Dispositivos médicos: um imposto que promove a desigualdade de acesso

Se a criação desta medida no Orçamento do Estado de 2020 foi considerada extremamente injusta e desadequada, o timing atual é nefasto para as empresas (e seus 3500 colaboradores) que disponibilizam dispositivos médicos, devido às perdas muito significativas ocorridas no corrente ano e que se prevê que venham igualmente a materializar-se ao longo de 2021.

O Orçamento do Estado para 2021 representa, segundo o Governo, uma continuidade na aposta na saúde, embora por motivos distintos do Orçamento do ano anterior e que são facilmente justificados pela atual conjuntura pandémica, dada a consequente necessidade de contratação de profissionais de saúde e de investimento no reforço de stock em equipamentos de proteção individual, em tecnologias da saúde, em vacinas, entre outros.

Porém, uma leitura mais atenta mostra que o documento insiste em medidas que podem colocar em causa a prestação dos cuidados de saúde aos utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS). É o caso da contribuição extraordinária sobre os fornecedores de dispositivos médicos aos hospitais do SNS, que varia entre 1,5% a 4% da faturação das empresas.

A medida agora proposta no Orçamento do Estado para 2021 não poderia ser mais inoportuna, essencialmente atendendo aos impactos económicos adversos associados à crise pela pandemia da covid-19. Se a criação desta medida no Orçamento do Estado de 2020 foi considerada extremamente injusta e desadequada, o timing atual é nefasto para as empresas (e seus 3500 colaboradores) que disponibilizam dispositivos médicos, devido às perdas muito significativas ocorridas no corrente ano e que se prevê que venham igualmente a materializar-se ao longo de 2021.

Ora, esta medida é contraproducente num momento em que se esperam estímulos à economia e o relançamento das condições de prosperidade para os diversos setores da atividade económica.

Importa ainda realçar que, no contexto europeu, nenhum outro país implementou medidas similares a esta, pelo que este imposto vem sobrecarregar ainda mais um setor de atividade que (sobre)vive já com imensas dificuldades para fazer face aos elevados custos de contexto quando comparados com outros países.

Por outro lado, e não menos displicente, esta contribuição extraordinária virá contribuir para a falta de equidade entre o setor público e o privado/social. De facto, a introdução deste tributo poderá materializar-se, a breve trecho, num forte desequilíbrio à normal confluência entre oferta e procura por dispositivos médicos com prejuízos significativos para todas as partes, incluindo para os utentes do SNS, sobretudo por contraposição à potencial oferta de dispositivos médicos nos hospitais do setor privado e social.

Facilmente se compreenderá que o mesmo dispositivo, quer seja diferenciado ou de consumo clínico corrente (por exemplo: cateter, seringa, agulha hipodérmica, fio de sutura, material de penso), poderá não ter condições para ser comercializado nos hospitais do SNS, nos quais será taxado entre 1,5% e 4%, continuando a estar disponível no sector social e privado.

Como sector é difícil aceitar esta desigualdade de acesso a cuidados de saúde, como cidadão é inaceitável.

Para bem dos cidadãos portugueses e dos utentes do SNS, apela-se aos partidos políticos representados na Assembleia da República que façam uma reflexão na intenção de voto na especialidade, que se materialize na eliminação desta medida.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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