Toni Bou, um “desconhecido” na galeria dos imortais

Se o número de títulos e o domínio numa modalidade valem de algo, Toni Bou já conquistou, de pleno direito, um lugar no lote dos grandes desportistas da história.

Toni Bou (à direita), com o Felipe II (ao centro) e Marc Márquez (à esquerda)
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Toni Bou (à direita), com o Felipe II (ao centro) e Marc Márquez (à esquerda) Juan Medina
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Toni Bou no trial indoor DR
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Bou no trial outdoor DR

O que faz um atleta entrar na galeria dos imortais? A hegemonia na modalidade? O número de títulos? A longevidade? O carisma? Talvez um pouco de tudo. No que diz respeito à hegemonia e aos títulos conquistados, o desporto mundial tem um “desconhecido” a querer entrar nesta galeria.

Um desporto chamado “trial” não fará soar um alarme à maioria das pessoas. E o nome Toni Bou também não – ao lado de nomes como Phelps, Jordan, Bolt, Ali ou Federer, Bou tem um valor mediático quase nulo e, mesmo no panorama espanhol, atletas como Nadal, Alonso, Márquez ou Gasol pouco espaço deixam para este piloto catalão.

Mas uma coisa é certa: se o número de títulos e o domínio numa modalidade valem de algo, Toni Bou já conquistou, de pleno direito, um lugar no lote dos grandes desportistas da história.

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Toni Bou (à direita) com Felipe II e Marc Márquez

Aos 34 anos, Bou venceu todos – sim, todos – os Mundiais de trial que disputou. Começou em 2007 e ainda não parou em 2020, com mais um título conquistado no passado dia 11. Mas há mais: de 2007 a 2020 seriam, em tese, 14 títulos. Certo? Errado. O trial é uma modalidade que, em cada temporada, tem campeonatos indoor e outdoor. E Bou domina ambos.

Isto equivale a dizer que este piloto conquistou 28 campeonatos… em 28 possíveis. Tratar-se-á, porventura, de um exemplo único de hegemonia no desporto mundial.

Desporto de velocidade e precisão milimétrica

Antes de mergulhar no feito de Toni Bou importa explicar o que está em causa. Quando pensamos em desporto motorizado, as provas de velocidade, resistência e todo-o-terreno reúnem grande parte da atenção.

O trial é, porém, um desporto motorizado que mistura um pouco de tudo – pede aos atletas que, em cima de uma moto, sejam rápidos a ultrapassar percursos de obstáculos, não podendo abdicar de uma precisão quase milimétrica. Força física, concentração, precisão, velocidade e até um pouco de loucura é o que se pede no trial.

Toni Bou definiu a modalidade à Marca: “É um desporto de auto-controlo. Não é apenas saber montar uma moto. É um desporto muito técnico, no qual tudo vai ao milímetro. É preciso usar muito bem a cabeça”.

E Bou tem sabido usá-la. Desde que chegou ao Mundial de trial, em 2007, ninguém foi capaz de o derrotar, nem mesmo o anterior campeão, lenda da modalidade e ex-recordista de triunfos, o britânico Douglas Lampkin.

“Dougie” tornou-se uma lenda do trial, com 16 títulos mundiais (oito indoor e oito outdoor), mas Bou pertence a outra dimensão e já quase duplicou o registo de Lampkin.

Albert Cabestany, rival de Bou no trial, chegou a dizer que “ele não é apenas o melhor da história do trial, é um dos melhores atletas da história”. E explicou: “Sei que isto são palavras audazes, mas não conheço ninguém que tenha mantido este nível durante tantos anos. Ele está a fazer história”.

Foi feliz em Portugal

Como motivar um atleta cujos rivais teimam, ano após ano, em não lhe fazer sombra? Bou garante que é possível. “Há sempre muito para melhorar e, como piloto, nunca se chega à perfeição (…) e, com 28 títulos conquistados, os 30 converteram-se numa obrigação. O meu objectivo será, seguramente, lutar por chegar aos 30”.

Mas Bou, que alcançou em Portugal, em 2018, as 100 vitórias em provas do Mundial, tem outra motivação. Já é, nesta fase, mentor de vários jovens pilotos e não tem problemas em abdicar dos seus segredos.

“Não tenho problema algum com isso, pelo contrário. É bom treinar com jovens e, no final das provas, ganha quem tem de ganhar. Se fores o melhor, ganhas. Se não fores, não”.

Apesar de lamentar a falta de mediatismo da modalidade, Toni Bou conseguiu, já em 2020, colocar o trial num plano viral nas redes sociais.

No período de confinamento, devido à covid-19, o piloto espanhol fez um vídeo em que fazia trial… dentro de casa. Usou as escadas e os obstáculos do quarto, da casa de banho, da sala ou da cozinha para mostrar ao mundo que nem uma pandemia limita uma modalidade motorizada como o trial.

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