milhões de euros, já que se assumiram despesas num total inferior ao volume de receita disponível para a pagar”, é concluído no estudo.

Taxas do imobiliário dominam

A investigadora do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave destacou ainda que houve em 2019 um melhor rácio de receitas cobradas pelos municípios em relação às receitas que apresentaram nas suas previsões, o que demonstra a tendência de “os orçamentos serem mais reais”.

No ano em que melhor foram capazes de arrecadar valores de receita próximos do orçamentado (acima dos 90%), os municípios cobraram 3.569,6 milhões de euros em impostos e taxas em 2019, com destaque para o IMT, a fonte de receita mais relevante sobretudo para os municípios de grande dimensão. A receita fiscal contribuiu, em média, para 39,5% do total da receita autárquica, com um peso que varia em função da dimensão do município: nos municípios de pequena dimensão esta média situou-se em 16,2% da receita total, nos municípios de média dimensão subiu para 38,6% e nos de grande dimensão para 54,1%. Já o IMI registou em 2019 uma variação negativa de menos 1,4% em relação ao ano anterior, para um valor global de 1.489,0 milhões de euros.

O Porto, Cascais, Portimão, Loulé e Coimbra foram os municípios que em 2019 apresentaram maior peso de receitas provenientes de impostos, taxas e licenças, no total da receita cobrada. Lisboa está em 29.º na lista, que relaciona o peso das receitas provenientes de impostos nas receitas cobrada, salientando o estudo que o peso da receita fiscal na capital “baixou -16,8% devido essencialmente à descida do IMT (-50,9 milhões de euros, -20%)”. No entanto, é Lisboa que encabeça a lista dos municípios que em 2019 apresentaram maior valor de receita fiscal (532.336.981 euros), seguida do Porto (179.850.240), Cascais (152.522.546), Sintra (107.309.716) e Oeiras (102.256.645).

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