Ainda sem a nova juíza de Trump, Supremo dos EUA alarga prazo da votação na Pensilvânia

John G. Roberts, o juiz-presidente nomeado por George W. Bush, juntou-se à ala progressista numa decisão que pode favorecer o Partido Democrata. Entrada de Amy Coney Barrett, na próxima semana, vai reforçar o peso da ala conservadora.

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Alguns boletins de voto na Pensilvânia vão poder ser contados até três dias depois de 3 de Novembro Reuters/BRIAN SNYDER

O Supremo Tribunal dos Estados Unidos decidiu que o estado da Pensilvânia vai ter de contar alguns boletins de voto que cheguem aos sítios oficiais até três dias depois do prazo legal, na noite de 3 de Novembro. A decisão vem reforçar a ideia de que o nome do próximo Presidente dos EUA pode não ser conhecido na noite eleitoral, e dá pistas sobre a importância da entrada da juíza conservadora Amy Coney Barrett no Supremo, que deverá ser confirmada já na próxima semana.

Ainda a funcionar apenas com oito juízes – enquanto se aguarda pela substituição da juíza Ruth Bader Ginsburg, que morreu em Setembro –, o Supremo Tribunal dos EUA manteve em vigor uma decisão anunciada há um mês pelo Supremo da Pensilvânia e que foi contestada Partido Republicano local.

Com quatro votos a favor e quatro contra, o empate no Supremo dos EUA teve o efeito de validar a decisão do Supremo da Pensilvânia, que alargou o prazo de recepção dos boletins de votos no estado até ao dia 6 de Novembro por causa pandemia e dos atrasos nos correios.

Mas nem todos os votos recebidos depois de 3 de Novembro podem ser contados – serão aceites os que tiverem sinais claros de que foram enviados até ao dia 3 de Novembro (carimbos dos correios nos envelopes, por exemplo) e os que, não tendo esses sinais, não tenham também indicações claras de que foram enviados após essa data.

A nova Florida?

A decisão do Supremo dos EUA é uma boa notícia para o Partido Democrata, que acusa o Partido Republicano de tentar suprimir o voto na Pensilvânia e em outros estados decisivos para as eleições onde os republicanos estão em maioria no poder legislativo.

À partida, esta decisão pode beneficiar Joe Biden de duas formas.

Por um lado, os eleitores do Partido Democrata estão a recorrer mais ao voto por correspondência do que os eleitores do Partido Republicano, e é provável que depois do dia 3 de Novembro haja mais votos em Biden por contar do que em Trump.

Isto acontece porque a pandemia foi transformada num símbolo das divisões entre os dois eleitorados – os democratas tendem a ter mais cautelas e a manterem-se o mais longe possível das filas nas secções de voto, e os republicanos preparam-se para surgir em maior número no dia das eleições para demonstrarem que estão menos receosos das consequências da pandemia.

Por outro lado, é possível que a Pensilvânia venha a ter uma importância nas eleições deste ano semelhante à que a Florida teve nas eleições do ano 2000, quando o Supremo Tribunal dos EUA decidiu travar as recontagens no estado e, dessa forma, validar a eleição do candidato do Partido Republicano, George W. Bush.

A Pensilvânia está na lista dos estados que Biden poderá ter de vencer se quiser impedir a reeleição de Trump, e qualquer decisão que abra a porta a uma maior participação do eleitorado será bem-vinda no Partido Democrata.

Em 2016, Trump teve apenas mais 44 mil votos do que Hillary Clinton na Pensilvânia, e este ano Joe Biden vai à frente nas sondagens. Só que o aumento do número de votos por correspondência pode também resultar num maior número de votos anulados (por assinaturas ilegíveis e outros problemas), o que pode, por sua vez, apagar qualquer vantagem que as sondagens estejam a dar a Joe Biden.

No lado do Partido Republicano, a decisão do Supremo da Pensilvânia era vista como “um convite para que os eleitores votem depois do dia das eleições”.

“Num ano em que existe uma possibilidade muito real de que o resultado final das eleições fique dependente da Pensilvânia, as novas regras impostas pelo Supremo Tribunal da Pensilvânia (um órgão eleito em eleições partidárias) podem destruir a confiança do público no conjunto do sistema eleitoral”, dizia a queixa do Partido Republicano da Pensilvânia enviada para o Supremo dos EUA.

Antes e depois de Barrett

A decisão levanta também o véu daquilo que pode vir a acontecer no caso de o resultado das eleições presidenciais ser contestado – uma hipótese que o Presidente Donald Trump nunca descartou, com base em acusações infundadas de fraude generalizada por parte do Partido Democrata.

Os quatro juízes da ala conservadora do Supremo dos EUA, incluindo dois nomeados pelo Presidente Trump (Clarence Thomas, Samuel Alito, Neil Gorsuch e Brett Kavanaugh), votaram contra a decisão do Supremo da Pensilvânia; e os três juízes da ala progressista (Stephen Breyer, Sonia Sotomayor e Elena Kagan) votaram a favor. O voto decisivo para o resultado final partiu do juiz-presidente, John G. Roberts, um conservador que tem alinhado com os progressistas noutras votações.

Mas a importância do voto de Roberts para os progressistas pode diluir-se com a nomeação da juíza Amy Coney Barrett para o Supremo Tribunal, que a maioria do Partido Republicano no Senado deverá confirmar na próxima semana.

Barrett, que é uma juíza ainda mais conservadora do que os outros dois juízes nomeados pelo Presidente Trump, podia ter desequilibrado a votação para 5-4 e impedido a contagem dos votos na Pensilvânia por mais três dias.

Nas próximas semanas, já com a juíza Barrett no Supremo a reforçar a maioria conservadora para 6-3, o tribunal terá de decidir sobre um caso que pode ditar o fim da reforma do acesso aos seguros de saúde aprovada durante a Administração Obama – o Affordable Care Act, também conhecido como Obamacare. E poderá ser chamado a decidir sobre uma possível contestação dos resultados eleitorais – na Pensilvânia ou noutro estado qualquer que seja decisivo para o resultado final.

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