Mesquita Nunes avisa: “Erro cometido nos Açores compromete a sobrevivência” do CDS

Antigo vice-presidente do partido acusa a direita de ter cometido “um erro estratégico e político” ao ter “elevado o Chega a parceiro essencial para a alternativa” nos Açores.

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Adofgo Mesquita Nunes foi o primeiro subscritor do abaixo assinado: "A clareza que defendemos" Nuno Ferreira Santos

Ao fim de dez meses de silêncio sobre a vida interna do CDS, Adolfo Mesquita Nunes, antigo vice-presidente democrata-cristão, afirma que o partido cometeu “um erro estratégico e político” ao garantir a aliança à direita nos Açores e desmonta a tese de que “a direita estava condenada a um acordo com o Chega para governar os Açores”. E avisa que “o erro cometido nos Açores compromete a sobrevivência” do partido”.

Num artigo publicado esta sexta-feira no Observador, Adolfo Mesquita Nunes explica que “era fácil ter submetido o Chega e era perfeitamente possível ter chegado ao poder nos Açores sem o valorizar (…). Bastaria que a democracia parlamentar funcionasse: na hora H, o Chega chumbaria a esquerda, tornando inevitável um governo de PSD, CDS e PPM. Poderia o representante da República recusar uma viabilização parlamentar?”

Adolfo Mesquita Nunes é o primeiro subscritor do abaixo-assinado “A clareza que defendemos”, publicado há uma semana no PÚBLICO, no qual se critica a “inquietante deriva […] nacionalista, identitária, tribal”, que “faz o seu caminho entre forças da direita autoritária e partidos conservadores, liberais moderados e reformistas”.

No texto que escreve esta sexta-feira, intitulado “O governo que poderia ter sido (e o presente que se deu)”, o ex-dirigente nacional lamenta que o PSD e o CDS tenham seguido uma estratégia diferente. “Em vez de sujeitarem Ventura ao dilema de viabilizar a direita ou a esquerda, deram-lhe o poder de escolher, de condicionar e de liderar a narrativa. E, pior, deixaram cristalizar a tese de que sem Ventura não há alternativa. Essa tese não se sustenta: o poder de Ventura para obrigar o PSD e o CDS fosse ao que fosse era zero. Foi um erro estratégico e político”, aponta.

Sublinhando que “se tivesse havido estratégia e vontade, a direita não corria risco de ser chumbada por Ventura, uma vez que o eleitorado jamais lhe perdoaria que viabilizasse o governo socialista”, o centrista conclui que “faltou estratégia ou vontade ou ambas”. Mesquita Nunes revela ainda que, se o partido tivesse outra estratégia, o Chega seria “relegado e estaria a braços com uma discussão interna. “Estaríamos a preparar caminho para a construção de uma alternativa reformista ao socialismo para as próximas legislativas. Era a viragem. Mas não foi por aqui que fomos e o Chega foi elevado a parceiro essencial para essa alternativa. Foi um erro estratégico e político”.

Mesquita Nunes não poupa a direcção nacional “não só porque não reúne os órgãos do partido”, mas também por considerar que o presidente do CDS está “cada vez mais distante dos valores do centro-direita democrático e popular.” E deixa um aviso a Francisco Rodrigues dos Santos: “A ameaça ao CDS não está nos críticos de um acordo com o Chega (…), mas nos falsos amigos que nunca votaram CDS e insistem que o CDS tem tudo para ganhar em deixar Ventura entrar no arco da governabilidade”.

Argumentando que o “país precisa de uma alternativa reformista ao socialismo”, o ex-secretário de Estado do Turismo afasta o Chega desta solução. “Essa alternativa ao socialismo, em que firmemente acredito, não depende ideologicamente do Chega, porque o Chega é aliado dos populistas e autoritários, abraçado por vontade própria às Le Pen desta vida (…)”, declara, revelando a receita para a direita regressar ao poder. Para que isso aconteça, “a direita precisa de um bom programa, de uma boa liderança de um projecto inspirador, de uma cultura de união e de serviço, de uma resposta de esperança a quem está a ficar para trás e vê o mundo avançar demasiado depressa”.

Adolfo Mesquita Nunes aproveita para deixar avisos: “É um erro deixar essa alternativa ao socialismo nas mãos do Chega porque compromete a possibilidade de um projecto reformista que resolva os problemas de todos os que perderam já a esperança e compromete a sobrevivência e a identidade do meu partido. É por isso que o erro cometido nos Açores não deve repetir-se”.

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