Trinta anos após a reunificação, o desafio de uma Europa unida

Nós, alemães, sabemos como é difícil juntar o que esteve separado. Mas sabemos também que vale a pena. É por isso que defendemos a unidade europeia com a mesma paixão com que lutámos pela unificação alemã há 30 anos.

“Agora pode convergir o que foi feito para estar junto.” Todas as pessoas na Alemanha conhecem esta frase de Willy Brandt. Ainda hoje achamos evidente que se refere à reunificação, há 30 anos, das duas partes do nosso país separadas por muros e arame farpado. Mas se olharmos com atenção, não é de todo óbvio que Willy Brandt estivesse só a pensar na Alemanha. Pois logo no dia a seguir à queda do Muro, Brandt falou de “algo grande (...) que as partes da Europa voltem a convergir”.

A unidade alemã e a unificação europeia permanecem indissociavelmente ligadas. Centenas de milhares de pessoas manifestaram-se em nome da sua liberdade em Leipzig, Berlim, Dresden e muitos outros locais da Alemanha de Leste. Mas também por toda a Europa Central e de Leste foram numerosos os homens e mulheres que saíram à rua e derrubaram muros e arame farpado com a sua sede de liberdade. Nunca nos esqueceremos disso. E sem a confiança que os nossos parceiros europeus, os EUA e os dirigentes de então da União Soviética depositaram numa Alemanha pacífica e europeia, a reunificação não teria sido possível politicamente. E, assim, a nossa gratidão pela reunificação alemã está sempre indissociavelmente ligada à firme convicção de que o futuro da Alemanha apenas pode residir numa Europa verdadeiramente unida. Esta é a única resposta definitiva à “questão alemã” que tão frequente e dolorosamente ocupou a Europa no século passado.

“Mais Europa” nunca foi o preço que nós alemães tivemos de pagar pela reunificação, mas sim, pelo contrário, uma conquista histórica suplementar. Por isso, faz todo o sentido que integremos a “realização de uma Europa unida” no mesmo artigo da nossa Constituição que conteve, em tempos, o desejo de uma Alemanha reunificada.

Todos conhecemos os acontecimentos que marcaram o caminho europeu desde então: a criação da União Europeia através do Tratado de Maastricht, a União Económica e Monetária, o actual Tratado de Lisboa e, acima de tudo, a adesão dos países da Europa Central e de Leste, cujo desejo de liberdade e determinação se tornaram no impulso decisivo para mais uma unificação europeia – não só como um mercado interno maior, mas também como uma comunidade de valores.

30 anos após a reunificação, os desafios são outros: a crise do coronavírus não é apenas mais uma crise que se veio juntar às crises como a ascensão dos nacionalistas de direita e dos populistas, a rivalidade crescente entre os EUA e a China ou o perigo que a desinformação representa para as nossas democracias. Esta pandemia reforça e exacerba as outras crises. Temos de encontrar uma resposta verdadeiramente europeia para ela – tal como fizemos há 30 anos. E esta resposta é a mesma com que se respondeu à reunificação do nosso continente: a Europa precisa de solidariedade interna para conseguir defender soberanamente os seus valores e interesses no exterior. A solidariedade e a soberania são duas faces da mesma medalha.

Nos meses passados, mostrámos que a Europa é capaz de agir solidariamente no seu interior, mais recentemente com o acordo sobre um pacote de medidas de ajuda sem precedentes, pelo qual todos respondemos.

E queremos ir ainda mais longe durante e após a nossa presidência do Conselho da UE: fortalecer a Europa de uma forma social e inovadora, configurar uma economia europeia sustentável, com objectivos ambiciosos a nível de protecção climática e ambiental, e aprovar um orçamento da UE baseado nos valores da nossa comunidade.

Assim surgirá uma Europa capaz de defender os seus valores e interesses no palco mundial, seja na obtenção de medicamentos e vacinas, na resolução de crises na sua vizinhança ou na configuração activa da transformação digital.

“Mais Europa” significa mais soberania conjunta, maior capacidade para actuar, mais influência no mundo de amanhã.

Para isso, precisamos da mesma confiança, da mesma determinação com que as pessoas na Europa Central e de Leste lutaram pela união e pela liberdade 30 anos atrás. É por este motivo que queremos lançar a “Conferência sobre o Futuro da Europa” ainda antes do fim da nossa presidência. Para que os cidadãos e cidadãs da Europa possam debater em conjunto sobre possíveis saídas para a crise e sobre a Europa de 2025 ou 2030 – de forma franca e mesmo controversa. Pois para que a unidade surja não é necessário que estejamos todos de acordo logo no início. A nossa diversidade é um dos pontos fortes da Europa, desde que não esqueçamos aquilo que nos une: os nossos valores. Nós, alemães, sabemos como é difícil juntar o que esteve separado. Mas sabemos também que vale a pena. É por isso que defendemos a unidade europeia com a mesma paixão com que lutámos pela unificação alemã há 30 anos. Para que possa convergir o que foi feito para estar junto.

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