Do Brasil à Rússia: como é que a covid-19 influenciou a popularidade dos líderes infectados?

Nalguns casos, como o de Bolsonaro, a pandemia reforçou a sua popularidade. Noutros, como o de Putin (que não esteve infectado, mas o seu primeiro-ministro sim), provocou quedas na taxa de aprovação. O que poderá acontecer no caso de Donald Trump?

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Reuters/CARLOS BARRIA

Donald Trump anunciou, esta sexta-feira, que está infectado com o novo coronavírus, SARS-CoV-2, responsável pela doença covid-19. Tal como ele, também a primeira-dama revelou estar infectada e a cumprir um período de isolamento na Casa Branca. Por enquanto, ainda é cedo para se saber de que forma a doença poderá influenciar o desfecho das eleições presidenciais, que se realizam a 3 de Novembro, mas uma coisa é certa: Donald Trump não foi o primeiro líder político a ficar infectado com o vírus. Dos cépticos Jair Bolsonaro e Boris Johnson aos Governos espanhol e francês, que personalidades políticas já tiveram covid-19 e de que forma é que isso influenciou a sua popularidade?

Jair Bolsonaro

Depois de ter classificado a doença como “uma gripezinha” que não passa de uma “histeria colectiva”, Jair Bolsonaro anunciou ter contraído a doença em Julho, depois de ter tido sintomas – febre, dores de cabeça, cansaço e dores musculares. Tal como ele, também a mulher, Michelle Bolsonaro, ficou infectada. Aos 65 anos, o Presidente brasileiro inseria-se dentro do grupo de risco da covid-19, para quem os sintomas podiam ser mais graves.

Na altura, e em declarações aos jornalistas, Bolsonaro disse estar “perfeitamente bem” e até estar com “vontade de fazer uma caminhada”. De acordo com os seus relatos, o Presidente usou cloroquina – um medicamento que serve para tratar a malária e algumas doenças auto-imunes como a artrite reumatóide e um dos tratamentos que mais defende, apesar de vários estudos apontarem dúvidas quanto à sua eficácia – e azitromicina, um antibiótico, para recuperar.

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Assim que se recuperou, no final de Julho, foi fotografado a andar de mota e a falar sem máscara com os funcionários da residência presidencial. Também marcou uma viagem oficial ao Nordeste brasileiro, com passagem pela Baía

E as sondagens mostram que a popularidade do líder brasileiro saiu reforçada depois do seu episódio de doença. De acordo com os dados do Instituto Datafolha, a taxa de aprovação de Jair Bolsonaro aumentou de 32% para 37% entre Junho e Agosto – período durante o qual esteve doente e recuperou, ainda que não seja claro se o facto de ter estado doente contribuiu para este desfecho ou não. Foi a sua melhor taxa de aprovação desde o início do mandato. 

Boris Johnson

Foi um dos líderes mundiais a ser afectado de forma mais grave pela doença – recuperou, mas passou três dias nos cuidados intensivos num hospital público de Londres, em Abril. Boris Johnson, de 56 anos, foi, num primeiro momento da pandemia, apologista da teoria da “imunidade de grupo”.

O primeiro-ministro britânico foi diagnosticado no final de Março, depois de ter apresentado sintomas leves. Esteve em isolamento, primeiro em casa, e depois no hospital, na sequência do agravamento dos seus sintomas. Recebeu alta a 12 de Abril, mas cumpriu um período de recuperação antes de regressar ao trabalho.

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De acordo com os dados do YouGov, instituto de sondagens que todos os meses pede aos britânicos que avaliem se “Boris Johnson se está a sair bem como primeiro-ministro”, a taxa de aprovação do líder do Executivo andava pelos 60% em Abril (e a taxa de reprovação pelos 26%) – o máximo registado no último ano.

Em Junho, os dois valores inverteram-se: nesse mês, a taxa de reprovação era superior à de aprovação (50% das respostas era negativa) e, em Setembro, 57% dos britânicos referiram que Boris Jonhson se estava a sair mal como primeiro-ministro.

Mikhail Mishustin

O primeiro-ministro russo ficou infectado no final de Abril, numa altura em que o país contava já com mais de 100 mil infecções. A infecção de Mikhail Mishustin foi confirmada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, através da televisão estatal. Mishustin, 54 anos, foi substituído desde a primeira hora pelo número dois, o vice-primeiro-ministro Andrei Belousov. Foi internado para receber tratamento hospitalar e voltou ao trabalho em meados de Maio.

Na sequência do seu internamento e do agravar da pandemia na Rússia, a taxa de aprovação de Putin e do desempenho do Governo caiu. De acordo com a Al Jazeera, em Maio, as taxas de aprovação de Putin caíram: segundo uma sondagem do centro de investigação Levada, apenas 59% dos russos aprovavam a presidência de Putin, contra os 69% registados em Fevereiro.

Dos casos positivos no Governo espanhol ao Vox

Irene Montero (Podemos) foi testada em Março e o teste foi positivo – foi, aliás, este positivo que fez com que todo o Governo fosse submetido a exames. Estava assintomática e cumpriu o isolamento em casa. O seu marido, um dos vice-primeiro-ministros, Pablo Iglesias, também ficou de quarentena. Saiu do isolamento no final de Abril, quando anunciou estar recuperada da covid-19.

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Também Carolina Darias (PSOE), ministra da Administração Pública, teve um teste positivo em meados de Março, depois de se saber que Irene Montero estava infectada. Esteve um mês em isolamento em casa e também ela recuperou passado esse período. No dia 25 de Março, também Carmen Calvo (PSOE), vice-presidente do executivo espanhol, anunciou estar infectada.

Santiago Abascal, deputado e líder do Vox, também anunciou estar infectado, em Março, assim como outro membro do partido, o deputado Javier Ortega Smith. Nos dias anteriores, o Vox realizou um comício em Madrid, o que foi, disse Ortega Smith, “um erro”.

Ainda em Espanha, Isabel Díaz Ayuso (PP), presidente da Comunidade de Madrid teve um teste positivo para a covid-19, tendo recuperado um mês depois — período que passou em isolamento em casa.

É difícil dizer exactamente de que forma o coronavírus influenciou a popularidade destas figuras políticas – até porque desempenham papeis muito diferentes —, mas uma coisa parece certa: o PSOE e o Governo de Pedro Sánchez parecem ter sido um dos principais prejudicados pela pandemia.

Numa sondagem da Metroscopia, cujos resultados foram publicados em Abril, a gestão da pandemia pelo Governo de Sánchez recebia a desaprovação de 51% dos inquiridos. Apenas 39% a aprovava. Um mês antes, os números eram bem diferentes: 64% estavam a favor da gestão do Governo. Em Março, 44% dos inquiridos aprovava o trabalho de Sánchez (em Janeiro era 47%), enquanto 20% dos inquiridos aprovava o de Santiago Abascal, do Vox (em Janeiro era 22%).

Bruno Le Maire e Franck Riester

Também no Governo francês se registaram baixas importantes. O primeiro foi o ministro da Cultura, Franck Riester que, logo em Março, anunciou estar infectado com a covid-19. Teve sintomas: febre, dores de cabeça e perda do paladar e olfacto. Três semanas depois já havia recuperado e voltava ao trabalho presencial, depois de um período de confinamento.

Mais recentemente, o ministro da economia e Finanças de França, Bruno Le Maire, revelou estar infectado com o novo coronavírus em Setembro. Recebeu um teste positivo e encontra-se assintomático. Continua em funções, apesar de ter estado em isolamento durante sete dias.

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Não há dados mais recentes que permitam avaliar o peso desta última infecção, mas, no final de Março, a popularidade do Presidente francês, Emmanuel Macron, subia: mais de 51% dos franceses diziam ter confiança em Macron, de acordo com uma sondagem do centro Harris Interactive, citada pela Reuters. Apenas alguns dias antes, o Presidente tinha determinado algumas restrições para o combate à propagação do vírus, como proibições à mobilidade dos cidadãos.

E a taxa de aprovação continuou alta: em Julho, depois de apresentado o pacote de ajuda europeu devido à crise provocada pela pandemia, a popularidade de Macron atingia os 50%. O mesmo acontecia com o seu novo primeiro-ministro, Jean Castex, que registava uma taxa de aceitação de 56% na mesma sondagem – mais alta do que a do seu antecessor, Edouard Philippe (51%).

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