Morreu José Padilla, o DJ que se confundia com Ibiza

Era um artesão, alguém que gostava simplesmente de partilhar música, mas acabou por transformar-se num dos rostos da ilha da electrónica de dança, da praia e do pôr-do-sol, numa imagem que corre mundo desde os anos 90.

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Ibiza é sinónimo de mar, praias, diversão, música de dança – e José Padilla. Pelo menos durante as décadas de 1990 e 2000 foi assim. Este domingo ficou a saber-se que morreu o veterano DJ de música tranquila, que se confundia com pôr-do-sol e Café del Mar.

Tinha 64 anos e morreu vítima de cancro. O que é curioso, no seu caso, é que se toda a ligação de Ibiza com a cultura global da música de dança, desencadeada a partir dos anos 1990, se fez através de música festiva, com ligações a linguagens como o tecno ou house, a sua música era bem a antítese disso.

O tecno e o house eram a música da predilecção das gentes de todo o mundo, mas sobretudo do Reino Unido, que todos os anos, pelo Verão, invadiam a ilha. Mas essa era a banda sonora nocturna. Nos finais de tarde, quando o sol se punha sobre o mar, imperavam sonoridades serenas, evocadoras e suaves. Foi assim que José Padilla construiu a sua lenda, difundindo o “espírito baleárico.”

Ele, que nasceu em Girona, em 1955, mudou-se para Ibiza em 1976. Quando a ilha era ainda pouco visitada, nos primeiros anos da década de 1990, ficaram famosas as suas sessões no Café del Mar – um espaço sem nada que o distinguisse, que foi ficando afamado por causa de Padilla –, em que tanto cabia música disco espacial dos anos 70 como Ry Cooder, Primal Scream, música ambiental ou psicadelismos vários.

A meio dos anos 1990, José Padilla já era uma figura icónica da ilha, rosto de várias compilações Café del Mar – numa lógica depois seguida por toda uma indústria de antologias semelhantes –, que viajava pelo mundo inteiro na tentativa de reproduzir as sessões de Ibiza. Viria, inclusive, a fazer a sua própria música, com um dos seus álbuns, Navigator (2001), a ser nomeado para um Grammy Latino. De simples amante de música, com vontade de a partilhar, acabou inserido numa lógica comercial em que imperavam designações como chill out, sunsets e outras coisas que tais. Para ele – repetiu-o inúmeras vezes em entrevistas – tratava-se apenas de partilhar a música que venerava.

Via-se a si próprio como um artesão. Mais do que um DJ de técnica minuciosa, era alguém que estava mais interessado em propor uma espécie de viagem sonora cujo momento alto (quando punha música no Café del Mar) acontecia quando o sol se punha no horizonte, com centenas de pessoas cá fora, imersas em sonoridades distendidas e atmosféricas. Como acontece tantas vezes com os pioneiros, e apesar de toda a lógica mercantil que se apoderou do conceito por ele trabalhado ao longo dos anos, parece ter morrido com dificuldades financeiras.

Em Julho passado, quando tornou público que lhe havia sido diagnosticado cancro, comunicou que estava a passar por dificuldades depois de cinco meses sem rendimentos devido ao cancelamento de diversos eventos forçado pela pandemia, solicitando então doações a amigos e admiradores para enfrentar a doença. Nas últimas horas têm-se sucedido as evocações à sua arte e uma frase predomina: “O pôr-do-sol em Ibiza nunca mais será o mesmo.”

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