Mulheres de todo o mundo partilham interesse em pôr fim à violência armada

O actual momento oferece-nos a oportunidade de colocar a igualdade de género no centro do nosso trabalho pela paz e de construir um futuro benéfico para todos.

A pandemia global tem forçado toda a gente a enfrentar dificuldades e incerteza. Para os que também lidam com violência, seja através de conflitos armados fora de casa, ou dentro do lar, a insegurança e o sofrimento podem acontecer todos os dias, a qualquer hora.

No início do ano, com a entrada em vigor de regras que nos obrigaram a ficar em casa, muitas mulheres e meninas de todo o globo viram-se, de repente, confinadas com os seus agressores, e até por vezes, ameaçadas com uma arma. Pouco depois, o secretário-geral das Nações Unidas dava conta de um “aumento terrível da violência doméstica em todo o mundo”.

O fim da pandemia poderá trazer um certo alívio à vida destas mulheres, especialmente em sociedades devastadas pela violência e pelos conflitos armados. No entanto, se não tiverem a devida atenção, essas mulheres continuarão a ser vítimas de ondas de violência.

A nível mundial, as mulheres partilham um grande interesse em pôr fim à violência armada, e a todas devem ser dadas as ferramentas possíveis para combatê-la dentro das suas casas, nas comunidades a que pertencem e em todo o lado. O terrível vírus que vive entre nós só torna essa tarefa mais urgente.

Há vinte anos, o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptou a Resolução 1325 - a primeira de várias que reconheceram e reafirmaram a importância do papel das mulheres na promoção da paz e da segurança. Hoje, entendemos melhor do que nunca a forma como o género influencia as experiências individuais de conflito e de violência, inclusive quando há armas de fogo envolvidas. Actualmente, também compreendemos melhor a subtileza das forças que promovem a exclusão sistemática das vozes femininas do da promoção da paz e da prevenção de conflitos ou de violência.

Ainda assim, duas décadas depois da primeira resolução do Conselho de Segurança neste âmbito, as desigualdades fundamentais de género continuam a constituir uma realidade quotidiana.

A ausência de um controlo eficaz do desarmamento constitui um obstáculo ao alcance da paz e da justiça para as mulheres. A proliferação de armas ligeiras potencia a violência sexual de género, dentro e fora do conflito armado. As corridas ao armamento entre países e os gastos com despesas militares monopolizam uma parcela crescente dos fundos públicos que, de outro modo, poderiam ser canalizados para melhorar as perspectivas sociais e económicas de mulheres e de homens. As armas - dos revólveres às bombas nucleares - perpetuam as normas, as profundas raízes e as relações de poder que promovem a desigualdade de género.

Abordar essas questões é uma prioridade do secretário-geral das Nações Unidas, espelhada na sua declaração de que “o desarmamento previne e põe fim à violência. O desarmamento promove o desenvolvimento sustentável. O desarmamento é fiel aos nossos valores e princípios”.

Acreditamos que os governos e as organizações podem concentrar esforços na luta contra o flagelo da violência de género e remediar as desigualdades de género, cuja origem está nos mecanismos de violência. De seguida, apresentamos quatro caminhos que podem levar ao contributo igualitário de homens e mulheres para a prevenção e resolução de conflitos, para a construção da paz e da segurança.

Primeiro, todos os Estados devem adoptar políticas de desarmamento e de controlo de armas que tenham em consideração o modo como estas afectam de forma diferente homens e mulheres. A título de exemplo, os homens civis detêm a maior parte das mil milhões de armas de fogo que se estima estarem em circulação a nível mundial, sendo que ter uma arma em casa faz com que a violência do parceiro íntimo sobre a mulher tenha cinco vezes mais probabilidade de se tornar fatal.

Em segundo lugar, as mulheres devem participar de forma plena nos campos profissionais da prevenção de conflitos, das negociações de paz, da consolidação da paz, do desarmamento e do controlo de armas. Como mulheres que dedicaram as suas carreiras a essas esferas, sabemos muito bem o que é ser a única mulher numa sala cheia de decisores. Infelizmente, a situação nas Nações Unidas não é particularmente encorajadora. Quando, no ano passado, os diplomatas se reuniram na sessão da comissão da Assembleia Geral sobre o desarmamento e segurança internacional, três em cada quatro declarações foram feitas por homens. Dentro e fora das Nações Unidas, os países devem fazer tudo ao seu alcance para garantir que as mulheres, os jovens e outros grupos sub-representados se possam fazer ouvir.

Terceiro, os governos e as agências internacionais devem criar alianças com organizações civis de mulheres e outros grupos não governamentais. As mulheres que constroem e defendem a paz têm transformado comunidades em todo o planeta, lutando contra a proliferação de armas. Mundialmente, os movimentos femininos desempenharam um papel central na proibição dos testes nucleares durante a Guerra Fria e no apoio ao Tratado sobre a Proibição das Armas Nucleares em 2017, no âmbito do qual a campanha internacional para a abolição das armas nucleares, liderada por mulheres, recebeu o Prémio Nobel da Paz naquele ano.

Em quarto lugar, precisamos de informação mais sólida, sob forma de dados desagregados, que evidencie as diferentes experiências de mulheres, homens, meninas e meninos com armas e violência. Ao recolher essa informação e ao divulgar práticas, os governos e as organizações poderão criar respostas mais fundamentadas para os desafios da paz e da segurança.

Não obstante o caos, o actual momento oferece-nos a oportunidade de colocar a igualdade de género no centro do nosso trabalho pela paz e de construir um futuro benéfico para todos. Vamos aproveitar esta ocasião para promover uma mudança real.

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