Via Graça abriu o 9b: o irmão mais novo é um clássico sem complicações

Descontraído, divertido, surpreendente, o novo restaurante 9b tem à frente Guilherme Spalk. O chef assegura a cozinha tradicional e com clientela fiel do Via Graça, o restaurante que tem entre os pratos principais uma das melhores vistas de Lisboa.

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Guilherme Spalk na cozinha do 9b dr

É uma constatação incontornável – e repetida em todos os textos –, por isso vamos começar logo por ela antes de seguirmos para as novidades: o Via Graça sempre teve, e continua a ter, uma das mais extraordinárias vistas sobre Lisboa que um restaurante pode ter.

Dito isto, o Via Graça está diferente. Não se preocupem os entusiastas do espaço porque a parte de baixo continua igual, com a mesma carta e os mesmos pratos que fidelizaram a clientela ao longo de mais de trinta anos – e serviço non-stop também entre o almoço e o jantar. Mas na parte de cima acaba de nascer o 9b, um fine dining que é uma espécie de irmão mais novo e mais irreverente do Via Graça, mas claramente filiado na mesma tradição clássica.

À frente da cozinha está Guilherme Spalk​, o chef que tínhamos conhecido na Taberna Fina (já encerrada) onde trabalhou com André Magalhães. Sendo ele próprio praticamente da mesma idade que o Via Graça, tem uma abordagem que mistura respeito e consciência da responsabilidade com alguma leveza, espontaneidade e um (muito bem-vindo) sentido de humor.

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O 9b apresenta dois menus, um maior, outro mais pequeno dr

Vamos, então, falar da comida. Há dois menus, um mais curto, o 9+b, que se apresenta como uma viagem por “sabores e memórias lisboetas” e um mais longo, o 9+9, que é “mais ibérico”, porque, explica o chef, “Portugal e Espanha trabalham os mesmos produtos mas de formas diferentes”.

À primeira vista, a lista de 18 pratos pode assustar – somos avisados de que o serviço dura cerca de duas horas e meia, enquanto o do menu mais curto dura uma hora e meia. Optamos pelo mais longo por nos parecer uma melhor forma de ficarmos a conhecer o trabalho de Guilherme Spalk, que nos garante que não será uma refeição demasiado pesada. Confiamos. E, no final, confirmamos que é verdade.

Um dos detalhes que revelam como Spalk se divertiu a construir este menu, feito de muitos pequenos pratos, é a ligação que surge entre alguns deles, como se uma linha de continuidade os atravessasse. Acontece, por exemplo, com o caldo de cogumelo, trufa e tutano – os mesmos cogumelos voltam a aparecer logo a seguir num outro prato de abóbora, cogumelo e requeijão caseiro, dando assim uma continuidade aos sabores. 

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Mas a ligação é ainda mais evidente nos três momentos seguintes, que começam com cordeiro de leite do Alentejo, passam para um prato que é apenas o molho do cordeiro, com malagueta e pão para mergulharmos no molho (Spalk diz, rindo, que já houve quem dissesse que era o melhor prato do menu) e, por fim, chega a batata (sim, apenas uma, pequena, no meio do prato) recheada com queijo de Azeitão.

Antes disso tínhamos tido, além dos snacks iniciais, da horta, do mar e da terra, uma lula dos Açores com algas e coentrada, uma cabeça de gamba branca do Algarve (a mesma brincadeira, dividida por dois pratos), seguida pela gamba branca com milho e poejo, e ainda o robalo de anzol com aipo e caviar. A parte salgada da refeição termina num pico de sabor com moleja, couve e cebola.

As sobremesas – três – agradarão certamente mais a quem gosta de terminar um jantar numa nota mais fresca e leve do que a quem gosta de doces declaradamente doces, ou de chocolates calorosos. Não sendo pasteleiro, Guilherme Spalk assume que optou por sobremesas que exploram muito mais a fruta do que outros ingredientes: temos, primeiro, a maçã Bravo de Esmolfe (e é a própria maçã, inteira, que nos é apresentada), seguida por pêra Rocha com tomilho-limão e, por fim, uvas verdes com chocolate e Moscatel.

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A famosa garrafeira do Via Graça serve também o novo 9b dr

Incontornável para quem visita o Via Graça (e agora o novo 9b) é a garrafeira que, entre muitas outras coisas (a carta inclui 500 referências), apresenta uma colecção de todos os anos do Barca Velha, com uma única excepção: 1954.

Agora, o sommelier Diogo Frade está a diversificar a garrafeira clássica com algumas opções diferentes, de produtores mais pequenos, que cruza, sem complexos, com grandes nomes do mundo do vinho português – desde o Ilha, da madeirense Diana Silva, até um Mouchão de 2013. O resultado é interessante e será ainda mais no futuro, assegura Diogo, que vai começar a integrar mais vinhos de outros países na sua oferta.

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