Empresas controladas em offshores continuarão excluídas de apoios em 2021

Proposta do Orçamento do Estado não inclui “excepções” recomendadas por Bruxelas para que as empresas com actividade real em determinados territórios não sejam excluídas.

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Miguel Feraso Cabral

As empresas sediadas em Portugal que tenham como accionista maioritário uma empresa, um trust ou outra entidade sediada num paraíso fiscal vão continuar a estar excluídas das medidas excepcionais de resposta à pandemia em 2021, como as linhas de crédito ou o sucedâneo do layoff simplificado.

A restrição já se aplica este ano e deverá manter-se no próximo, segundo a proposta de Orçamento do Estado para 2021.

A iniciativa vai ao encontro das recomendações feitas em Julho pela Comissão Europeia, embora em moldes distintos dos sugeridos. Enquanto Bruxelas recomendou que os países aplicassem essas restrições às empresas com ligações aos países que estão na lista europeia dos paraísos fiscais (jurisdições não cooperantes para efeitos fiscais), actualmente com 12 jurisdições, o Governo português aplica as restrições às empresas controladas a partir dos territórios considerados pelo Estado português como paraísos fiscais, uma lista mais vasta que elenca cerca de 80 territórios.

A proposta orçamental prevê deixar de fora dos apoios as entidades “com sede ou direcção efectiva em países, territórios ou regiões com regime fiscal claramente mais favorável” da lista do Ministério das Finanças. E ainda as empresas “que sejam dominadas” — que sejam detidas na maioria do seu capital, de forma directa ou indirectamente — por “entidades, incluindo estruturas fiduciárias de qualquer natureza [trusts], que tenham sede ou direcção efectiva” nos territórios da tal lista portuguesa” ou “cujo beneficiário efectivo tenha domicílio” num dessas jurisdições.

O Governo começou por estar reticente em relação à criação deste tipo de medidas defensivas, mas acabou por recuar, caminhando no sentido para o qual iam as recomendações europeias. Primeiro, quando o PÚBLICO enviou perguntas ao ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira, sobre o assunto, o Ministério alegou que, fazê-lo naquele momento, iria colocar “constrangimentos” às empresas que exercem “a sua actividade económica em Portugal e empregam trabalhadores no território nacional” e justificou a ausência inicial com a necessidade de acautelar a protecção social dos trabalhadores e a recuperação das empresas a operar em todo o território nacional”.

Entretanto, depois de negociações entre o PS e o BE, o Parlamento avançou com as restrições, e poucas semanas depois a Comissão Europeia pedia aos governos para que avançassem com este tipo de medidas, para evitar que os fundos públicos sejam utilizados “para fins de fraude, evasão e elisão fiscais, para o branqueamento de capitais ou para financiar o terrorismo” por empresas localizadas em territórios que rejeitam princípios de transparência e de troca de informações.

Salvaguarda à actividade “genuína”

Bruxelas também recomendou “excepções”, para que, em “determinadas circunstâncias”, as empresas que estejam presentes num paraíso fiscal a exercer uma actividade económica real possam aceder a um apoio financeiro (para salvaguardar as empresas que não são de fachada ou as distinguir das que estão num paraíso fiscal apenas para tirar partido fiscal dessa escolha). E sugeria que, para tal, os governos introduzissem “sanções adequadas para dissuadir os requerentes de fornecerem informações falsas ou inexactas”.

Apesar desta recomendação, a proposta do Governo não inclui essa salvaguarda. A Comissão Europeia aconselhava os países a definirem regras para o caso, por exemplo, “de uma empresa que possa provar que pagou impostos adequados no Estado-Membro durante um determinado período (por exemplo, os últimos três anos) ou que tenha uma presença económica genuína no país constante da lista [europeia]”.

Bruxelas também sugeriu excluir as empresas condenadas por crimes financeiros graves, (como fraude financeira, corrupção, não cumprimento de obrigações fiscais e de Segurança Social — estas últimas relativas ao fisco e regime contributivo já estão previstas em Portugal).

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