Testes rápidos: uma semana depois, escolas e lares sem orientações. DGS garante que “tudo será explicado a seu tempo”

Marcas já estão a promover e enviar informação sobre testes rápidos de antigénio a responsáveis de lares. DGS diz que “até ao dia 15 de Novembro foram contabilizados no SINAVE cerca de 565 casos confirmados” por este tipo de testes.

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Nelson Garrido

Nos estabelecimentos de ensino, dirigentes escolares continuam sem nada saber sobre a realização de testes rápidos de antigénio. Nos lares, responsáveis do sector continuam a contar que há quem os faça, mas pagando-os. Uma semana depois de ter entrado em vigor o decreto relativo ao estado de emergência e a norma que prevê o uso deste tipo de testes, dirigentes destes estabelecimentos e instituições desconhecem qualquer alteração ao habitual procedimento de testagem. Nem receberam qualquer informação adicional sobre o assunto. Mas a Direcção-Geral da Saúde (DGS) já fez saber que dará essas explicações, “a seu tempo”.

Numa resposta enviada ao PÚBLICO por escrito, a DGS esclarece apenas, sem mais detalhes, que “até ao dia 15 de Novembro foram contabilizados no SINAVE [Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica] cerca de 565 casos confirmados por TRAg [Testes Rápidos de Antigénio]”. 

Antes, em declarações à RTP, o director do Departamento da Qualidade na Saúde da DGS​, Valter Fonseca, tinha afirmado o seguinte: “Não existe desarticulação, existe uma operacionalização e implementação progressiva que, com as equipas de proximidade, junto das escolas, dos lares, tudo será explicado a seu tempo, à medida que os testes irão ser implementados e utilizados.”

O mesmo responsável acrescentou: “Há uma relação de proximidade entre as escolas e as equipas de saúde escolar e as autoridades de saúde locais que estão, progressivamente, em conversações para que seja claro a forma como estes testes vão ser utilizados sobretudo em situações de surto, mas penso que é importante referir que a sua utilização deve ser feita com critério, não deve ser feita em massa. A utilização nas escolas, mesmo nessas situações, deve ser feita sempre que existe uma suspeita de surto ou sempre que existam casos suspeitos de covid -19”.

Mas, no terreno, os dirigentes escolares ainda não registaram qualquer mudança na testagem relativa ao SARS-CoV-2, que provoca a covid-19: “Os testes rápidos ainda não estão a ser usados nas escolas, estamos à espera de indicações. Vimos o anúncio do primeiro-ministro, depois o decreto, que chegou às escolas, agora estamos à espera de orientações, quer para testes rápidos, quer quanto à possibilidade de medição de temperatura, mas sobretudo em relação à realização de testes rápidos. Não há nenhuma alteração nos procedimentos que temos estado a adoptar até agora”, diz ao PÚBLICO o presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, notando que, “até agora, quando há uma situação de suspeita”, a escola avisa “o encarregado de educação e a autoridade de saúde local, e o aluno é encaminhado para uma unidade de saúde para eventualmente fazer um teste, este é o procedimento e não há qualquer alteração”.

Filinto Lima não tem dúvidas de que “a realização dos testes rápidos é uma medida positiva que carece”, no entanto, “de ser implementada”: “Precisamos de esclarecimentos, em que circunstâncias, quem os realiza, quando podem ser feitos. O decreto diz que nós determinamos a realização de testes, mas com base em que critérios? Não sei. Em que circunstâncias? Quem os faz? Há uma série de dúvidas que têm de ser esclarecidas. Gostaria que a tutela esclarecesse estas dúvidas no mais curto espaço de tempo possível. Até porque tornará as escolas mais seguras.”

O decreto prevê não só que possam ser sujeitos à realização de testes de diagnóstico “os trabalhadores, estudantes e visitantes dos estabelecimentos de educação e ensino e das instituições de ensino superior” como que o “responsável máximo do respectivo estabelecimento” determine a realização de testes.

O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel Pereira, também confirma que nada sabe sobre testes rápidos de antigénio e que não recebeu qualquer informação nova, “especificamente para escolas”, na sequência dos documentos que entraram em vigor. “Não sabemos de nada ainda, de nenhuma alteração ao procedimento habitual, não nos deram nenhuma informação adicional. Mas não considero preocupante, porque a nossa relação com a autoridade saúde [local] é rápida e próxima, e eles farão o que entenderem. Pode haver alguma articulação com a autoridade saúde local nesse sentido, mas nós não sabemos de nada.”

O PÚBLICO questionou as administrações regionais de saúde (ARS) sobre a utilização deste tipo de testes. A ARS do Algarve esclareceu que “os testes rápidos de detecção de antigénio recebidos na Administração Regional de Saúde do Algarve foram distribuídos pelas ADR - Áreas Dedicadas para Doentes Respiratórios da região e pelas unidades hospitalares do Centro Hospitalar Universitário do Algarve” e que, “até ao momento, ainda não se verificou nenhuma situação em que fosse necessária a utilização destes testes nem em escolas nem em lares da região”

Marcas promovem testes junto de responsáveis de lares

O decreto relativo ao estado de emergência também estipula, entre outras situações, que possam ser feitos testes a trabalhadores, utentes e visitantes de estruturas residenciais para idosos. Mas, mais uma vez, nos lares, não parece haver mudanças a registar em relação ao que se tem passado até agora. O presidente da Associação de Apoio Domiciliário de Lares e Casas de Repouso de Idosos confirma que há, no sector, lares que testam funcionários, sendo que “a frequência não é a mesma” em todas as instituições, e que os utentes são testados quando apresentam sintomas. Quanto a testes a visitantes, nada sabe. Ou seja, tanto quanto tem conhecimento, pelo menos nos lares privados, universo que conhece, nem a norma da DGS, nem o decreto que regulamenta o estado de emergência, ambos em vigor há uma semana, alteraram, para já, os procedimentos de testagem adoptados nestas instituições.

João Ferreira de Almeida diz ainda ter conhecimento de que, "pontualmente, há um ou outro lar que está a fazer testes rápidos”, mas suportando os custos. Este responsável já enviou, por email, perguntas à tutela sobre testes rápidos de antigénio, nomeadamente sobre se podem ser feitos pelos profissionais de saúde dos lares. 

Segundo relata ainda, estes testes poderão ser adquiridos “junto dos laboratórios”. Ao PÚBLICO, conta que já recebeu, por email, informação de marcas “a promoverem estes testes rápidos antigénio” e outro tipo de testes rápidos, como os serológicos que detectam anticorpos. Entre os valores inscritos nas propostas, com diferentes detalhes técnicos, recorda-se de que, num caso, “um kit com 25 testes custava 250 euros mais IVA”. 

Duas das marcas sobre as quais recebeu informação terão sido a Abbot e a Roche, as mesmas que utiliza a Cruz Vermelha Portuguesa – instituição que, como referiu o presidente da Confederação Nacional das Instituições Particulares de Solidariedade Social, Lino Maia, já foi a alguns lares, a pedido dos próprios, fazer este tipo de testes. O gestor do Programa Especial de Testes Covid-19 da Cruz Vermelha Portuguesa, Gonçalo Órfão, também já confirmara, antes, que tinham existido “pedidos esporádicos dos próprios lares” para realizarem este tipo de testes.

O presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos, também disse ao PÚBLICO que não recebeu qualquer orientação sobre testes rápidos antigénio ou sobre testes a visitas. “Não há alterações de procedimentos sobre testagem em lares, pelo menos no universo das misericórdias portuguesas”, diz, admitindo, no entanto, que há lares que estão a usar testes rápidos. “Que eu saiba, compram-nos normalmente às farmacêuticas e pagam-nos”, acrescenta.

Admite que a União das Misericórdias também já “recebeu informações de uma marca que produz estes testes [rápidos antigénio, de zaragatoa]”, que foi mesmo “fazer uma demonstração na central de negociações da União”. Manuel Lemos escusa-se, no entanto, a dizer qual a marca e, quanto a valores, diz apenas que a equipa os considerou "muito em conta”.

Lino Maia confirma igualmente que não lhe chegou qualquer “informação adicional sobre mudança de procedimentos na testagem que é feita nos lares” – até agora, explica, sempre que há casos suspeitos ou surtos informa-se a autoridade de saúde local e os testes, que têm sido feitos, têm sido os moleculares que vão para laboratório. “Estão a ser feitos os testes normais de forma mais ou menos sistemática e organizada, gostaríamos de mais, mas não está a correr mal. Em alguns casos, estão a ser feitos os rápidos, mas por iniciativa das próprias instituições”, diz, referindo que tal pode ser feito, por exemplo, através da Cruz Vermelha e acrescentando que os custos têm sido suportados pelos lares. Também confirma que nestas instituições já havia, antes da entrada em vigor da norma e do decreto, testes para a serem feitos a utentes, trabalhadores e dirigentes, mas quanto a visitas nada sabe.

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