Uns pingos de decência e a direita perde a cabeça

O grande problema da direita reside no facto de temer que os serviços públicos cheguem a funcionar moderna e eficientemente. Basta à direita uns pingos de modernidade no OGE para se agitar à outrance.

No debate que tem vindo a ocupar o espaço público em torno das prioridades quer orçamentais, quer da futura aplicação dos fundos provenientes da União Europeia, é interessante dar conta da abordagem da direita acerca destas prioridades.

A direita tradicional invoca a proteção em abstrato da família como legado cristão, mais da Igreja católica que das outras fés cristãs, particularmente importante como a protestante do Centro/Norte da Europa. Como se sabe no tempo de Jesus Cristo não havia empresas, a imensa maioria do povo judeu sob ocupação romana era constituída por agricultores, pescadores e artesãos. Conhecendo-se bem a predileção de Cristo pelos pobres é curioso observar que este mundo está no essencial determinado pelo mundo da finança, dos super-ricos e sacerdotes desse ofício ou simples seguidores dos caminhos do ouro.

Neste contexto global nunca é demais ter consciência que em cada crise que tem surgido nas últimas décadas os ricos têm ficado mais ricos e os pobres mais pobres. Em Portugal no final de 2016 havia 2.399.000 portugueses em risco de pobreza segundo os dados do INE. Apesar de alguma recuperação com o governo de António Costa, apoiado nos partidos da esquerda, a pandemia empurrou os números em mais algumas centenas de milhares.

2153 bilionários detêm mais riqueza que 60% de toda a população mundial, segundo a ONG- Oxfam, antes da pandemia.

Na discussão do OGE o que pretendem o CDS, JL e o próprio PSD? Face às mais que tímidas medidas viradas para a proteção social do Estado (muito insuficientes para acudir à população) desencadeiam uma guerra mediática contra o investimento público (irrisório) e contra o apoio às famílias, exigindo maior apoio às empresas, como se as pessoas existissem em função das empresas e não as empresas para servirem as pessoas. A empresa foi uma extraordinária invenção para servir os seres humanos. Entretanto, o presidente do CDS chega ao cúmulo de atacar as famílias por receberem subsídios em vez das empresas, criticando, ao mesmo tempo, o governo por deixar as famílias ao abandono. Círculo quadrado. Isto é, o líder o CDS entende que o apoio às famílias deve ser dado às empresas para que os donos delas utilizem os dinheiros ao seu serviço, o qual não é necessariamente do interesse das famílias, entretanto abandonadas. Aliás, como se o apoio a umas fosse incompatível como apoio a outras.

Para quem agita a família como sendo um dos valores dos centristas, bem direitistas, sempre se há de concordar que se trata de algo a roçar o domínio da hipocrisia.

As despesas no SNS, na escola pública, na função pública, na Justiça são absolutamente essenciais para proteger a saúde, a educação, o acesso a serviços públicos e à justiça. A direita rejeita-as porque os quer abocanhar para deles tirar o lucro, exigindo depois subvenção ao Estado para os pôr a funcionar no mínimo. Os serviços excelentes são para os da estirpe dos donos disto tudo.

O grande problema da direita reside no facto de temer que os serviços públicos cheguem a funcionar moderna e eficientemente. Basta à direita uns pingos de modernidade no OGE para se agitar à outrance. Se houvesse coragem não seriam apenas pingos para refrescar, mas serviços de qualidade como por exemplo na Alemanha.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico   

    

   

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