Morreu Jorge Salavisa, ex-director da Companhia Nacional de Bailado

Bailarino, professor e ex-director artístico do Ballet Gulbenkian e da Companhia Nacional de Bailado tinha 80 anos.

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Jorge Salavisa Miguel Manso

O bailarino, mestre de bailado e professor Jorge Salavisa, que foi director artístico do Ballet Gulbenkian e da Companhia Nacional de Bailado (CNB), morreu na noite desta segunda-feira, na sua casa em Lisboa, vítima de doença prolongada. Tinha 80 anos.

Além destas duas companhias referidas, Salavisa dirigiu, entre 2002 e 2010, o Teatro Municipal São Luiz, cargo que abandonaria para assumir a presidência do conselho de administração do Opart – o organismo que tutela o Teatro Nacional de São Carlos e a CNB –, de onde se demitiria nove meses depois da sua nomeação pelo Ministério da Cultura (MC), por considerar “não estarem reunidas as condições” para a sua “continuação”, como então explicou.

Nascido em Lisboa a 13 de Novembro de 1939, Jorge Salavisa começou os seus estudos de dança com Anna Mascolo, tendo depois prosseguido a sua formação e carreira em Paris e Londres.

Aquando do lançamento do seu livro de memórias, em 2012 – Dançar a Vida (D. Quixote) ­–, Salavisa evocou assim o início da sua carreira em entrevista ao PÚBLICO: “Nos anos 60, e numa família como a minha, que dava muita importância às aparências, ser bailarino não era profissão que se tivesse. Felizmente, os meus pais, sempre generosos, apoiaram-me”. Esse apoio levou-o, primeiro, a Paris, onde entraria na companhia do marquês de Cuevas e encontraria “um universo novo e exigente”. Trabalha na capital francesa com o coreógrafo Roland Petit e a sua mulher e musa, Zizi Jeanmaire, mas também com Rudolf Nureyev, de quem não guardou grandes recordações, e acusou de ser arrogante.

Em 1963, Salavisa troca Paris por Londres, cidade de que não gostou à partida, mas onde a sua passagem pelo London Festival Ballet, no qual dançou praticamente durante uma década, lhe permitiu dar um salto na sua carreira. Foram especialmente marcantes a personagem que interpretou na ópera Fausto, de Gounod, e a criação do “sinistro Iago” num Othello produzido pelo New London Ballet, companhia onde depois trabalharia com Margot Fonteyn. “O ‘meu’ Iago assentava-me com uma luva”, escreveu na sua autobiografia.

Entre a Europa e depois também os Estados Unidos da América, Salavisa trabalhou com outros grandes nomes do bailado mundial, além dos já citados: Bronislava Nijinska, Nicholas Beriosoff, Maria Fay e Floris Alexander, entre tantos outros.

Em 1976, regressa a Portugal para, a partir do ano seguinte, dirigir o então Grupo Gulbenkian de Bailado (futuro Ballet Gulbenkian), onde se manteve até 1996. Aí teve de lidar com “um ninho de intriguistas”, mas Salavisa recorda desse tempo “uma Graça Barroso fabulosa”, e a possibilidade que teve de fazer aparecer novos nomes, como Vasco Wellenkamp, Vera Mantero e Olga Roriz.

Dois anos antes de sair da Gulbenkian, Salavisa fora o responsável pela programação de Dança da Lisboa 94 – Capital Europeia da Cultura. E em 1996 abandona a fundação para assumir a direcção da CNB, um período que haveria de marcar a história desta instituição acolhendo coreógrafos como o norte-americano William Forsythe e a belga Anne Teresa de Keersmaeker, sem esquecer também os nomes nacionais.

Foi também professor na Escola de Dança do Conservatório Nacional.

Em 2011, Marco Martins regista a sua carreira no documentário Jorge Salavisa Keep Going. No ano a seguir, foi a sua vez de publicar as suas memórias no já citado Dançar a Vida.

“Nome maior da dança”

Numa nota de pesar sobre o desaparecimento deste “nome maior da dança contemporânea, tanto nacional como internacionalmente, e um homem que ajudou a definir a cultura em Portugal”, a ministra da Cultura lembra que, “ao longo das décadas, Jorge Salavisa ajudou a escrever a história da dança em Portugal, seja como bailarino, seja como professor de gerações de bailarinos ou director artístico”.

“O que a dança contemporânea é, hoje, em Portugal, tem o cunho muito particular deste artista e pedagogo exemplar”, acrescenta Graça Fonseca, realçando a importância do seu trabalho de à frente do Ballet Gulbenkian e da CNB, que “fizeram de Portugal um país pioneiro na relação entre coreógrafos, bailarinos e público”.

Também o Presidente da República enalteceu esta segunda-feira a carreira do bailarino e coreógrafo Jorge Salavisa, recordando-o como “um professor tão exigente quanto generoso”, cuja missão de formação nunca seria terminada.

“Despedimo-nos hoje, já com saudade, de um homem invulgar, um bailarino virtuoso, um professor tão exigente quanto generoso, que ajudou a formar e deu palco aos mais talentosos bailarinos portugueses. Elevar o ballet nacional a um nível superior, aberto, tangível, ao alcance de todos: foi este o seu maior propósito  'um sonho’, assim definia Jorge Salavisa a sua missão, nunca impossível, nunca terminada”, pode ler-se na mensagem de Marcelo Rebelo de Sousa, publicada na página da Presidência da República.

Já o primeiro-ministro António Costa evocou o “papel renovador” que Jorge Salavisa teve no Ballet Gulbenkian, “abrindo caminho a muitos talentos”. Numa mensagem publicada no Twitter, Costa fala numa “figura de referência da dança em Portugal”, e manifesta a “gratidão por uma vida inteira dedicada à cultura”.

A Fundação Calouste Gulbenkian, cuja companhia de ballet foi dirigida por Jorge Salavisa durante duas décadas, lamentou igualmente o seu desaparecimento. Lembrando a sua “brilhante carreira internacional como bailarino”, a presidente da fundação, Isabel Mota, destacou “a marca de modernidade" que o coreógrafo imprimiu ao Ballet Gulbenkian, “onde teve um papel decisivo na vinda a Portugal de alguns dos maiores coreógrafos mundiais da dança contemporânea e na formação de gerações sucessivas de bailarinos e coreógrafos portugueses”. 

À hora do fecho desta notícia, não havia ainda informação sobre o funeral, que se realizará em Lisboa.

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