Ecovia em Coimbra, êxito ou falhanço?

Ao relançar o sistema, 25 anos depois e assente nos mesmos moldes e princípios, a Câmara Municipal de Coimbra demonstra ter parado no tempo e não ter sido capaz de tirar partido da experiência acumulada.

A Câmara Municipal de Coimbra (CMC) anunciou recentemente o relançamento do sistema de Park@Ride na cidade de Coimbra, designado de Ecovia, com vista a retirar veículos automóveis do centro da cidade. É certo que este tipo de sistema, quando devidamente planeado, estruturado e gerido, visa convidar os condutores, particularmente os associados a movimentos pendulares, a largarem os seus veículos próprios em parques periféricos à cidade e a acederem ao espaço urbano através dos transportes públicos, potenciando a redução dos congestionamentos de tráfego e a pressão sobre o sistema de estacionamento.

A experiência internacional, demonstra que o êxito destes sistemas está associado à localização estratégica dos parques, os quais devem ser facilmente acessíveis a partir das principais entradas na cidade; à facilidade e atratividade do transbordo para a rede de transportes públicos, e; ao custo, o qual se deve revelar competitivo em relação ao uso do automóvel particular.

Ora, foram estas três condições basilares que falharam na primeira versão da Ecovia, instalada em 1997 e que, por insustentabilidade económica, justificou o seu encerramento, em 2006. Ao relançar o sistema, 25 anos depois e assente nos mesmos moldes e princípios, a CMC demonstra ter parado no tempo e não ter sido capaz de tirar partido da experiência acumulada.

A maioria dos parques agora propostos (4 em 6) situa-se no interior do espaço urbano, alguns deles em sítios críticos do ponto de vista da acessibilidade, pelo que em nada contribuirão para aliviar os congestionamentos de tráfego. A agravar, esses parques, por serem interiores ao espaço urbano, respondem já, com elevada taxa de ocupação, a estadias de média duração, onde a componente final de viagem é maioritariamente assegurada a pé. Por isso, torna-se prioritária a definição de uma política adequada de utilização e de preços para uso desses parques, a qual não pode passar pela sua afetação exclusiva ao sistema da Ecovia.

Garantir o transbordo em qualidade e a atratividade do sistema de transportes públicos é outro desafio primário, cuja superação assenta na oferta de uma elevada frequência de carreiras e na garantia de tempos de percurso competitivos em relação aos praticados, caso a globalidade da viagem fosse efetuada em automóvel próprio.

Tal princípio justifica o estudo criterioso dos trajetos das carreiras, os quais devem ser curtos e diretos na ligação aos destinos finais e na definição de um plano de investimentos de forma a resolver problemas infraestruturais que imponham demoras, destacando-se a criação de uma rede lógica e contínua de corredores Bus e a adoção de medidas de apoio aos transportes públicos nos cruzamentos. Também a abertura do sistema a toda a rede de operadores de transportes locais se revela vantajosa, aumentando a oferta, frequência e a cobertura geográfica do serviço, ao mesmo tempo que reduz os tempos de espera e custos operacionais, tirando partido da oferta e da capacidade instalada.

Ora, nada disto está previsto, já que a Ecovia se apresenta como um sistema fechado, apoiado na criação de 4 linhas asseguradas por miniautocarros elétricos, com frequência ainda desconhecida e, em alguns casos, com trajetos longos, sinuosos, demorados e pouco atrativos. Importa ainda ter presente que 4 dos 6 parques aderentes se localizam nas imediações das estações do futuro MetroBus (em fase de arranque de obra), pelo que é crucial salvaguardar que este novo serviço será complementar e não concorrencial ao futuro Busway. Para isso, deve ser garantida a interoperacionalidade entre operadores, proporcionando aos aderentes, de forma integrada e sem custos acrescidos, o acesso à rede específica da ECOVIA, aos SMTUC, ao MetroBus e a outros sistemas que se venham a instalar.

Não menos importante é o preço a pagar. Para o sistema ser atrativo e de forma a compensar o desconforto necessariamente associado ao transbordo, deve ser taxado a preços módicos, ou ser tendencialmente gratuito. A chave do sucesso está na garantia do preço percecionado pelo utilizador ser inferior ao associado à viagem feita em veículo individual, o que eleva a relevância da gestão paralela e correspondente fiscalização do sistema de estacionamento no centro da cidade e, em particular, nos espaços sujeitos a maior pressão da procura. Sem isso, continuará a compensar o uso do veículo individual e a arriscar largá-lo, em qualquer sítio, mesmo que em transgressão.

Mas a definição de uma política adequada de preços deve ainda justificar a criação de pacotes de mobilidade com preços concorrenciais, numa ótica de mobility-as-a-service (maas), onde se promova o uso integrado dos diferentes sistemas disponíveis (parques e serviço Ecovia, MetroBus, rede SMTUC, bike-sharing,…), oferendo diferentes modalidades de adesão e de títulos de transporte que permitam promover e tirar partido da complementaridade do sistema.

Com a simples reposição do sistema implementado na década de 90, mantendo os mesmos erros e patologias de então e, sobretudo, sem qualquer planeamento ou conhecimento prévio das bacias de captação, dos níveis de procura e dos custos e benefícios que o sistema Ecovia possa vir a gerar, Coimbra voltará a respaldar um sistema economicamente insustentável, reduzido a uma mera bandeira política e que em nada contribuirá para a alteração dos padrões de mobilidade urbana.

Mais uma vez, serão os contribuintes de Coimbra a suportar os custos do sistema e a autarquia a demonstrar uma incapacidade absoluta para aprender com os erros cometidos no passado.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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