Descoberta em Portugal nova bactéria que pode adoecer as nogueiras

Uma nova bactéria do género Xanthomonas foi identificada em Portugal: é a Xanthomonas euroxanthea.

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Folha com a bactéria Xanthomonas euroxanthea DR

Uma nova espécie de bactéria que pode fazer com que as nogueiras adoeçam foi identificada em Portugal. A descoberta foi feita no âmbito da Acção da Cooperação Científica e Tecnológica Internacional EuroXant e os resultados foram publicados na revista científica International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology.

As nogueiras têm uma grande importância comercial a nível da produção de madeira e de nozes. Actualmente, a base de dados da Organização Europeia e Mediterrânica para a Protecção das Plantas (EPPO, na sigla em inglês) indica que a bactéria Xanthomonas arboricola pv. Juglandis é uma das grandes causadoras de bacteriose da nogueira e que afecta a produção e qualidade de nozes. Essa bactéria provoca a queda prematura de frutos e manchas necróticas nas folhas e frutos.

Agora, uma nova bactéria do género Xanthomonas foi identificada em Portugal, a Xanthomonas euroxanthea. O nome está ligado ao próprio nome do projecto Acção da Cooperação Científica e Tecnológica Internacional EuroXant, que reúne cientistas de vários países para se encontrem soluções para a gestão integrada de doenças das plantas na Europa. Além de se ter encontrado a bactéria numa nogueira-comum (Juglas regia) – e é isso que está descrito no artigo científico –, outras análises já permitiram verificar que está também presente na nogueira-pecã. A equipa não descarta que possa vir a ser detectada noutros hospedeiros, mas para isso são necessários mais estudos. 

“Este género inclui principalmente espécies que causam doença em plantas (fitopatogénicas), incluindo plantas de interesse económico, como é o caso das nogueiras”, explica ao PÚBLICO Leonor Martins, primeira autora do artigo, que no seu doutoramento no Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (Cibio-InBio), da Universidade do Porto, está a estudar bactérias deste género.

Para se chegar a esta descoberta, foram isoladas bactérias de nogueiras de várias regiões do país. Na altura, o objectivo era estudar a diversidade da Xanthomonas arboricola pv. Juglandis em várias regiões climáticas de Portugal. Esse levantamento foi feito por Camila Fernandes, no âmbito do seu doutoramento na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, e em colaboração com o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV).

Depois, ao se sequenciar o genoma de várias bactérias isoladas e de se fazerem estudos bioquímicos e de patogenicidade, concluiu-se então que se estava perante uma nova espécie. Leonor Martins indica que a sequenciação de genomas e bioensaios de patogenicidade no laboratório da sua equipa revelaram que esta espécie de bactéria tem estirpes patogénicas e não patogénicas, ou seja, que causam doença e não causam. “Ao causar doença poderá levar à queda prematura dos frutos e/ou à necrose da noz”, nota.

“Esta é a primeira vez que se observa estirpes patogénicas e não patogénicas de uma mesma espécie de Xanthomonas a colonizar a mesma planta [a descoberta foi feita numa nogueira]”, acrescenta a investigadora num comunicado da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. A equipa viu ainda que as duas estirpes da nova espécie são muito semelhantes, mas que diferem na sua capacidade de infectar a nogueira – essa diferença pode ser útil na identificação de novos genes envolvidos nesta doença.

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Folha com bacteriose da nogueira devido à bactéria Xanthomonas arboricola pv. Juglandis DR

Ainda há muito a saber sobre esta bactéria. Não se sabe se já existe há muito tempo ou se é relativamente recente, bem como também não se sabe se está só em Portugal ou noutros países. “É obviamente um risco para a nogueira, mas provavelmente não será nada comparável a uma Xylella [género da bactéria Xylella fastidiosa]”, nota a bacteriologista Joana Vicente, cientista da Universidade de Warwick (no Reino Unido), que não assinou o artigo, mas é gestora da comunicação científica da Acção da Cooperação Científica e Tecnológica Internacional EuroXant e acompanhou este estudo.

“Penso que ainda não sabemos o suficiente para ter ideia dos danos que esta bactéria está a causar ou poderá vir a causar num futuro próximo”, acrescenta. “No caso da Xylella, estamos a enfrentar uma situação muito complicada, mas no caso desta doença da nogueira ainda não se sabe e, por enquanto, não há motivo para pensar que possa ser algo tão grave como a Xylella. A continuação destes estudos poderá dar-nos mais respostas.”

De imediato, Leonor Martins diz que é crucial divulgar à comunidade este novo agente patogénico de plantas. Como esta espécie de bactéria tem estirpes patogénicas e não patogénicas, a descoberta também é importante para se disponibilizar um modelo biológico para que perceber porque é que determinadas bactérias provocam surtos nas nogueiras. “Estes resultados são bastante promissores, pois a comunidade científica dispõe agora de um modelo favorável para o estudo da emergência e evolução da patogenicidade, assim como da co-evolução de bactérias que têm como habitat a nogueira”, frisa Camila Fernandes no comunicado.

Quanto aos próximos passos, Fernando Tavares (coordenador do estudo, professor na Faculdade de Ciência da Universidade do Porto e investigador no Cibio-InBio) adianta num comunicado internacional: “O próximo passo será estudar genes essenciais envolvidos na patogenicidade e virulência nesta nova espécie com o objectivo de desenvolver marcadores para a detecção de estirpes patogénicas através de rastreios fitossanitários, de forma a delinear planos de controlo epidemiológicos eficazes.” Neste estudo, estiveram ainda envolvidos cientistas da Alemanha e da Suíça.

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