Ex-director do Museu justifica intenção de levar tapete de Belém com convite ao Presidente da República

Escuta revela que Diogo Gaspar tinha intenção de ir buscar um tapete da Presidência da República para substituir um outro que estava muito danificado na casa dos pais, em Portalegre. Arguido justificou-se com o facto de ter oferecido a sua casa a Marcelo Rebelo de Sousa, no âmbito de uma iniciativa do Chefe de Estado no Alentejo.

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O ex-director do Museu da Presidência Diogo Gaspar, que está a ser julgado, no Campus da Justiça, em Lisboa, pelos crimes de abuso de poder, participação económica em negócio, tráfico de influência, falsificação de documentos, peculato e branqueamento de capitais. ANTÓNIO JOSÉ

O ex-director do Museu da Presidência Diogo Gaspar, que está a ser julgado no Campus da Justiça, em Lisboa, pelos crimes de abuso de poder, participação económica em negócio, tráfico de influência, falsificação de documentos, peculato e branqueamento de capitais, num total de 42 crimes, assumiu que se o Presidente da República, em Abril de 2016, tivesse pernoitado na casa dos seus pais, quando fez uma iniciativa em Portalegre, no Alentejo, teria ido buscar um tapete do Palácio de Belém para substituir um que estava em muito mau estado e também confirmou que emprestou uns móveis da presidência a uma funcionária.

Afirmou-o sem problemas, quando a procuradora do Ministério Público o confrontou com uma escuta de um telefonema com Paulo Duarte, que trabalhava a fazer restauros para a Secretaria-geral da Presidência da República. Nesse telefonema, realizado a sete de Fevereiro de 2016, diz a Paulo Duarte que tem de substituir o tapete, “porque já está farto do outro que está cheio de buracos”. E também refere que vai ao Palácio buscar um.

Mas a procuradora teve dificuldades em aceitar a justificação e o colectivo de juízes também. É que Marcelo Rebelo de Sousa só tomou posse como Presidente da República em Março de 2016 e só veio a efectuar a visita a Portalegre em Abril.

Colocou-se a questão: como é que a sete de Fevereiro já Diogo Gaspar planeava tratar da questão do tapete por causa da visita de Marcelo?

O arguido justificou-se com o facto de se ter cruzado com Marcelo Rebelo de Sousa ainda nas eleições e deste ter dito que, se ganhasse, a primeira iniciativa seria em Portalegre.

Tapete era “só para receber o Presidente em condições" 

“Antecipei-me. As escutas valem o que valem. Acabou por não acontecer. O Presidente da República optou por dormir em Évora e não foi preciso ir buscar o tapete”, disse, sublinhando que era uma intenção, mas que tal não se concretizou. 

Acresce que o arguido disse que não pretendia ficar com o tapete. Depois iria devolver. “Era só para receber o Presidente com condições”, explicou.

A procuradora também quis saber como é que foram parar quatro cadeiras da secretaria-geral da República à casa dos seus pais em Portalegre.

Segundo Diogo Gaspar, no âmbito da visita do Presidente da República a Portalegre, como se realizou um evento na Sé, foi preciso levar alguns bens, entre eles as quatro cadeiras que estavam destinadas a sentar altos dignitários do Estado, tendo depois sido escolhido pelo Protocolo outra solução e as cadeiras acabaram arrumadas na Sé.

Quando terminou o evento, os técnicos que desmontaram o equipamento esqueceram-se das cadeiras.

“O pároco ligou-me e eu fui busca-las e deixei-as na minha casa para que fossem depois trazidas para Lisboa, quando houvesse oportunidade”, explicou, sublinhando que não foi com a intenção de ficar com elas, uma vez que na casa dos seus pais havia dezenas de cadeiras semelhantes e que não precisava de mais.

Perante a resposta, o juiz que preside ao colectivo perguntou: “Então se tinha tantas porque não emprestou das suas ao Presidente? Escusavam de transportar estas de Lisboa para Portalegre. E o senhor, pelo que tem dito aqui, foi sempre tão altruísta a emprestar coisas suas à Presidência”.

 Diogo Gaspar disse que não emprestou, porque não tinha de emprestar. “Emprestei muita coisa e de muito valor”, afirmou.

O arguido foi ainda confrontado com uma factura de 3.628 euros da empresa de Vítor Santos, também arguido no processo, e que a acusação diz fazer parte de um esquema entre os dois para fazer pagar serviços que alegadamente não teriam tido lugar.

Segundo a acusação, entre 1 de Janeiro de 8 de Maio de 2016, Diogo Gaspar, ter-se-á apropriado de um armário (avaliado em 400 euros) e de um banco (avaliado em 40 euros).

Para o MP, na posse destes objectos, o arguido contratou Vítor Santos para retirar os objectos do armazém da Secretaria-geral, localizado na Ajuda, e os entregar no apartamento de Paulo Duarte, que à data estava arrendado por Sílvia Moreira, que vinha de Castelo Branco para trabalhar no Museu.

O MP acredita que, para o pagamento deste transporte, que o arguido Vítor Santos indicou ter o valor de 3.628 euros já com IVA, Diogo Gaspar deu-lhe instruções para que a facturação fosse emitida em nome do Museu, a titulo de serviços de carpintaria prestados ao Museu.

O arguido explica que o valor inclui restauro de bens da Secretaria-geral e que nada tem a ver com o armário e o banco. Aliás, diz que junto à factura está o descritivo dos bens e do trabalho efectuado.

Diz que o filho de Vítor Santos transportou o armário e o banco do armazém para o apartamento de Paulo Duarte e que pagou pelo transporte 60 ou 80 euros.

Segundo Diogo Gaspar o armário e o banco foram emprestados a Sílvia Moreira e que pediu a um dos seus funcionários para elaborar o auto de empréstimo para ser assinado por Sílvia e pelo secretário-geral, mas que o funcionário não terá tratado disso como pediu.

Explicou, como já fez em sessões anteriores, que era hábito existir um espírito de entreajuda entre os funcionários da presidência e que a nova funcionária tinha vindo de longe e que não conhecia ninguém em Lisboa. “Emprestei por uma questão de cortesia para que se sentisse bem recebida”, disse, sublinhando que tem a certeza que se o auto de empréstimo tivesse sido feito que o secretário-geral o autorizava.

Segundo a acusação, entre 2014 e 30 de Junho de 2016, o arguido também teve acesso a quatro espelhos com moldura em talha dourada, com suportes para velas, pertencentes ao Palácio da Cidadela de Cascais e aí armazenados. Cada um devia valer 700 euros e os quatro teriam um valor de cinco mil euros.

Diogo Gaspar negou e disse que os quatro espelhos eram seus e que eram apenas semelhantes a dois que constam do inventário da secretaria-geral.

O juiz decidiu fazer uma consideração e disse:"Isto são peças a mais. Há sempre peças suas e que são apenas parecidas com as da presidência. Uma casa particular não é um Museu”.

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