Contrato com a Câmara de Guimarães deixa presidente de junta com mandato em risco

O contrato de requalificação de um pavilhão, entre a autarquia vimaranense e a empresa Terraplanagens Falcão, de Bruno Oliveira, um dos presidentes de junta do concelho, foi celebrado em 5 de Março, o mesmo dia do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo que impede esses acordos. Há risco de perda de mandato na junta.

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O mandato de Bruno Oliveira à frente da União de Freguesias de Vila Nova de Sande e de São Clemente de Sande, na zona noroeste do concelho de Guimarães, pode estar em risco. O presidente dessa união é também o proprietário da empresa Terraplanagens Falcão, que, neste ano, celebrou um contrato com a Câmara Municipal para obras de reparação e de manutenção da cobertura no pavilhão do INATEL, localizado junto ao Estádio D. Afonso Henriques e tutelado pelo município, no valor de 86.384 euros.

A minuta do contrato foi aprovada em 17 de Fevereiro, num despacho emitido pela câmara, disponível no portal de contratação pública Base, mas o documento propriamente dito só foi assinado em 5 de Março. Esse foi precisamente o dia em que o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), datado de 12 de Dezembro de 2019, a proibir contratos entre empresas de presidentes de juntas e câmaras municipais, foi publicado em Diário da República. “O sócio e único gerente de uma sociedade empreiteira que seja, simultaneamente, presidente de uma junta de freguesia e, por inerência, membro da assembleia do respectivo município, está impedido de celebrar contrato de empreitada entre essa sociedade e este município”, refere a decisão do STA.

Presidente da junta de Vila Nova de Sande desde 2009 e da união de freguesias desde 2013, sempre pelo PS, Bruno Oliveira celebrou um contrato que é “causa de perda de mandato”, por o ter colocado numa “situação que o tornou inelegível, não estando essa sanção dependente da maneira como o mandato é concretamente exercido”, lê-se ainda no acórdão.

Contactado pelo PÚBLICO, o autarca diz que o contrato foi celebrado em 5 de Março por “pura coincidência” e considera injusto ver “posto em causa” o seu trabalho, quer como presidente da junta, quer como empresário, já que, no caso do pavilhão do INATEL, venceu o concurso devido ao preço que apresentou. “Encarei este contrato como outro qualquer. Fui convidado a dar preço para uma obra. Tive o melhor preço para a obra e fui convidado a assinar o contrato”, disse. O portal Base mostra que os concorrentes para a obra foram as empresas Novais de Carvalho, Sublimar e Naturance, todas sediadas em Guimarães.

Bruno Oliveira prometeu ainda deixar a política, caso se efective a perda de mandato. “Ando na política porque a minha freguesia é uma causa. Se não me deixarem trabalhar na minha freguesia, saio da política”, reiterou.

O contrato em causa foi discutido na reunião da Câmara Municipal de Guimarães, decorrida na segunda-feira. Hugo Ribeiro, um dos vereadores da oposição, formada exclusivamente pelo PSD, recordou que a “incompatibilidade” associada à Terraplanagens Falcão já tinha sido discutida no executivo e pediu ao presidente da Câmara para garantir o “estrito cumprimento da lei”. O socialista Domingos Bragança, que lidera a Câmara desde 2013, disse somente que a situação vai ser avaliada como “matéria jurídica”.

Mais de 1,3 milhões em obras públicas

A Terraplanagens Falcão, adiantou ao PÚBLICO Bruno Oliveira, existe há cerca de 20 anos e começou a realizar obras públicas em 2009. Desde então, facturou 1,34 milhões de euros em 35 contratos celebrados com entidades públicas – 34 destinados a intervenções no concelho de Guimarães e uma no de Vizela. Até 2014, a empresa trabalhou sobretudo para a Vimágua, empresa intermunicipal de água e saneamento, e facturou pouco mais de 228 mil euros. Já as obras dos últimos seis anos abrangeram pavimentação de ruas e intervenções em passeios e escolas, tendo como clientes a câmara de Guimarães (678 mil euros) e quatro freguesias do concelho – Nespereira, S. Martinho de Candoso, Aldão e Infantas.

Bruno Oliveira adiantou ao PÚBLICO que a empresa se tem mantido “pequena”, com 18 trabalhadores, precisamente “para não ter de sair do concelho”. A empresa obtém “95% da facturação em Guimarães”, mas a câmara está longe de ser a principal cliente, alegou. “No ano passado, a minha empresa facturou entre 1,3 e 1,4 milhões de euros. No ano passado, as obras para a Câmara valeram cerca de 10% da facturação”, disse.

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