Governo alivia ISV de carros usados da UE mas corta menos na parte ambiental

Proposta do Orçamento do Estado para 2021 corrige cálculo que tem levado o Estado a perder processos em tribunal, mas mantém diferenças entre componente de cilindrada e ambiental.

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Nelson Garrido

O Governo vai mexer no código do Imposto Sobre Veículos (ISV), cedendo a Bruxelas, que exigia mudanças, e aos tribunais portugueses, que têm condenado o Estado a devolver com juros parte do ISV a contribuintes que matricularam em Portugal carros importados como usados. O imposto vai assim descer, mas a tabela de depreciação tem valores diferentes para as duas componentes do ISV. Já as taxas, tanto do ISV como do Imposto Único de Circulação (IUC), mantêm-se inalteradas.

Segundo a proposta do Orçamento do Estado (OE) para 2021, entregue no Parlamento nesta segunda-feira, a Autoridade Tributária passa a ser obrigada a desvalorizar a componente de cilindrada e a ambiental, ao contrário do que sucede agora, em que só desvaloriza a primeira, em função da idade do veículo.

Isso significa que o ISV dos carros em segunda mão, com primeira matrícula na União Europeia (UE), e importados para Portugal, deixam de pagar componente ambiental como se fossem novos, mas a mudança que o Governo pretende fazer pode ser insuficiente para evitar mais condenações em Portugal ou pôr fim ao processo que a Comissão Europeia instaurou contra o Estado português no Tribunal de Justiça da UE.

Isto porque a tabela de desvalorização prevê taxas diferentes para as componentes de cilindrada e ambiental. O mesmo é dizer que, quando o fisco proceder à liquidação do referido imposto, no momento em que o carro for registado em Portugal, entenderá que o carro vale menos, devido à idade que tem, mas só na componente de cilindrada. Na componente ambiental, o desconto é feito a taxas menores, porque o critério, diz o Governo, é o tempo de vida útil que ainda resta ao veículo.

Sem incentivo ao abate, IUC mantém adicional

Na área da fiscalidade automóvel, a redução do ISV para carros importados era um dos temas que mais expectativas criavam, dado que o Governo continuava a litigar nos tribunais contra todas as derrotas e recusava-se a cumprir o entendimento de Bruxelas, que considera que a fórmula ainda em vigor viola o artigo 110.º do Tratado de Funcionamento da UE, porque discrimina produtos (carros, neste caso) vindos de outros países.

Em 2019, com algumas derrotas já em tribunal e com Bruxelas a pressionar Lisboa, o Governo recusou-se a fazer esta mudança na proposta de OE 2020. E uma alteração requerida pelo CDS/PP, durante a discussão do orçamento no parlamento, acabou por ser chumbada.

Na proposta, o artigo 11.º do código do ISV, que estabelece as taxas para veículos usados, passa a determinar que o imposto de carros com primeira matrícula noutro país membro da UE passa a beneficiar de “percentagens de redução previstas na tabela D (...), tendo em conta a componente cilindrada e ambiental”.

A proposta de OE 2021 mantém o agravamento de 500 euros para carros com motor a gasóleo, mas ao alargar a redução do ISV à componente ambiental, o Governo recua face às 13 derrotas já averbadas contra contribuintes e também face a Bruxelas.

Mas quando depois se consulta a referida tabela D, percebe-se que a idade do veículo só conta na cilindrada. No relatório que acompanha a proposta de OE, o Governo explica que a componente ambiental, “ao contrário do que sucede com a componente cilindrada, não estará associado à desvalorização comercial média dos veículos, mas antes à sua vida útil média remanescente (medida por referência à idade média dos veículos enviados para abate), por se entender que mesma é uma boa métrica do horizonte temporal de poluição do veículo, assegurando-se, deste modo, que os carros poluentes serão justamente tributados à entrada em Portugal”.

No resto da fiscalidade automóvel, não há mudanças, mantendo-se as taxas actuais e o adicional ao IUC para carros a gasóleo. Em 2019, o aumento foi pelo valor da inflação. Antes da proposta final de OE 2021, não se sabe que opção tomará o Governo para o próximo ano.

E, para uma certa desilusão da indústria automóvel, ficou de fora um programa de incentivo ao abate de veículos em fim de vida, uma hipótese admitida como viável pelos ministérios do Ambiente e o da Economia, mas que acabou por ser abandonada na recta final das conversações entre as Finanças e restantes interlocutores.

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