O Volt e o federalismo europeu

Com o recuo diante duma Constituição europeia, substituída pelo Tratado de Lisboa, talvez se tenha perdido uma oportunidade única para se avançar mais decididamente no caminho de uma federação.

O Volt Europa, fundado em 29.03.2017, como reação ao “Brexit”, é um movimento político federalista pró-europeu, sendo pan-europeu para as secções nacionais em vários Estados-membros. Segue uma abordagem pan-europeia em muitas áreas políticas. No dia 30 de junho de 2020, o Tribunal Constitucional português deferiu favoravelmente o pedido da sua inscrição como partido formal, ficando a designar-se Volt Portugal. Talvez por se tratar de um partido ainda muito jovem, é praticamente desconhecido dos portugueses, razão pela qual merece destaque a entrevista, concedida ao Diário do Minho, na edição de 3/11/2020, pelo vimaranense Mário Rui Lourenço.

Nessa entrevista afirmou, além do mais, “ter em mãos a divulgação do partido Volt no distrito de Braga, sendo que um dos seus objetivos é defender e promover um “novo modelo de governo para a União Europeia, uma federação ou uma espécie de Estados Unidos da Europa. Segundo Mário Rui Lourenço, o Volt “irá trabalhar para alterar a estrutura orgânica da atual União Europeia, transformando-a numa verdadeira democracia”.

Ora, sendo eu, há muito tempo, um acérrimo defensor de uma federação para a Europa, importa esclarecer as motivações para alcançar esse desiderato. Como é sabido, a Comunidade Europeia nasceu para fazer face aos desafios da reconstrução económica, social, política e militar, após a 2.ª Guerra Mundial, bem como para defender a “sociedade aberta” dos ataques dos seus inimigos.

Esperava-se que o Tratado de Lisboa constituísse uma nova tentativa de concentrar numa só entidade a União Europeia (UE) instituída em Maastricht, em 1992, dando corpo ao consenso dos Estados-membros quanto ao modelo de integração a prosseguir. A crise política, económica e social em que a UE está mergulhada parece demonstrar que o atual modelo não é o mais adequado para a prossecução dos seus fins.

A vida da União Europeia não tem sido nada fácil nestes últimos anos da sua existência, com alguns autores a dizerem que a UE, nestes últimos 20 anos, tem seguido um caminho centralizador, contrariando os êxitos notáveis no seu início, sendo o mais importante a sedimentação da paz através da reconciliação entre os principais inimigos que se tinham combatido na última Guerra Mundial.

Afigura-se que os caminhos sinuosos seguidos pela UE só se corrigem com o federalismo, bem preferível ao atual diretório franco-alemão, a impor as suas leis aos restantes Estados-membros.

O federalismo europeu é uma ideia já com muitos anos. Por exemplo, Proudhon (1809-1865), escritor socialista francês, no seu programa, destinado a criar uma sociedade assente na igualdade e na justiça, escrevia em 1863: “Só o federalismo pode resolver, em teoria e na prática, o problema de um ajustamento entre os princípios da liberdade e da autoridade, deixando a cada um a sua esfera própria, a sua verdadeira competência, a sua plena iniciativa. Por isso, só o federalismo garante, por um lado, o respeito tanto pelo cidadão como pelo governo, e, por outro lado, a ordem, a justiça, a estabilidade e a paz”. Para o federalismo ibérico, as ideias federalistas de Proudhon exerceram grande influência sobre alguns escritores portugueses da geração de 70 do séc. XIX, nomeadamente Antero de Quental, Oliveira Martins e Eça de Queirós. Mas o mais notável discípulo do federalismo proudhoniano foi Antero de Quental, que expôs ideias federalistas nos seus escritos sobre o socialismo e no opúsculo intitulado Portugal perante a revolução de Espanha.

Recorde-se que, na atual estrutura da União Europeia, os Estados-membros já perderam muito da sua soberania. A questão é saber se em troca dessa perda de soberania resulta maior eficácia para a obtenção dos objetivos propostos no art. 3.º do Tratado de Lisboa: por ex., a paz, os seus valores, o bem-estar dos seus povos e o desenvolvimento económico sustentado dos Estados-membros. O caminho que alguns propugnavam vai no sentido duma maior aproximação ao federalismo europeu, tentando a aprovação de uma Constituição Europeia ou Tratado Constitucional. Com o recuo diante duma Constituição europeia, substituída pelo Tratado de Lisboa, talvez se tenha perdido uma oportunidade única para se avançar mais decididamente no caminho de uma federação.

Afigura-se cada vez com mais evidência que a união política é a única saída para o Velho Continente. Para os defensores do federalismo, esta é a melhor forma de vida política e social para uma Europa Unida onde o aspeto básico é o pluralismo, a sua tendência fundamental é a harmonização e o seu princípio regulador é a solidariedade, tendo como resultado final a ordem, o progresso, a justiça, a estabilidade e a paz. Nestes termos, espera-se que o Volt siga, com êxito, o seu caminho na direção do federalismo europeu.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Sugerir correcção