Conclusões sobre a bitola geram polémica no congresso sobre transportes

Oradores não se revêem nas conclusões do congresso sobre a interoperabilidade ferroviária. ADFERSIT diz que não altera o texto final.

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Nelson Garrido

As divergências entre quem entende que a bitola (distância entre carris) é um problema que deve ser resolvido com a mudança da bitola ibérica das linhas portuguesas para bitola europeia no curto prazo, e aqueles que consideram que isso é uma falsa questão e que tem solução no longo prazo, esteve bem patente nos debates do 14º congresso da ADFERSIT - Associação para a Defesa dos Sistemas Integrados de Transportes, mas as suas conclusões não reflectem a pluralidade de opiniões.

Carlos Vasconcelos, presidente da Medway, escreveu à comissão executiva do congresso manifestando o seu “espanto e desagrado com as conclusões do nosso painel, na medida em que desvirtuam o que efectivamente nele se consensualizou e divergiu”.

O administrador diz que as conclusões omitem as divergências do debate, “apresentando a visão e opinião parciais do moderador e não, como competia, de todos os palestrantes”.

O painel em causa tinha como tema “A interoperabilidade ibérica e a interoperabilidade europeia” e teve como oradores José Couto (CIP), José António Barros (AEP), José Ramalho (Thales Portugal), Filipe Costa (AICEP) e Carlos Vasconcelos (Medway). Os dois primeiros entendem que as novas linhas férreas sejam já construídas em bitola europeia sob pena de Portugal ficar uma “ilha ferroviária” e os dois últimos defenderam que não há urgência na migração da bitola sendo mais importante resolver outros problemas, técnicos e administrativos, que impedem uma verdadeira interoperabilidade ferroviária.

As conclusões, porém, reflectem o ponto de vista de quem organiza o congresso, em particular do moderador, Martins de Brito, que falou durante 40 minutos a expor o seu pensamento antes de dar a palavra aos oradores. Carlos Vasconcelos diz que “ao gastar todo aquele tempo inicial a expor as suas ideias acabou por reduzir significativamente o tempo de debate, reduzindo as intervenções dos palestrantes e defraudando as expectativas dos participantes que, garantidamente, assistiam para conhecerem as posições daqueles e não as do moderador”.

Por isso, apela a que “a verdade ainda seja reposta e que as conclusões em causa sejam devidamente corrigidas, de modo a reflectirem o que verdadeiramente foi a opinião consensual e divergente dos membros do painel”.

Contactado pelo PÚBLICO, o presidente da ADFERSIT, Leiria Pinto, limitou-se a dizer que “não faz sentido umas conclusões que foram lidas perante o ministro da Economia virem agora ser alteradas”.

O documento final do congresso dedica 4500 caracteres ao painel da interoperabilidade, expressando na verdade aquela que é desde há anos a posição da ADFERSIT sobre a urgência da migração da bitola. Os outros restantes cinco painéis - dedicados ao PNI2030, transportes públicos e sectores portuários e aeroportuários - têm uma média de 2400 caracteres.

Miguel Lisboa, administrador da Takargo, que participou num painel dedicado ao PNI 2030, também discorda das conclusões. “Nós sabemos o que tem sido a posição da ADFERSIT em relação à bitola e por não me surpreendo com as conclusões que saíram do congresso”, disse ao PÚBLICO.

O gestor sublinha o consenso existente sobre a vantagem de uma bitola única na interoperabilidade, mas discorda da sua urgência considerando que está correcto o estabelecido no PNI 2030 em construir as novas linhas em bitola ibérica, deixando-as preparadas para uma migração, no futuro, em articulação com os espanhóis.

“Por isso, não me revejo no último parágrafo das conclusões sobre a interoperabilidade”, que atribui “a necessidade de se definirem desde já quais as melhores soluções de introdução da bitola standard [europeia] nos eixos estruturantes do sistema”.

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