Para a Ciência, apenas o melhor

Os investigadores, hoje juniores, e daqui a uns anos seniores, precisam de se tornar competitivos, a bem do futuro da ciência em Portugal. Para tal, estes investigadores carecem de contratos de trabalho de longa duração e de financiamento para os seus projectos de investigação.

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Adriano Miranda

A Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) apresentou os resultados dos concursos de projectos IC&DT no passado dia 6 de Novembro. Desde lá, muito, e bem, se tem dito sobre a baixíssima taxa de aprovação neste concurso (um pouco mais da 5%, nas palavras de Federico Herrera, Luís Monteiro e Susana Peralta, e 9,40% para a FCT), mas poucos se lembraram de felicitar a FCT por ter providenciado os resultados deste concurso de forma tão célere. Os resultados deste concurso foram divulgados passados sensivelmente seis meses do período de candidatura, contrariamente ao que se passou no concurso de 2017, quando foi necessário um ano até à conclusão da comunicação dos resultados. Apesar deste meu cumprimento inicial à FCT, o objectivo desta reflexão é discutir as consequências desta realidade no dia-a-dia dos jovens investigadores e, consequentemente, do futuro científico do país.

Dados de 2016 referem que Portugal tem, em média, cinco doutorados por cada 1000 habitantes entre os 25 e os 64 anos, mostrando uma realidade que dista da média da OCDE de 9,9 doutorados por cada 1000 habitantes. Em 2016, 2017 e 2018, a média de novos doutorados em Portugal foi de 0,8, enquanto que, em 2018, a União Europeia (dos 28) produzia, em média, 1,4 doutorados por cada 1000 habitantes entre os 25 e 34 anos. O número total de doutorados em Portugal tarda, portanto, em convergir para os valores médios internacionais e, consequentemente, torna-se obrigatório reter estes activos intelectuais em Portugal. Mas conseguiremos mantê-los por cá?

A área científica é, pela sua natureza, uma actividade altamente competitiva em que os investigadores competem internacionalmente pela apresentação das melhores ideias e pela sua concretização. Os cientistas são tanto mais competitivos, experientes e conhecidos internacionalmente quanto maior o número de publicações científicas, de apresentações em conferências internacionais, de patentes, de colaborações internacionais, entre outros. Os investigadores, hoje juniores, e daqui a uns anos seniores, precisam de se tornar competitivos, a bem do futuro da ciência em Portugal. Para tal, estes investigadores carecem de contratos de trabalho de longa duração e de financiamento para os seus projectos de investigação. Tendo em conta que o terceiro Concurso de Estímulo ao Emprego Científico (CEEC) - Individual contemplou 300 investigadores com um contrato de trabalho e que foram recomendados 312 projectos para financiamento, podemos facilmente concluir que o futuro da ciência em Portugal pode estar em risco.

A FCT apresenta regularmente outros concursos em áreas que eu apelidaria de estratégicas. Existem, no entanto, problemas claros quando se atribui uma parte substancial do orçamento para ciência em áreas pré-definidas. Veja-se o exemplo da covid-19, que não era uma área prioritária há apenas uns meses. Está-nos a valer a ciência básica que já existia.

Além do CEEC – Individual, os investigadores podem ser contratados para desempenhar tarefas em projectos de investigação de outros investigadores, como docentes, em empresas, entre outros. Relativamente a este ponto, o Observatório do Emprego Científico afirma que foram contratados 5166 investigadores/docentes desde Janeiro de 2017 até 24 de Setembro de 2019. Ora, este número não é suficiente nem para contratar os doutorados que terminaram o seu doutoramento em 2017. Assim, resta-me concluir que sobra para estes investigadores a emigração e para o país a permanência nas posições abaixo das médias internacionais.

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