Partidos e manifestantes do Sudão contra acordo com Israel

Acordo patrocinado pelos EUA tem de ser aprovado por um organismo que ainda não existe.

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Trump ao telefone com líderes de Israel e do Sudão Reuters/CARLOS BARRIA

Manifestantes nas ruas e avisos de repúdio dos partidos: o anúncio de um acordo feito pelo Governo do Sudão para normalizar as relações com Israel levou a rejeição e protestos no país. O acordo foi anunciado pelos EUA, que o patrocinaram e lhe deram grande incentivo, na sexta-feira. 

Perante as críticas, responsáveis indicaram que o acordo não é final: “O acordo para a normalização da relação com Israel vai ser decidido depois de estarem completas as instituições constitucionais quando for formado o conselho legislativo”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros em exercício, Omar Gamareldin. 

Nas ruas, manifestantes diziam “não à paz, não à negociação, não à reconciliação com a entidade ocupante”, usando o subterfúgio para não nomear Israel, como faz quem não reconhece o país. “Não nos vamos render, vamos estar sempre ao lado da Palestina”, entoavam ainda.

Os maiores partidos políticos do Sudão também rejeitaram o acordo, sublinhando que um governo de transição não pode tomar este tipo de decisões. O país já deveria ter a funcionar um conselho legislativo, ou parlamento, mas isso ainda não aconteceu e há quem tema que não chegue a acontecer, diz a Al-Jazeera. Há eleições previstas para 2022.

O Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou no entanto o acordo com o terceiro Estado árabe a normalizar relações com Israel depois dos Emirados Árabes Unidos e do Bahrein. Antes, Trump informou o Congresso de que iria retirar o Sudão da lista de países que promovem terrorismo depois de o país ter transferido 335 milhões de dólares para uma conta para vítimas e famílias de vítimas de ataques da Al-Qaeda nas embaixadas do Quénia e da Tanzânia em 1998.

A divisão no Sudão é grande, com os militares mais entusiasmados com uma aproximação aos Estados Unidos — a retirada da lista permitirá, por exemplo, aceder a empréstimos do FMI que eram até aqui vedados ao país — e os civis menos prontos a qualquer aproximação a Israel.

O analista político Yasir Faiz disse ao diário britânico The Guardian que a decisão “tem de ter um mandato popular do povo do Sudão”, e sublinhou que “ninguém no Sudão sabe o que é que realmente foi acordado”.

Vários dirigentes dos partidos que incluem as Forças para Liberdade e Mudança, o movimento de protesto que levou à queda de Omar al-Bashir, rejeitaram a decisão.

O antigo primeiro-ministro Sadiq al-Mahdi, o último eleito democraticamente e líder do maior partido da coligação, rejeitou a iniciativa dizendo que esta “contradiz a lei nacional sudanesa” e ainda que “irá contribuir para a eliminação do projecto de paz no Médio Oriente e preparará a ignição de uma nova guerra”, cita a emissora do Qatar Al-Jazeera. O partido irá, acrescenta o Guardian, tentará bloquear o acordo através de uma acção legal.

Uma declaração do Partido Popular do Congresso, o segundo maior da aliança, dizia que “o povo, sistematicamente isolado e marginalizado por acordos secretos, não será vinculado a este acordo”. 

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