Coreia do Norte: uma parada militar, um novo míssil e zero casos de covid-19

Kim Jong-un insistiu na vitória do regime sobre o vírus, durante uma celebração nocturna do 75.º aniversário do Partido dos Trabalhadores, onde foram exibidas novas armas balísticas, incluindo um míssil intercontinental.

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Paradas militares durante a noite não são comuns da Coreia do Norte e dificultam avaliação do seu arsenal EPA/JEON HEON-KYUN
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Há rumores de que as imagens passadas na televisão estatal não foram gravadas este sábado EPA/JEON HEON-KYUN
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Televisão estatal norte-coreana revelou imagens da parada EPA/JEON HEON-KYUN

Kim Jong-un assegurou que não há qualquer caso positivo de covid-19 na Coreia do Norte e reforçou essa informação com a garantia de que a pandemia só pode ser combatida com socialismo. O Líder Supremo do regime norte-coreano discursou durante uma parada militar, que marcou o 75.º aniversário da fundação do Partido dos Trabalhadores, supostamente realizada este sábado, antes de o sol nascer, e na qual foi exibido um novo e volumoso míssil balístico intercontinental.

Depois de a vizinha Coreia do Sul ter dado conta da organização de uma “parada militar massiva” durante a madrugada, na Praça Kim Il Sung, no centro de Pyongygang – a primeira desde 2018 –, a televisão estatal norte-coreana divulgou algumas imagens do evento, onde se vê Kim a falar aos militares alinhados na praça.

Ainda assim, há rumores de que as imagens são editadas e que a parada ou o discurso de Kim terão sido gravados noutra data e não durante este sábado.

Segundo a Reuters e a agência sul-coreana Yonhap, o líder da Coreia do Norte agradeceu ao Exército pelos esforços na contenção da covid-19 e na resposta às cheias e tufões dos últimos meses e desejou uma rápida recuperação à Coreia do Sul, manifestando a esperança de que, quando a crise terminar, os dois vizinhos possam “voltar a dar as mãos”.

Apesar de a Coreia do Norte fazer fronteira e ser aliada da China – onde o vírus SARS-CoV-2 foi identificado pela primeira vez e a partir de onde se propagou para o resto do mundo –, Kim voltou a insistir que o país “travou a invasão do vírus maligno” e que “nem uma pessoa” foi infectada.

O regime não permite qualquer escrutínio sobre o que se passa dentro das fronteiras da Coreia do Norte, uma realidade que, tanto dificulta a avaliação do seu verdadeiro poderio nuclear e militar, como o levantamento da real situação socioeconómica fora da capital, ou as estimativas sobre o potencial número de infectados pelo novo coronavírus.

Em Julho, a Coreia do Norte revelou que tinha apenas “um caso suspeito de infecção”. Ainda assim, sabe-se que Kim impôs quarentenas, decretou medidas de distanciamento social e canalizou remessas urgentes, de alimentos e medicação, para algumas zonas do país, como a cidade fronteiriça de Kaesong

De acordo com as informações recolhidas pela Organização Mundial de Saúde, as fronteiras da Coreia do Norte estão fechadas, o uso de máscara protectora é obrigatório em espaços públicos e as escolas chegaram a estar encerradas.

Os Estados vizinhos e os observadores internacionais não acreditam, por isso, que a situação sanitária seja como o regime descreve. Não só pelo passado de ocultação de surtos e epidemias, mas pelas características da sua relação com a China. Os países partilham uma fronteira longa e permeável e os chineses são os principais parceiros comerciais dos norte-coreanos.

Um novo míssil no escuro

Os encontros mediáticos entre Kim Jong-un e o Presidente norte-americano, Donald Trump, não motivaram uma maior vontade de Pyongyang para desnuclearizar o seu arsenal militar ou, pelo menos, ser mais transparente em relação aos ensaios balísticos que continua a realizar, pese embora as sanções internacionais que lhe foram impostas.

Nesse sentido, o 75.º aniversário do partido único era entendido pela Coreia do Sul e pelos Estados Unidos como uma oportunidade para se perceber que tipo de armamento o regime norte-coreano tinha para apresentar – até porque Kim revelou, no início do ano, que possuía uma “nova arma estratégica”.

O facto de o evento se ter realizado à noite e de não terem sido convidados quaisquer representantes diplomáticos dos aliados da Coreia do Norte, dificultou, no entanto, o trabalho de monitorização levado a cabo pelo Exército sul-coreano e seus aliados, que estranharam o secretismo de toda a operação.

Ainda assim, segundo foi possível perceber pelas imagens transmitidas pela Coreia do Norte, o regime exibiu um novo míssil balístico intercontinental (ICBM, na sigla inglesa), que, por ser mais comprido e volumoso, arriscou um funcionário militar sul-coreano em declarações à Yonhap, “aparenta ser uma versão melhorada do Hwasong-15”.

Resta saber se este ICBM tem capacidade para carregar ogivas nucleares e, nesse caso, perceber que distância consegue percorrer. Os responsáveis norte-coreanos garantem que o Hwasong-15 tem capacidade para atingir Washington D.C., capital dos EUA.

“É preciso uma análise mais aprofundada para conhecermos melhor a capacidade exacta do novo ICBM”, disse o funcionário à agência noticiosa sul-coreana.

Para além do ICBM, também foram dados a conhecer um novo míssil adaptável a veículos submarinos e uma versão norte-coreana do Iskander, um projéctil balístico russo de curto alcance.

As Forças Armadas da Coreia do Sul informaram ainda que, tirando o ajuntamento de tropas e veículos de guerra em Pyongyang, “não foram detectadas movimentações militares invulgares” na Coreia do Norte.

Autocrítica de Kim

Kim Jong-un não fez qualquer referência aos EUA no seu discurso, mas garantiu que o regime vai “continuar a investir no seu poder de defesa nacional e na sua autodefesa dissuasora de guerra”.

E, num momento raro de autocrítica, o líder da Coreia do Norte pediu desculpa à população pelo agravar dos problemas económicos do país nos últimos meses.

“Sinto-me envergonhado por não ter conseguido retribuir devidamente a vossa enorme confiança. Os meus esforços e devoção não foram suficientes para livrar o nosso povo de situações difíceis de subsistência”, afirmou Kim, citado pela Reuters.

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